Indefinição sobre multas suspende análise de recursos de Valério

Ministros do STF discutiam a correção de um erro na descrição das multas do operador do mensalão, mas o assunto gerou dúvidas

22 ago 2013 - 18h54
(atualizado às 19h14)
Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli, durante julgamento dos recursos dos condenados no processo do mensalão
Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli, durante julgamento dos recursos dos condenados no processo do mensalão
Foto: Valter Campanato / Agência Brasil

O Supremo Tribunal Federal (STF) adiou para a semana que vem a conclusão da análise dos recursos de Marcos Valério, condenado a 40 anos, quatro meses e seis dias de prisão, em regime inicial fechado. Uma discussão sobre um erro material na descrição de parte da multa do operador do mensalão - que tem total estimado em R$ 2,7 milhões - gerou dúvidas nos ministros, que preferiram estudar melhor a situação.

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A indefinição surgiu no voto do relator do processo, Joaquim Barbosa, quando já havia rejeitado parte dos pedidos do réu. Barbosa afirmou que o tribunal deveria corrigir um erro material sobre a multa de Valério, cujo voto vencedor foi de autoria do revisor Ricardo Lewandowski.

O acórdão do mensalão (texto que resume o julgamento) descreveu a primeira pena fixada por Lewandowski, sem constar um reajuste que o revisor fez posteriormente, aumentando os dias-multa e reduzindo o número de salários mínimos. Durante a análise, outros ministros alertaram que uma eventual correção agravaria a pena de multa, o que não poderia ocorrer após recurso da defesa.  

“Seria uma coisa absurda se o Supremo, em recurso exclusivo da defesa, e a pretexto de corrigir erro material, proferisse uma decisão que sob todos os títulos é patentemente gravosa”, disse o ministro mais antigo da Corte, Celso de Mello. "O Ministério Público, se fosse o caso, deveria ter entrado com o recurso para corrigir", completou o decano.

Como Lewandowski foi o autor do voto vencedor nas multas estipuladas a Marcos Valério, Barbosa pediu para que o revisor traga, na próxima quarta-feira, um esclarecimento sobre o voto proferido.

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Outros pedidos

Barbosa rejeitou, durante seu voto, outros argumentos da defesa, entre eles o de que Valério teria colaborado para a investigação com o fornecimento de listas de pessoas que receberam recursos do esquema. “Ao contrário do que se tem sustentado, esse réu buscou criar muito mais obstáculos à investigação do que proporcionar informações”, disse Barbosa.

O status de réu colaborador foi concedido ao ex-presidente do PTB Roberto Jefferson, considerado “delator” por denunciar o esquema em uma entrevista ao jornal Folha de S.Paulo.  

A defesa levanta outras supostas contradições no acórdão do mensalão (texto que resume o processo), como o agravante de “liderança” na pena definida ao empresário. O advogado de Valério, Marcelo Leonardo, escreveu no embargo que o Supremo sempre disse que as empresas SMP&B e DNA eram dirigidas “a três mãos”, juntamente dos sócios Cristiano Paz e Ramon Hollerbach. Barbosa, no entanto, disse que o réu – considerado operador do esquema – coordenou o chamado “núcleo publicitário” do mensalão.

“A primeira alegação de que Marcos Valério, no plano empresarial, atuava no mesmo nível nas empresas não implica qualquer contradição com o acórdão. (...) O embargante foi responsável por coordenar esses corréus na prática delitiva”, disse Barbosa durante o julgamento dos recursos, que ainda não foi apreciado pelos demais ministros.

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Repetindo um pedido feito em memoriais entregue no ano passado a ministros, Marcelo Leonardo voltou a reivindicar a continuidade delitiva entre os delitos praticados. Nesse caso, o tribunal não somaria as penas, mas aplicaria a maior e aumentaria em frações pela prática de outros crimes. Barbosa também rejeitou rediscutir a matéria nesse ponto.

