Antes de decidir mensalão, decano sofre pressão nas redes sociais

Ministro Celso de Mello dará nesta quarta-feira voto de desempate sobre a validade ou não dos recursos apresentados por réus do mensalão

17 set 2013 - 08h57
(atualizado às 10h08)
Ao mesmo tempo em que demonstram "confiança" em Celso de Mello, internautas cobram que ele "não os decepcione"
Ao mesmo tempo em que demonstram "confiança" em Celso de Mello, internautas cobram que ele "não os decepcione"
Foto: Facebook / Reprodução

Centro das atenções na semana decisiva do julgamento dos recursos do mensalão, o ministro Celso de Mello vem enfrentando pressões nas redes sociais para que negue o cabimento dos embargos infringentes dos réus. Mais antigo membro do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro dará nesta quarta-feira o voto decisivo para desempatar o placar, que pode resultar na reabertura do julgamento para pelo menos 11 réus.

Confira o placar do julgamento voto a voto

Conheça o destino dos réus do mensalão

Saiba o que ocorreu no julgamento dia a dia

Mensalãopédia: conheça os personagens citados no julgamento

Mensalão Kombat: veja as 'batalhas' entre Barbosa e Lewandowski

Publicidade

Como manda a tradição do Supremo, cabe ao decano o voto de minerva, sendo o ministro com mais tempo de Casa o último a votar. Desde que a sessão foi suspensa na última quinta-feira, com cinco votos a favor e cinco contrários à aceitação dos embargos infringentes, Celso de Mello virou alvo de campanhas de setores empenhados tanto em garantir a condenação dos réus quanto daqueles dispostos a abrir espaço para novos recursos, numa tentativa de convencer o ministro antes de sua decisão.

Mello, porém, já deu indícios de que os réus têm direito ao recurso, tendo manifestado a validade dos embargos infringentes já na primeira sessão do julgamento, em agosto de 2012. "O Supremo Tribunal Federal, em normas que não foram derrogadas e que ainda vigem, reconhece a possibilidade de impugnação de decisões de mandados do plenário desta Corte em sede penal, não apenas os embargos de declaração, como aqui se falou, mas também os embargos infringentes do julgado, que se qualificam como recurso ordinário dentro do Supremo, na medida que permitem a rediscussão de matéria de fato e a reavaliação da própria prova penal", disse o decano na ocasião.

Talvez justamente por Celso de Mello já ter sinalizado um caminho pró-embargos, a maior parte dos internautas que se manifestam na página do magistrado no Facebook tentam convencer o ministro a "mudar de ideia", não permitindo o prosseguimento do julgamento. "Celso, olha o jornal. Estamos cansados de tanta corrupção. Pense nos nossos filhos e netos. É esse Brasil que vamos deixar para eles?", questiona um internauta, em mensagem postada na página. "Em vossa decisão que será declarada na quarta-feira, embora do ponto de vista jurídico seja o mais certo, pelo amor de Deus 'olhe e tenha pena do povo brasileiro'", argumenta outro internauta.

Celso de Mello protagoniza diversas montagens feitas por internautas, em que é retratado ora como o salvador da Pátria ora como um vilão em potencial. Em uma das imagens, o ministro aparece com uma pizza numa das mãos e algemas na outra, acima da mensagem: "nas mãos de Celso de Mello, o destino dos mensaleiros e a dignidade do Judiciário". Em outra, o decano é colocado diante de duas alternativas: entrará para história como herói ou como covarde.

Publicidade

Entre as raras mensagens de apoio ao recebimento dos embargos infringentes está uma montagem com as imagens do ex-ministro José Dirceu e do ex-presidente do PT deputado José Genoino (SP), condenados no processo do mensalão. Chamando os dois políticos de "heróis nacionais" por sua luta contra a ditadura, a imagem repudia um suposto "golpe do Judiciário", exigindo novo julgamento aos réus.

Protestos

Além da pressão online, internautas também se organizam para realizar manifestações na quarta-feira exigindo que os embargos infringentes sejam negados. Uma petição publicada no site Avaaz tenta conscientizar Celso de Mello "sobre os verdadeiros impactos deste julgamento" e que "não tome uma decisão que possa complicar mais ainda a situação do nosso País". Até a noite de segunda-feira, a página já havia coletado mais de 2,1 mil assinaturas.

Manifestantes prometem também fazer uma "vigília" em frente ao STF, onde na semana passada já houve uma manifestação contrária aos recursos dos réus do mensalão. Em São Paulo, está previsto um ato no vão livre do Museu de Arte (Masp), na avenida Paulista, em protesto contra a corrupção. "Vale à pena perder meio expediente para exigir o começo de toda a mudança pela qual lutamos há séculos: o fim da corrupção", conclama a página criada no Facebook para o evento, que contava com pouco mais de 400 pessoas confirmadas.

