Com uma capacidade estratégica fora dos padrões e um talento de tirar vários coelhos de cartola em corridas eleitorais praticamente perdidas, o publicitário João Santana – que já emplacou seis presidentes – está prestes a ver um escândalo manchar sua prestigiada carreira em questão de dias.
Os dias de reconhecimento de Santana podem estar contados após a 23ª fase da Operação Lava Jato, também conhecida como Operação Acarajé, que decretou a prisão temporária do marqueteiro, de sua mulher, Mônica Moura, e de outras seis pessoas. O casal é suspeito de receber pagamentos ocultos no exterior realizados pela Odebrecht e pelo operador financeiro do esquema de corrupção na Petrobras Zwi Skornicki, de acordo com o Ministério Público Federal.
Segundo o MPF, há evidências de que a Odebrecht transferiu US$ 3 milhões entre abril de 2012 e março de 2013 para uma conta mantida no exterior por Santana e Mônica. Para os procuradores, trata-se de um "valor sobre o qual pesam indicativos de que consiste em propina oriunda da Petrobras que foi transferida aos publicitários em benefício do PT".
Santana trabalhou nas duas campanhas da presidente Dilma Rousseff e na reeleição do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Além deles, conduziu outras quatro campanhas presidenciais: Mauricio Funes (El Salvador, 2009), Danilo Medina (República Dominicana, 2012), José Eduardo dos Santos (Angola, 2012) e Hugo Chavez/Nicolás Maduro (Venezuela, 2012 e 2013).
Considerado um gigante do marketing político, o baiano Santana se formou em jornalismo – chegou a trabalhar no Jornal da Bahia, no Jornal do Brasil, em O Globo e nas revistas Veja e Isto É -, mas não gosta de conceder entrevistas. Não esconde de ninguém, porém, que adora manter boas relações com quem está no poder.
Com conhecimento de sobra para administrar crises, Santana faz a linha "ame-o ou deixe-o". Além da genialidade e competência, seriedade e exigência seriam outras características constantemente atribuídas ao publicitário por quem o conhece.
Em suas campanhas, o marqueteiro usa e abusa de recursos que encarecem as produções, como diversos cenários, atores e figurantes. Quando as disputas estão um pouco mais acirradas, ele não economiza em pincelar as campanhas com agressividade.
O próprio Santana já fez uma análise sobre sua atuação em campanhas políticas. De acordo com ele, o marketing adapta a política ao gosto do eleitor e o maior problema na aceitação do trabalho do marqueteiro está exatamente em compreender a diferença entre persuasão e manipulação.
Em Um marqueteiro no Poder (Editora Record), sua biografia escrita pelo jornalista Luiz Maklouf Carvalho, o próprio Santana afirma que "há um limite entre essas duas ações e muita confusão desde a Grécia antiga. Os detratores da publicidade política-eleitoral acham que nós apenas manipulamos e que a massa é imbecil. Hoje, o meu corpo, o meu afeto e minha relação afetiva e sexual passam pelo mundo da mídia. Por que a política não passaria por aí? E o que fazem o marketing e a propaganda política? Um exercício de persuasão, usando instrumentos legítimos. E a democracia é isso: o choque de elementos de persuasão".
De acordo com números disponíveis no site do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), sua empresa, a Pólis Propaganda e Marketing, recebeu, do PT nacional, R$ 13,7 milhões pela campanha de Lula em 2006, R$ 9,8 milhões pela de Marta Suplicy em 2008, R$ 42 milhões pela de Dilma em 2010 e R$ 30 milhões pela de Fernando Haddad em 2012. Um total de R$ 95,6 milhões. É o que há no TSE até 2012. Não existe TSE ou semelhantes para as campanhas internacionais. O suposto faturamento de US$ 65 milhões de Santana na campanha presidencial de Angola nunca foi confirmado nem desmentido pelo marqueteiro.
Repercussão da prisão
Após a decretação da prisão de Santana, o presidente nacional do PT, Rui Falcão foi um dos primeiros a se pronunciar sobre o tema e foi contundente ao afirmar que a detenção do marqueteiro não tem relação com a sigla, “cuja finança é legal e declarada à Justiça”.
"Santana vai prestar depoimento e vai se explicar. Do ponto de vista do PT, as nossas declarações foram apresentadas à Justiça Eleitoral e todas as doações são legais. A prisão de Santana não tem nenhuma relação com o PT", disse Falcão.
Candidato à reeleição na República Dominicana, Medina, para quem Santana dedicava seu tempo profissional ultimamente, lamentou que o marqueteiro tenha deixado sua campanha e afirmou que o brasileiro era “um assessor importantíssimo”.
Já o líder do PT na Câmara dos Deputados, Afonso Florence, minimizou a prisão e criticou os recentes passos das investigações.
"A Operação Lava Jato começa a correr o risco de cair em descrédito. A operação insiste na busca de pistas contra o presidente Lula, que recebe uma abordagem condenatória”, afirmou o petista. “Há um ambiente em que as delações premiadas e as instituições começam a ficar sob risco de perder credibilidade. Parece mais um diversionismo", completou.
O vice-líder do PMDB na Casa, Manoel Júnior, chamou a atenção para a atuação da presidência durante a campanha, tentando evitar que a prisão de Santana respingasse na imagem do vice-presidente, Michel Temer, também do PMDB.
“Se tem essas provas de pagamento de caixa 2, é complicado. O governo tem que se explicar sobre isso, já que a própria assessoria da Presidência da República foi responsável pelo processo eleitoral, a parte institucional do partido, tem que se explicar”, pontuou.
Revolta dos opositores
Enquanto os governistas se esforçam para demonstrar que a relação entre PT e Santana não carrega nenhuma irregularidade, membros da oposição estão munidos de críticas ao publicitário e ao governo.
Antonio Imbassahy, líder do PSDB na Câmara, destaca que o foco da nova fase da Operação Lava Jato é Santana, marqueteiro da campanha de Dilma, principal publicitário do PT e conselheiro da presidente, frequentador assíduo do Palácio do Planalto e da Alvorada.
“Antes tinha sido o tesoureiro da campanha, o João Vaccari; essa combinação deixa a clareza de que a campanha da Dilma em 2014 foi irrigada por dinheiro de propina do petrolão. Acho que o TSE agora vai ter uma indicação muito mais robusta e que, certamente, pode levar à cassação da presidente. É uma coisa muito constrangedora para o país, porque o PT produziu esse péssimo exemplo e que vai ter o preço pago nas ações que estão em curso", criticou o deputado tucano.
No mesmo sentido, o senador José Agripino Maia, do DEM, declarou que a prisão de Santana “constata a recorrência de um hábito do PT que vem desde o caso Duda Mendonça, que também declarou receber pagamento com recursos do exterior. A acusação agora é a mesma. Se as denúncias forem comprovadas, isso mostra que esse é um hábito antigo praticado nas campanhas presidenciais do PT".