Governo e experts divergem sobre impacto das fake news

Uma semana após o fim das eleições, tema ainda é debatido pelo governo e especialistas

5 nov 2018 - 17h08

Uma semana depois do fim das eleições de 2018, o fenômeno da disseminação de desinformação e das chamadas notícias falsas (fake news, no termo popularizado em inglês) foi tema de destaque entre os debates do Fórum da Internet no Brasil. O evento é uma realização do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI Br) e ocorre em Goiânia ao longo da semana.

Pesquisadores, integrantes de organizações da sociedade civil e representantes do governo federal analisaram, com posições divergentes, qual foi o peso de conteúdos enganosos no processo eleitoral e as medidas adotadas tanto por órgãos públicos como o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) quanto por plataformas como Facebook, Google, Twitter e WhatsApp.

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É difícil de medir o impacto do WhatsApp, mas campanhas investiram no aplicativo, até comprando pacotes de disparo de mensagens em massa
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Foto: Getty Images / BBC News Brasil

O coordenador-geral de Ambientes de Negócios do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), Sérgio Alves, considerou que o efeito das chamadas notícias falsas não foi tão efetivo nessas eleições, e que o uso de aplicações contribuiu positivamente no pleito ao permitir que eleitores buscassem informações sobre seus candidatos e novos concorrentes na disputa pudessem se fazer conhecidos.

O coordenador do MCTIC elogiou o Conselho Consultivo do Tribunal Superior Eleitoral sobre Internet e Eleições, colegiado que ficou responsável por apontar ações para o combate ao fenômeno. O gestor avaliou positivamente medidas adotadas por diversos atores, como programas de formação sobre como verificar a veracidade das informações, a atuação das agências de checagem e decisões judiciais de remoção de conteúdos bem como direitos de resposta.

Neste contexto, o representante do MCTIC lembrou que houve um movimento intenso de proposição de leis sobre o assunto e classificou como "uma vitória" o fato de nenhuma dessas ter prosperado no Parlamento. "A cada semana [nos meses anteriores à eleição] surgiam três a cinco projetos de lei, em geral de cunho penal e que mereciam muito mais amadurecimento. Foi um sucesso que não tenha tido projeto de lei aprovado neste sentido".

A professora da Pontifícia Universidade do Rio de Janeiro (PUC-RJ) Caitlin Mullholand, por outro lado, enfatizou um papel importante de conteúdos enganosos durante o pleito eleitoral. A docente citou o relatório do Instituto Reuters sobre consumo de notícias segundo o qual 66% dos entrevistados brasileiros relataram usar as redes sociais para ler notícias e 48% obtêm informação pelo WhatsApp.

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Um dos efeitos que potencializou a disseminação, acrescentou a catedrática, foi a política de "serviço grátis" para aplicativos, como os planos de acesso gratuito a plataformas como Facebook e WhatsApp. "Quando você tem política de serviços grátis [zero rating, no termo em inglês] impede que o sujeito vá buscar uma fonte fora daquela rede social. Você não clica no link, você confia que notícia é verdadeira", disse.

Outro fator que contribuiu para o reforço dos impactos das notícias falsas foi que a professora chamou de "exposição seletiva". Plataformas como Facebook e YouTube por meio dos filtros responsáveis por definir o que aparece aos usuários, acabam apresentando a ele pouco conteúdo que confrontem com suas preferências políticas. Essa lógica desfavorece os desmentidos de mensagens falsas ou mentirosas.

Soluções insuficientes

A integrante do Intervozes - Coletivo Brasil de Comunicação Social Olívia Bandeira considerou as medidas adotadas para o combate à desinformação ineficientes, tanto as das plataformas quanto a de outros atores, como autoridades eleitorais. Ela reforçou o entendimento do forte impacto das notícias falsas e citou pesquisa da organização Avaaz realizada pelo instituto IDEA Big Data, divulgada na semana passada, segundo a qual 93% dos eleitores do presidente eleito, Jair Bolsonaro, relataram ter sido expostos e conteúdos sobre supostas fraudes nas urnas eletrônicas, com 74% afirmando ter acreditado na informação.

A representante da organização avaliou que o movimento das agências de checagem não deu conta de reverter a onda de desinformação. Um primeiro problema apontado foi a definição do que era e o que não era verificado. Afirmações de presidenciáveis e boatos com impactos não receberam atenção, enquanto falas de candidatos com menos de 1% foram analisadas.

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Um segundo problema é a desproporção entre o alcance e a velocidade da disseminação dos conteúdos enganosos em comparação com a capacidade de circulação dos desmentidos. Só a agência de checagem Aos Fatos, exemplificou, noticiou na semana passada que somente os 113 boatos desmentidos pelo site relativos as eleições tiveram 3,84 milhões de compartilhamentos.

Mas a ativista alertou que o combate ao fenômeno deve ser pensado com cuidado. "Tem que ter responsabilidade das plataformas, mas temos que tomar cuidado para acabar não dando mais poder do que elas já têm. Se uma empresa privada vai definir que conteúdo pode ou não ser removido a gente, pode abrir espaço para uma censura privada", ponderou.

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Agência Brasil
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