Futebol, chinelada e isolamento: os dias discretos de Cunha antes da prisão

19 out 2016 - 19h32
(atualizado às 19h42)
Habituado à bajulação de políticos, o ex-todo poderoso da Câmara dos Deputados teve que se acostumar com o isolamento desde que perdeu o foro privilegiado, em 12 de setembro.
Habituado à bajulação de políticos, o ex-todo poderoso da Câmara dos Deputados teve que se acostumar com o isolamento desde que perdeu o foro privilegiado, em 12 de setembro.
Foto: Agencia Camara / BBC News Brasil

Na última vez em que apareceu em público desde a cassação de seu mandato de deputado federal, Eduardo Cunha foi alvo de chineladas de uma senhora que tentou agredi-lo no aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro, aos gritos de "safado" e "bandido".

O episódio, registrado em vídeo na semana passada, viralizou nas redes sociais - e não foi um caso isolado.

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Outras cenas de Cunha recebendo xingamentos - e elogios, incluindo selfies - em saguões em São Paulo e Brasília circularam por timelines afora no último mês. "Não vão me constranger", respondeu, atribuindo os ataques a "petistas".

Desde a interrupção da vida pública, entretanto, o ex-deputado preso nesta quarta-feira pela Polícia Federal preferia falar de futebol.

"E o Mengao, (sic) ontem jogou fora uma chance de ouro. Agora depende dos tropeços do Palmeiras", escreveu, frustrado, em uma longa série de tuítes sobre o empate sem gols entre seu time e o São Paulo, em 1º de outubro.

Futebol é uma das paixões de Cunha - ao lado de religião e política. No mesmo dia, ele pediu votos a seu candidato a vereador no Rio de Janeiro, o também peemedebista Chiquinho Brazão, conhecido por investigações que ligam sua família a milícias fluminenses.

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Talvez tenha sido esta sua última vitória política: Brazão foi eleito com quase 24 mil votos para seu quarto mandato na Câmara Municipal.

Video registrou mulher hostilizando Eduardo Cunha em aeroporto
Foto: Reproducao / BBC News Brasil

Isolamento

Habituado à bajulação de políticos, o ex-todo poderoso da Câmara dos Deputados teve que se acostumar com o isolamento desde que perdeu o foro privilegiado em ações penais, com a cassação do mandato em 12 de setembro.

Após uma comemoração que reuniu ministros e governadores, no ano passado, ele festejou seu aniversário de 58 anos no último dia 29 de forma discreta, apenas com a família.

Há pouco mais de um mês, o Congresso decidiu pela cassação de seu mandato e a suspensão de seus direitos políticos por um placar arrebatador: 450 votos a favor, 10 contra e 9 abstenções.

O deputado Carlos Marun (PMDB/MS), um dos principais aliados de Cunha, disse à BBC Brasil estar "triste" com a decisão do juiz Sérgio Moro pela prisão preventiva do ex-colega.

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Marun ganhou destaque na votação da cassação do peemedebista, quando interrompeu a sessão por sete vezes para tentar atenuar a punição de Cunha - julgado por mentir sobre a existência de contas na Suiça em seu nome.

O defensor solitário de Cunha hoje afirma que "a decisão deixou de ser política e se tornou jurídica".

"O caso saiu da seara parlamentar e foi para o tribunal", disse o peemedebista. O homem mais próximo de Cunha no Congresso não fala com o amigo há três semanas - a última foi por telefone.

"Conversamos pela última vez no aniversário dele (fim de setembro). Ele estava tranquilo, não conversou sobre política", disse.

Pessoalmente, Murun e Cunha estiveram juntos no dia seguinte à cassação. "Era minha obrigação depois de todo esse processo. Depois ele foi se afastando."

Questionado sobre a possibilidade de delação premiada de Cunha, tema nos corredores do Congresso nesta quarta-feira, Marun disse que o parlamentar nunca "disse a pessoas próximas que o faria".

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"Mas não dá para pôr a mão no fogo", acrescentou.

Futebol foi assunto preferido de Cunha nas redes sociais após cassação
Foto: Twitter / BBC News Brasil

Futebol

Dono de mais de 200 domínios na internet com cunho religioso, entre eles Jesus.com, Louvejesus.com, Portaljesusmais.com.br e Facebookjesus.com.br, Cunha desativou o site eduardocunhapresidente.com após o perder o mandato na Câmara.

Inelegível até 2027, ele prefere, no entanto, manter a denominação "deputado" em seus perfis em redes sociais, onde reúne mais de 500 mil seguidores.

Três dias antes da prisão, novamente o futebol dominou os textos publicados por Eduardo Cunha nas redes.

Diferentemente da discrição adotada quando questionado sobre colegas parlamentares na época em que comandava a Câmara, o torcedor flamenguista não poupou críticas a jogadores e comissão técnica.

"Emerson nao da mais para um jogo desses."

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"Alan tambem entrou mal e a sua entrada atrapalhou Diego, que sumiu do jogo depois."

"Continuo achando que o tecnico substitui mal."

Os tuítes foram mesclados com mensagens políticas, em que negou acusações e classificou críticos como "mentirosos".

Família

Segundo pessoas próximas, a principal dedicação do ex-parlamentar no momento é defender a jornalista Claudia Cruz, sua mulher, e sua filha, ambas investigadas por corrupção.

Cruz responde a processo sob acusação de lavagem de dinheiro e evasão de divisas, e é apontada como beneficiária das contas de Cunha na Suíça.

No último domingo, pelo Twitter, Cunha afirmou que reportagens tendenciosas "inventam noticias da minha mulher e da minha familia".

A nota em questão afirmava que a jornalista havia sido hostilizada no banheiro de um shopping center de luxo no Rio de Janeiro. O casal tem sido visto em meses discretas de restaurantes da cidade nas últimas semanas.

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O ex-deputado federal e ex-presidente da Câmara foi preso em Brasília nesta quarta-feira por determinação do juiz federal Sérgio Moro. Cunha é acusado pela Operação Lava Jato de corrupção, lavagem de dinheiro e evasão de divisas.

O Ministério Público Federal afirma que pediu a prisão porque o peemedebista poderia atrapalhar o andamento dos processos em que é acusado e fugir do país, por possuir recursos no exterior e ter dupla cidadania (brasileira e italiana).

Moro também determinou o congelamento de contas bancárias de Cunha.

O ex-deputado nega as acusações. Em nota divulgada por seus advogados, Cunha diz que "trata-se de uma decisão absurda e sem nenhuma motivação".

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