O Brasil continua em recessão, mas isso não significa que esteja esquecido no cenário internacional. Para analistas, mesmo com a crise, o país é visto como um "doente em recuperação" pelos membros do G20 (grupo das 20 maiores economias do mundo), que vai se reunir na China na semana que vem.
O encontro de líderes é considerado um teste de fogo para o presidente interino Michel Temer, caso seja confirmado no cargo após a votação do Senado.
Segundo economistas, a queda de 0,6% no PIB (Produto Interno Bruto) do segundo trimestre na comparação com os três primeiro meses do ano, divulgada nesta quarta pelo IBGE, não deve afetar o otimismo com que os mercados estrangeiros veem o país. O índice também teve retração de 3,8% ante o mesmo período de 2015.
A visão mais positiva sobre a economia brasileira, dizem os entrevistados, seria consequência do fim do processo de impeachment e das medidas anunciadas pelo governo para arrumar as contas públicas. A projeção de melhora da inflação também entraria nessa conta.
"Investidores e agentes econômicos veem as luzes no fim do túnel da crise política. Também em termos da crise econômica vemos o começo de sinais positivos na economia. Estamos prevendo que a crise vai arrefecer no fim deste ano", diz Beñat Bilbao-Osorio, diretor-regional de América Latina e Caribe do The Economist Intelligence, centro de pesquisa da publicação inglesa.
O cenário internacional, com incertezas políticas na Europa e nos Estados Unidos, também pode destacar o Brasil, caso a promessa de estabilidade seja cumprida, afirma Christopher Garman, chefe de análses para o Brasil da consultoria Eurasia Group.
"Os problemas políticos estão escalando por todos os lados, com partidos conservadores na Europa e o Brexit (saída do Reino Unido da União Europeia), como sinal disso, além do Trump nos Estados Unidos. Se de fato essa agenda de reformas for encaminhada, o país fica numa posição muito interessante."
Para o professor Antonio Carlos Alves do Santos, da PUC-SP, mesmo ruim, o resultado do PIB pode ser usado por Temer no encontro para reforçar esse otimismo. No primeiro trimestre do ano, o indicador foi pior: caiu 5,4% na comparação com o mesmo período de 2015.
"A economia brasileira está se recuperando, mas aquém do que esperávamos. Ele pode chegar dizendo que as dificuldades estão sendo superadas, que estamos reagindo. O fato de a equipe econômica ter estudado nas melhoras instituições americanas ajuda (lá fora)."
Estrela do G20
Nem sempre o Brasil precisou convencer os outros países de que era bom para fazer negócios - esse é o principal objetivo do grupo: trabalhar para a cooperação econômica entre os países.
Se no ano passado, a economia brasileira foi a que menos cresceu entre os membros do G20 (com queda de 3,8%), em 2011 ficou à frente de Estados Unidos, Reino Unido e Alemanha. Naquele ano, o PIB cresceu 3,9%.
Nos anos Lula, o Brasil foi uma das estrelas do grupo. Mais do que o desempenho econômico, parte do sucesso veio da figura do ex-presidente, diz o professor da PUC-SP.
Lula, explica Santos, era capaz de transitar entre líderes de variados espectros políticos, do conservadorismo à esquerda. Ele teria conseguido se aproximar de grandes potências como os Estados Unidos (foi chamado de "o cara" por Obama) e também de emergentes, a exemplo da África.
"No caso do Lula, é importante pensar na política americana, que teve presidentes vindos de famílias mais pobres, como Clinton e Obama. Esse histórico acabou sendo um referencial sobre o petista."
No entanto, com a chegada de Dilma, que tem um perfil mais técnico, e os sucessivos resultados ruins da economia, o Brasil foi perdendo brilhantismo e lugar no G20.
"Nos últimos dois anos, ele se tornou como a economia 'doente' dos mercados emergentes, por causa da crise econômica e política. Mas não é justo dizer que seu papel tenha sido tomado. O Brasil ainda é um importante jogador no comércio mundial e especialmente para a América Latina", afirma Bilbao-Osorio, da The Economist Inteligence Unit.
"É uma das economias globais que faz o mercado funcionar. Não acho que vá ser substituído pela África do Sul, que também tem problemas econômicos e políticos, ou a vizinha Argentina, que não tem o tamanho nem a importância do Brasil."
Recepção a Temer
Mas se a recuperação gradual da economia é quase um consenso, a atuação de Temer no encontro é uma incógnita. A dúvida dos analistas está na forma como o peemedebista, se confirmado no cargo após o processo de impeachment, será tratado pelos outros líderes.
A reunião das 20 maiores economias é considerada um teste do ponto de vista econômico e político. O interino precisa passar o recado da recuperação do Brasil e também a de que seu governo, mesmo considerado ilegítimo pelos críticos, trará estabilidade. Essas mensagens são cruciais para que os outros países queiram firmar acordos com o Brasil no futuro.
"Temer procura legitimidade num governo que não saiu das urnas. Mas existem muitas questões no impedimento e a dúvida que fica (para os membros) é: o Brasil é de fato uma democracia consolidada? Essa resposta vai aparecer em pequenos detalhes, como a posição que ele vai ter na fotografia oficial", afirma Silva, da PUC-SP.
O professor acrescenta que Temer não é um grande líder político como Fernando Henrique Cardoso e Lula, mas uma figura de bastidores. Isso poderia prejudicar o protagonismo do Brasil nas negociações.
A história do impeachment pode até prejudicar a abordagem mais simpática ao mercado que o governo Temer começa a encabeçar, diz Fernando Sarti, professor do Instituto de Economia da Unicamp. Mesmo que a seja mais atrativa para os investidores, pondera Sarti, fica a pergunta: num cenário conturbado, ele terá capacidade ou legitimidade para colocar as medidas em prática?
"Os países podem dizer 'gostei, mas acho que esse cara não vai entregar o produto'."