O ministro Ricardo Lewandowski deve assumir o leme da mais alta corte do país marcando seu mandato com mais diálogo e uma postura mais serena do que o atual presidente, Joaquim Barbosa, que anunciou nesta quinta-feira sua aposentadoria para o final de junho.
Pela tradição da Corte, quem deverá assumir, por ser o ministro há mais tempo no Tribunal sem ter ocupado a presidência, é Lewandowski, tido pelos colegas de corte e juristas ouvidos pela Reuters como alguém mais aberto a posições contrárias.
Mesmo antes de ocupar a presidência, Barbosa já protagonizara discussões e trocas de farpas com colegas publicamente durante votações no plenário.
Uma pista de como as gestões podem ser diferentes é o posicionamento assumido pelos dois magistrados durante o julgamento do mensalão, escândalo de compra de apoio político ao então presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva que tornou-se um dos processos mais complexos a ser julgado pela Corte.
Barbosa, que era o relator da ação penal, e Lewandowski, que atuou como relator-revisor, divergiram em diversas das votações envolvendo o caso.
“Será uma presidência mais serena”, disse o jurista Ives Gandra Martins, que reconheceu a importância de Barbosa de levar adiante o julgamento do mensalão, embora tenha manifestado “divergências” com algumas das decisões tomadas pela Corte nesse processo.
"O temperamento do ministro Ricardo Lewandowski é diferente do temperamento do ministro Joaquim Barbosa. O ministro Joaquim Barbosa vem do Ministério Público. O Ministério Público é o acusador, o defensor da sociedade, mais incisivo. Enquanto que o ministro Lewandowski vem da advocacia e depois da magistratura, a tendência é um temperamento mais ameno", acrescentou o jurista.
O veterano ministro do STF Marco Aurélio Mello, que elogiou o colega de saída dizendo que Barbosa deve ser reconhecido por demonstrar durante o julgamento do mensalão que a lei serve “para todos indistintamente”, afirmou que a presidência de Lewandowski deve ser “uma gestão calcada acima de tudo no diálogo”.
Para o presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros, João Ricardo dos Santos Costa, a mudança na gestão é óbvia, uma vez que cada ministro tem o seu perfil, mas ressaltou que a AMB já cultiva uma relação de bastante diálogo com Lewandowski.
“Esperamos uma gestão plural, que é o perfil dele”, afirmou.
FIDALGUIA
Natural do Rio de Janeiro, Lewandowski tem 66 anos e ocupa uma vaga no STF desde 2006, indicado por Lula. Entre as funções públicas que desempenhou, atuou como secretário de Governo e Assuntos Jurídicos de São Bernardo do Campo, berço do PT, na década de 1980 e, em 1997, chegou ao posto de desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, de onde saiu para assumir uma cadeira no Supremo.
Já como ministro do STF, Lewandowski fez parte do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), tendo presidido o mesmo durante as eleições de 2010.
O ministro Luís Roberto Barroso, mais novo integrante do STF, elogiou a experiência de Lewandowski na advocacia e na magistratura, classificando o futuro presidente como uma pessoa “centrada e fidalga” e “tecnicamente e pessoalmente habilidosa”.
"As pessoas trazem para os cargos as características das suas personalidades”, disse Barroso.
Outro ministro da Corte, Luiz Fux, vê uma perspectiva “muito boa” para o mandato de Lewandowski, que tem “um trato magnífico com os colegas”.
FUTURA ESCOLHA
A vaga de Barbosa deverá ser preenchida por indicação da presidente Dilma Rousseff, já responsável pela escolha de quatro dos integrantes do pleno formado por 11 ministros. Outros três ministros, além do próprio Barbosa, foram indicados por Lula.
A indicação a uma cadeira no Supremo não significa alinhamento político automático dos ministros ao presidente da República.
Primeiro negro a integrar e presidir o STF, Barbosa ganhou ainda mais notoriedade justamente ao relatar de maneira incisiva o processo do mensalão, que resultou na prisão de importantes políticos do PT, partido de Lula e Dilma.
Barroso, ao defender o caráter técnico de qualquer um dos ministros do Supremo, afirmou que no Brasil os posicionamentos dos magistrados obedecem a “nuances” e “situações mais complexas”, “ao contrário da Suprema Corte norte-americana, onde os rótulos políticos são muito nítidos”.
(Reportagem adicional de Eduardo Simões, em São Paulo, e Jeferson Ribeiro, em Brasília)