Especialistas: investigação contra Lula pode ser 'exemplo'

Lula é acusado de ter atuado em favor da construtora Odebrecht em contratos internacionais financiados pelo BNDES

28 jul 2015 - 12h50
(atualizado às 15h46)
Investigação apura se ex-presidente praticou tráfico de influência em favor da Odebrecht
Investigação apura se ex-presidente praticou tráfico de influência em favor da Odebrecht
Foto: Lula em foto foto de março (AFP)

A abertura de uma investigação no Ministério Público do Distrito Federal para apurar se o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva praticou tráfico de influência após ter deixado o governo quase não encontra paralelo em outros países, o que demonstra como o relacionamento entre ex-líderes e grandes empresas se situa numa zona legal cinzenta, dizem especialistas em corrupção ouvidos pela BBC Brasil.

A investigação refere-se à suposta atuação de Lula em favor da construtora Odebrecht em contratos internacionais financiados pelo BNDES. O Instituto Lula, do ex-presidente, nega haver irregularidades em suas atividades.

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Alejandro Salas, diretor de Américas da Transparência Internacional, disse que o fato de o Brasil ser uma das maiores economias mundiais, ter destaque na comunidade internacional e de Lula ser personalidade importante podem fazer com que a investigação sirva de modelo.

"Seria um enorme exemplo para o mundo. Pode realmente ser o começo de novas regulações e controles", disse ele à BBC Brasil.

"Há sempre um problema no fato de um ex-presidente usar seus contatos, seu poder, para ajudar determinados interesses, isso em si já traz implicações éticas."

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Segundo o cientista político Michael Johnston, professor da Colgate University, em Nova York, a investigação é "incomum", mas pode servir de modelo.

"O Brasil é observado muito atentamente, e estamos falando de um personagem muito poderoso e de uma investigação que ocorre em um momento crucial no desenvolvimento do país", diz.

Bill Clinton deu palestras para empresas e acompanhou líderes de empresas a outras partes do mundo
Foto: Divulgação/BBC Brasil

"Não quero julgar as alegações contra Lula, mas (a investigação) pode servir como uma lição para outros investigadores ao redor do mundo."

"É muito incomum o fato de haver uma investigação... Na maioria dos casos, ex-líderes são investigados por atos cometidos enquanto estavam no poder, mas não por ações após deixarem o cargo."

Além desta investigação, a Odebrecht - a maior construtora do Brasil - é alvo da Operação Lava Jato, da Polícia Federal, que investiga um suposto esquema de corrupção na Petrobras.

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O presidente da empresa, Marcelo Odebrecht, está preso e foi denunciado à Justiça por crimes que teriam sido cometidos contra a estatal. A defesa nega que ele tenha participado das irregularidades.

"Mas a diferença no caso de Lula, caso a investigação prove que é culpado, é que não está apenas fazendo isso, mas está fazendo isso para apoiar empresas corruptas a fazerem negócios corruptos", disse Salas, da Transparência Internacional.

'Comportamento comum'

O fato de não provocarem investigações formais não significa que as relações entre ex-líderes e grandes empresas sejam incomuns ou isentas de polêmica.

"É um comportamento muito comum entre ex-chefes de Estado", disse David Rothkopf, editor da revista e autor de livros sobre as relações entre empresas e governos.

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Lula participa de evento ao lado de líderes sul-americanos
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Ele cita o ex-chanceler alemão Gerhard Schröder, cuja atuação na empresa de energia russa Gazprom após deixar o governo foi alvo de controvérsia.

Outro exemplo é o ex-presidente americano Bill Clinton e sua Clinton Global Initiative. A polêmica em torno das ações de Clinton é agravada pelo fato de sua mulher, Hillary, ter atuado como secretária de Estado e atualmente ser a favorita democrata na corrida presidencial americana.

"Ele deu palestras para empresas e acompanhou líderes de empresas a outras partes do mundo onde sua influência pode ter ajudado essas empresas a fecharem negócios", observa Rothkopf.

O ex­-primeiro-ministro britânico Tony Blair também gerou controvérsia por suas ligações com empresas e negócios com governos do Oriente Médio enquanto era enviado especial do Quarteto - grupo formado por ONU, União Europeia, Estados Unidos e Rússia para mediar o conflito entre Israel e Palestina.

"A questão é se estão fazendo algo ilegal ou antiético. E isso deve ser determinado caso a caso, com base nas leis de cada país", diz Rothkopf.

Para Johnston, há uma certa noção de que ter ocupado um cargo público deve servir como um bilhete para enriquecer.

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"Parece haver um tipo de elite internacional que acha que tem o direito de enriquecer depois de deixar seus cargos no governo", critica Johnston.

Lula marombeiro: ex-presidente dá dicas de treino em vídeo
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"É ético? Muito do que ocorre não passaria no teste de percepção. Essas pessoas devem cair na obscuridade após deixar o poder? Não, elas têm experiência e conhecimentos valiosos. Devem monetizar esses ativos que lhes foram conferidos pelo povo? Acho que não."

"Quando deixam o poder, entram nesse tipo de terreno parte público, parte privado de transações internacionais, onde não há regras claras. Qual a diferença entre suborno, taxa de consulta ou contribuição? Pode ser difícil definir."

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