O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou nesta quarta-feira (24) que as mídias juntadas no inquérito decorrente da delação premiada do empresário Joesley Batista passem a tramitar em segredo de Justiça. A decisão foi tomada após a divulgação de diálogo entre o jornalista Reinaldo Azevedo e Andrea Neves, irmã do senador afastado Aécio Neves. A Procuradoria-Geral da República e a Polícia Federal negam responsabilidade sobre a quebra do sigilo da fonte do jornalista.
Publicado pelo site BuzzFeed Brasil, o diálogo entre o jornalista e sua fonte está gravado em uma das mídias que agora passam a tramitar em segredo de justiça. Na transcrição, o jornalista critica a revista Veja, veículo para o qual trabalhava. Em nota no blog que mantinha no site da revista, Azevedo anuncia seu pedido de demissão e diz que teve o sigilo da fonte quebrado como forma de intimidação por ser crítico da condução da Operação Lava Jato.
"O que se tem aí caracteriza um estado policial. Uma garantia constitucional de um indivíduo está sendo agredida por algo que nada tem a ver com a investigação", aponta o jornalista. "Há também uma agressão a uma das garantias que tem a profissão. A menos que um crime esteja sendo cometido, o sigilo da conversa de um jornalista com sua fonte é um dos pilares do jornalismo", destacou.
No despacho em que manda retirar as mídias dos autos da Ação Cautelar 4316, o ministro Fachin assinala que "as mídias juntadas às folhas 249 e 386 não contêm apenas os diálogos referidos nos relatórios [da PF] a que foram elas anexadas". Embora tanto a PGR quanto a PF concordem que os áudios "não diziam respeito ao objeto da investigação", a conversa acabou disponibilizada à imprensa quando Fachin levantou parcialmente o sigilo da delação.
Em nota, a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) atribui à PGR a violação do sigilo da fonte. Para a associação, a PGR não só infringiu o Artigo 5º da Constituição Federal, como cometeu "grave ofensa" contra a liberdade de imprensa: "Ao anexar a gravação da PF aos autos do inquérito que investiga o senador mineiro, a PGR jamais poderia incluir a transcrição de uma conversa do jornalista com sua fonte, o que representou quebra de sigilo, um dos direitos assegurados pela Constituição Federal".
PGR
Em nota, a Procuradoria-Geral da República (PGR) negou ter anexado as conversas de Reinaldo Azevedo com Andrea Neves ao inquérito. "A PGR não anexou, não divulgou, não transcreveu, não utilizou como fundamento de nenhum pedido, nem juntou o referido diálogo aos autos da Ação Cautelar 4316", diz a procuradoria em nota divulgada na noite de terça-feira (23).
A PGR afirma que, como a vista à ação cautelar só foi aberta ontem pelo ministro Edson Fachin, ainda não teve sequer oportunidade de pedir a juntada de quaisquer documentos ao inquérito. "Todas as conversas utilizadas pela PGR em suas petições constam tão somente dos relatórios produzidos pela Polícia Federal, que destaca os diálogos que podem ser relevantes para o fato investigado. Neste caso específico, não foi apontada a referida conversa".
PF
Já a Polícia Federal reiterou que os áudios tornados públicos na tarde dessa terça-feira não fazem parte dos autos da ação, pois as conversas não têm nenhuma ligação com a investigação. "O referido diálogo não foi lançado em qualquer dos autos circunstanciados produzidos no âmbito da mencionada ação cautelar, uma vez que referidas conversas não diziam respeito ao objeto da investigação".
Além de confirmar que a conversa de Andrea com o jornalista foi gravada com autorização do ministro Edson Fachin porque a irmã do senador Aécio Neves estava sendo investigada, a PF acrescenta que, segundo a Lei 9.296/96, que regulamenta a interceptação de comunicações telefônicas, só o ministro pode decidir pela inutilização de áudios que não sejam de interesse da investigação. Segundo a PF, no entanto, a PGR teve acesso às interceptações, na íntegra, após 28 de abril.
STF
A reportagem tentou ouvir o STF sobre a veiculação das conversas e a decisão do ministro Edson Fachin de voltar a determinar o sigilo de parte dos autos, mas ainda não obteve respostas. A presidenta da Corte, ministra Cármen Lúcia, contudo, divulgou nota afirmando que o STF "tem jurisprudência consolidada no sentido de se respeitar integralmente o direito constitucional ao sigilo da fonte". A ministra reitera o compromisso de lutar e garantir o integral respeito aos direitos constitucionais.