Empresário sócio das empresas DNA Propaganda e SMP&B comunicação, Marcos Valério foi condenado pelos crimes de formação de quadrilha, corrupção ativa, peculato, lavagem de dinheiro e evasão de divisas por criar um esquema que financiou o PT e outros partidos governistas, com desvio de recursos obtidos com contratos de publicidade firmados com o Banco do Brasil e a Câmara dos Deputados. A origem do dinheiro era disfarçada por meio de empréstimos fraudulentos. Valério foi condenado por todos os crimes a que foi condenado: corrupção ativa, peculato, lavagem de dinheiro, formação de quadrilha e evasão de divisas.

O mensalão do PT

Em 2007, o STF aceitou denúncia contra os 40 suspeitos de envolvimento no suposto esquema denunciado em 2005 pelo então deputado federal Roberto Jefferson (PTB) e que ficou conhecido como mensalão. Segundo ele, parlamentares da base aliada recebiam pagamentos periódicos para votar de acordo com os interesses do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Após o escândalo, o deputado federal José Dirceu deixou o cargo de chefe da Casa Civil e retornou à Câmara. Acabou sendo cassado pelos colegas e perdeu o direito de concorrer a cargos públicos até 2015.

No relatório da denúncia, a Procuradoria-Geral da República apontou como operadores do núcleo central do esquema José Dirceu, o ex-deputado e ex-presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares e o ex- secretário-geral Silvio Pereira. Todos foram denunciados por formação de quadrilha. Dirceu, Genoino e Delúbio respondem ainda por corrupção ativa.

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Em 2008, Sílvio Pereira assinou acordo com a Procuradoria-Geral da República para não ser mais processado no inquérito sobre o caso. Com isso, ele teria que fazer 750 horas de serviço comunitário em até três anos e deixou de ser um dos 40 réus. José Janene, ex-deputado do PP, morreu em 2010 e também deixou de figurar na denúncia.

O relator apontou também que o núcleo publicitário-financeiro do suposto esquema era composto pelo empresário Marcos Valério e seus sócios (Ramon Cardoso, Cristiano Paz e Rogério Tolentino), além das funcionárias da agência SMP&B Simone Vasconcelos e Geiza Dias. Eles respondem por pelo menos três crimes: formação de quadrilha, corrupção ativa e lavagem de dinheiro.

A então presidente do Banco Rural, Kátia Rabello, e os diretores José Roberto Salgado, Vinícius Samarane e Ayanna Tenório foram denunciados por formação de quadrilha, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro. O publicitário Duda Mendonça e sua sócia, Zilmar Fernandes, respondem a ações penais por lavagem de dinheiro e evasão de divisas. O ex-ministro da Secretaria de Comunicação (Secom) Luiz Gushiken é processado por peculato. O ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato foi denunciado por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) responde a processo por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A denúncia inclui ainda parlamentares do PP, PR (ex-PL), PTB e PMDB. Entre eles o próprio delator, Roberto Jefferson. Em julho de 2011, a Procuradoria-Geral da República, nas alegações finais do processo, pediu que o STF condenasse 36 dos 38 réus restantes. Ficaram de fora o ex-ministro da Comunicação Social Luiz Gushiken e o irmão do ex-tesoureiro do Partido Liberal (PL) Jacinto Lamas, Antônio Lamas, ambos por falta de provas. A ação penal começou a ser julgada em 2 de agosto de 2012. A primeira decisão tomada pelos ministros foi anular o processo contra o ex-empresário argentino Carlos Alberto Quaglia, acusado de utilizar a corretora Natimar para lavar dinheiro do mensalão.

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Durante três anos, o Supremo notificou os advogados errados de Quaglia e, por isso, o defensor público que representou o réu pediu a nulidade por cerceamento de defesa. Agora, ele vai responder na Justiça Federal de Santa Catarina, Estado onde mora. Assim, restaram 37 réus no processo.

No dia 17 de dezembro de 2012, após mais de quatro meses de trabalho, os ministros do STF encerraram o julgamento do mensalão. Dos 37 réus, 25 foram condenados, entre eles Marcos Valério (40 anos e 2 meses), José Dirceu (10 anos e 10 meses), José Genoino (6 anos e 11 meses) e Delúbio Soares (8 anos e 11 meses). A Suprema Corte ainda precisa publicar o acórdão do processo e julgar os recursos que devem ser impetrados pelas defesas dos réus. Só depois de transitado em julgado os condenados devem ser presos.

Fonte: Terra
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