Greve desafia reformas e testa fidelidade da base de Temer

28 abr 2017 - 17h32
(atualizado às 17h45)

Paralisações e protestos em todo o país adicionam novo elemento de incerteza aos planos do governo e podem diminuir apoio às reformas trabalhista e previdenciária entre a base aliada no Congresso.Sindicatos e movimentos de oposição paralisaram dezenas de setores e tomaram as ruas de várias cidades do Brasil nesta sexta-feira (28/4) para desafiar as reformas promovidas pelo governo do presidente Michel Temer.

Manifestantes realizam protesto na Marginal Tietê bloqueando entrada de ônibus no Terminal Tietê, Zona Norte de São Paulo (SP), na manhã desta sexta-feira (28). O ato faz parte do movimento nacional intitulado “Greve Geral" contra a reforma da Previdência e reforma trabalhista.
Manifestantes realizam protesto na Marginal Tietê bloqueando entrada de ônibus no Terminal Tietê, Zona Norte de São Paulo (SP), na manhã desta sexta-feira (28). O ato faz parte do movimento nacional intitulado “Greve Geral" contra a reforma da Previdência e reforma trabalhista.
Foto: Newton Menezes/Futura Press

Convocada como uma greve geral, as ações paralisaram o transporte público inteiramente ou parcialmente em todas as capitais e resultaram em bloqueios de estradas e vias públicas. A Central Única dos Trabalhadores (CUT) falou em dezenas de milhões de trabalhadores parados, um número que não pôde ser verificado de maneira independente.

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Esse não foi o primeiro ato contra Temer, mas foi o que mais gerou expectativa até o momento diante do seu impacto potencial sobre o governo e da adesão de diversas categorias e de setores da Igreja Católica. Diferentemente de outros atos convocados em novembro e março que também usaram a expressão "greve geral", a paralisação desta sexta produziu imagens de impacto e entrou no radar da imprensa. Segundo jornais brasileiros, a classe política acompanhou o movimento com apreensão.

As ações ocorreram num momento especialmente delicado para um governo marcado por dezenas de escândalos e instabilidade permanente desde o seu início, em maio do ano passado. Não bastassem o impacto das delações da Odebrecht, o Planalto ainda enfrenta dificuldades para aprovar a proposta de emenda constitucional que pretende fazer mudanças profundas na Previdência Social.

Diante do impacto da Operação Lava Jato, o governo tem apostado o que resta do seu capital político para aprovar um ambicioso e controverso pacote de reformas e assim recuperar parte de sua credibilidade com alguns setores que apoiam as mudanças, especialmente o empresariado - e justificar sua continuidade até o fim de 2018.

Para o cientista político Ricardo Costa de Oliveira, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), a amplitude da greve desta sexta adicionou mais um elemento para complicar os planos de Temer.

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Um placar apertado

Na quarta-feira, o governo conseguiu aprovar na Câmara o seu controverso projeto de reforma trabalhista, que críticos apontaram como um ataque aos direitos dos trabalhadores. A aprovação explicitou os limites da influência do Planalto sobre os deputados. Foram 296 votos a favor. Se encarado como teste para a reforma da Previdência, o total está abaixo dos 308 votos necessários.

Os protestos desta sexta-feira evidenciaram ainda uma nova rachadura em parte da base de apoio. Entre os organizadores da greve geral estava a Força Sindical, ligada ao Solidariedade (SD), partido da base. Seu líder, Paulinho da Força, disse que vai abandonar o governo se Temer insistir nas reformas. O SD tem 14 deputados.

No Senado, o colega de partido de Temer e cacique político Renan Calheiros criticou a reforma trabalhista, que ainda tem que passar pelos senadores. A executiva nacional do PSB, que tem 35 deputados na Câmara, já se mostrou contra as reformas e também ameaça abandonar a base.

A greve também indica que o governo vem perdendo a guerra de comunicação para convencer os brasileiros sobre a necessidade das reformas. Em março, uma pesquisa apontou que 72% da população rejeita mudar a Previdência. São poucos os políticos fora do círculo imediato de Temer que defendem as propostas abertamente.

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A fidelidade da base às orientações do governo também vem caindo. Em julho de 2016, 91% dos deputados federais votaram de acordo com o governo. Em abril deste ano, o percentual caiu para 79% entre os cerca de 340 deputados que fazem parte da base. "Um movimento como essa greve tem uma consequência expressiva sobre a base parlamentar e aumenta o custo para manter essa base. Protestos reforçam a impopularidade e isolamento de um governo. Deputados querem sobreviver e pensar no próximo período eleitoral. Continuarem associados à agenda de Temer complica isso", afirma Oliveira, da UFPR.

O apoio parlamentar ao governo continua forte, mas vem caindo ao mesmo tempo em que Temer vem se mostrando mais e mais impopular. Uma pesquisa divulgada esta semana pelo instituto Ipsos apontou que o governo Temer é reprovado por 75% da população. Apenas 10% classificam sua administração como ótima, boa ou regular. É um índice mais baixo do que o registrado pela ex-presidente Dilma Rousseff na época do impeachment.

Segundo o analista político Rafael Cortez, da consultoria Tendências, o governo não está seguro de que vai passar a reforma da Previdência. "A fase de negociação e discussão já acabou. Agora o governo está no ponto de cobrar os votos da sua base aliada. O Planalto não sabe se vai conseguir, do contrário já teria pedido para colocar em votação. Nesse contexto, a greve e os protestos dão um novo sentido de urgência para Temer, já que os movimentos de oposição e sindicatos começam a ter uma percepção maior de que o governo pode não ter força para aprovar."

Antipetismo

Já o cientista político Rodrigo Prando, da Universidade Mackenzie, questiona se todo o impacto da greve vai recair exclusivamente sobre o governo. Ele pergunta se os sindicatos têm algum plano alternativo realista para o que o governo está propondo. "Uma greve dessas chacoalha, mas não ganha uma batalha de ideias", afirmou. "No final do dia ficam imagens de violência cometidas por grevistas, de depredação. Também é difícil de avaliar se todos que pararam o fizeram por convicção ou se ficaram com medo de sair de casa", disse.

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Mesmo com as atenções voltadas para o Planalto, a greve de fato mostrou que o antipetismo e a ojeriza a movimentos de esquerda ainda continuam fortes em alguns setores da sociedade, apesar da impopularidade de Temer e das reformas. Nas redes sociais, milhares de usuários publicaram críticas ao movimento, identificando os atos como um apoio a Lula.

O Movimento Brasil Livre (MBL), que coordenou os protestos contra Dilma Rousseff, chamou os grevistas de "vagabundos" em suas redes sociais - apesar de o próprio movimento ter convocado uma greve geral contra a petista em 2015. O prefeito de São Paulo, João Doria, usou as palavras "vagabundos" e "preguiçosos" para definir os grevistas.

Até a tarde desta sexta-feira, o Planalto não havia se manifestado sobre a greve. Segundo a Folha de S. Paulo, Temer queria adaptar seu posicionamento levando em conta a escala da paralisação. Apenas o ministro da Justiça, Osmar Serraglio (PMDB), havia se manifestado, minimizando os atos.

A Deutsche Welle é a emissora internacional da Alemanha e produz jornalismo independente em 30 idiomas.
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