Etnias indígenas e o maior grupo de afrodescendentes do Brasil estão neste mês no Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros para discutir problemas em comum e os desafios de seus povos.
Há dias, representantes das etnias Fulni-ô, Kayapó, Yawalapiti, Truká, Krahô, Wauará, Kamayurá, Xavante e Kariri-Xocó realizam reuniões e atividades culturais diárias em uma aldeia construída para a ocasião perto de São Jorge, município com 500 habitantes em Goiás.
No 14º Encontro de Culturas Tradicionais, cujo encerramento está programado para o próximo sábado, também participam membros da comunidade quilombola Kalunga, o maior núcleo brasileiro de descendentes de africanos.
Além de realizar ritos religiosos e de expor seus artesanatos, música e dança, os participantes compartilham as dificuldades e desafios de seus povos.
Entre as principais preocupações se destacam o reconhecimento e a demarcação de terras tradicionais, a luta contra o racismo e a preservação da cultura e língua própria.
"Com Dilma Rousseff nossa situação é mais difícil do que com Lula", disse à Agência Efe o cacique Toé da etnia Fulni-ô, que participa do encontro há oito anos.
Um estudo do Conselho Missionário Indigenista (Cimi) divulgado este mês revelou que o Executivo de Dilma tem a média mais baixa de demarcação de terras indígenas no Brasil do período democrático.
Segundo Toé, seu povo continua enfrentando a invasão de terras por grandes fazendeiros e as autoridades não respeitam a lei que reconhece a justiça indígena dentro de seus territórios.
"Alguns criminosos entram na reserva para fugir da Polícia e a Polícia reage com violência em nossas aldeias", explicou.
"Acreditamos que podemos mudar a sociedade e criar um Brasil diferente a partir da nossa história", afirmou a militante Marta Cezaria, perante um grande grupo de mulheres Kalunga, ao que o líder dos kayapó, Takaruma, respondeu: "Os índios e quilombolas têm que se unir para defender os direitos escritos na Constituição".
Segundo Juliano Basso, principal impulsor do projeto, o objetivo é propiciar o diálogo entre povos tradicionais do Brasil e aproximar sua sabedoria do resto da sociedade.
"O povo brasileiro surgiu da mistura de culturas, mas ficamos com a ideia europeia de desenvolvimento e queremos agregar outras noções diferentes. Aqui vemos a maneira de viver de povos que convivem com a natureza. Continuamos perdendo culturas no Brasil, e quando desaparece um povo se perde a experiência de quem conseguiu criar toda uma tecnologia de vida", avaliou Basso à Efe.
Ele acrescenta que a Aldeia Multiétnica, com choças típicas dos povos Xinguana, Krahô, Kayapó e Fulni-ô, é um exemplo de sustentabilidade, já que são construídas pelos participantes com materiais do entorno e dispõe de horta e galinheiro.
O cuidado do local fica a cargo de uma família Kalunga de quatro membros, encarregada de manter o espaço nos demais dias do ano.
"Os índios não são coisa do passado, mas do futuro. É preciso levar o conhecimento indígena ao conjunto da sociedade", declarou o arquiteto Marcelo Rosenbaum durante visita à Aldeia Multiétnica.
O encontro também fomenta a "economia criativa", que permite às etnias participantes obter renda mediante a troca e a venda de artesanato, além da oficina de pintura corporal.
Os organizadores explicaram à Efe que este ano tiveram que divulgar o evento de última hora por conta da "Copa e das eleições de outubro", que diminuíram o interesse dos patrocinadores e dos organismos públicos para financiar o encontro.
Segundo dados do governo, atualmente há 896.917 índios de 241 etnias e 1.838 comunidades quilombolas no Brasil.