Publicidade

Embargos infringentes

Como é tradição no STF, Celso de Mello é o último ministro a votar, por ser o mais antigo membro da Casa, e será responsável nesta quarta-feira pelo voto de minerva, para desempatar o placar de cinco a cinco pelo cabimento ou não dos embargos infringentes. Parte dos ministros admite ser válido um artigo do regimento interno do Supremo, segundo o qual um condenado pode solicitar a reanálise do caso quando obtiver pelo menos quatro votos pela sua absolvição. Já outros ministros acreditam que os embargos infringentes não foram previstos na Lei 8.038, de 1990, que regulou normas procedimentais dos tribunais superiores.

Uma eventual admissão dos embargos infringentes no julgamento do mensalão não provocaria uma reabertura completa do julgamento. Apenas seriam reexaminados aqueles casos nos quais há pelo menos quatro votos vencidos - como ocorreu no julgamento de parte dos réus por formação de quadrilha e lavagem de dinheiro.

Os réus que seriam beneficiados com o novo julgamento seriam: João Paulo Cunha, João Cláudio Genu e Breno Fischberg, condenados pelo crime de lavagem de dinheiro; José Dirceu, Delúbio Soares, José Genoíno, Marcos Valério, Ramon Hollerbach, Cristiano Paz, José Roberto Salgado e Kátia Rabello, condenados por formação de quadrilha.

Publicidade

O mensalão do PT

Em 2007, o STF aceitou denúncia contra os 40 suspeitos de envolvimento no suposto esquema denunciado em 2005 pelo então deputado federal Roberto Jefferson (PTB) e que ficou conhecido como mensalão. Segundo ele, parlamentares da base aliada recebiam pagamentos periódicos para votar de acordo com os interesses do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Após o escândalo, o deputado federal José Dirceu deixou o cargo de chefe da Casa Civil e retornou à Câmara. Acabou sendo cassado pelos colegas e perdeu o direito de concorrer a cargos públicos até 2015.

No relatório da denúncia, a Procuradoria-Geral da República apontou como operadores do núcleo central do esquema José Dirceu, o ex-deputado e ex-presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares e o ex- secretário-geral Silvio Pereira. Todos foram denunciados por formação de quadrilha. Dirceu, Genoino e Delúbio respondem ainda por corrupção ativa.

Em 2008, Sílvio Pereira assinou acordo com a Procuradoria-Geral da República para não ser mais processado no inquérito sobre o caso. Com isso, ele teria que fazer 750 horas de serviço comunitário em até três anos e deixou de ser um dos 40 réus. José Janene, ex-deputado do PP, morreu em 2010 e também deixou de figurar na denúncia.

Publicidade

O relator apontou também que o núcleo publicitário-financeiro do suposto esquema era composto pelo empresário Marcos Valério e seus sócios (Ramon Cardoso, Cristiano Paz e Rogério Tolentino), além das funcionárias da agência SMP&B Simone Vasconcelos e Geiza Dias. Eles respondem por pelo menos três crimes: formação de quadrilha, corrupção ativa e lavagem de dinheiro.

A então presidente do Banco Rural, Kátia Rabello, e os diretores José Roberto Salgado, Vinícius Samarane e Ayanna Tenório foram denunciados por formação de quadrilha, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro. O publicitário Duda Mendonça e sua sócia, Zilmar Fernandes, respondem a ações penais por lavagem de dinheiro e evasão de divisas. O ex-ministro da Secretaria de Comunicação (Secom) Luiz Gushiken é processado por peculato. O ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato foi denunciado por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) responde a processo por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A denúncia inclui ainda parlamentares do PP, PR(ex-PL), PTB e PMDB. Entre eles o próprio delator, Roberto Jefferson. Em julho de 2011, a Procuradoria-Geral da República, nas alegações finais do processo, pediu que o STF condenasse 36 dos 38 réus restantes. Ficaram de fora o ex-ministro da Comunicação Social Luiz Gushiken e o irmão do ex-tesoureiro do Partido Liberal (PL) Jacinto Lamas, Antônio Lamas, ambos por falta de provas. A ação penal começou a ser julgada em 2 de agosto de 2012. A primeira decisão tomada pelos ministros foi anular o processo contra o ex-empresário argentino Carlos Alberto Quaglia, acusado de utilizar a corretora Natimar para lavar dinheiro do mensalão.

Durante três anos, o Supremo notificou os advogados errados de Quaglia e, por isso, o defensor público que representou o réu pediu a nulidade por cerceamento de defesa. Agora, ele vai responder na Justiça Federal de Santa Catarina, Estado onde mora. Assim, restaram 37 réus no processo.

Publicidade

No dia 17 de dezembro de 2012, após mais de quatro meses de trabalho, os ministros do STF encerraram o julgamento do mensalão. Dos 37 réus, 25 foram condenados, entre eles Marcos Valério (40 anos e 2 meses), José Dirceu (10 anos e 10 meses), José Genoino (6 anos e 11 meses) e Delúbio Soares (8 anos e 11 meses). A Suprema Corte ainda precisa publicar o acórdão do processo e julgar os recursos que devem ser impetrados pelas defesas dos réus. Só depois de transitado em julgado os condenados devem ser presos.

Fonte: Terra
Curtiu? Fique por dentro das principais notícias através do nosso ZAP
Inscreva-se