Maia diz que deve ir para o MDB ou novo partido de centro

Ex-presidente da Câmara segue à frente da articulação de uma candidatura de centro contra Bolsonaro

6 mar 2021 - 00h12
(atualizado às 08h41)

BRASÍLIA - Depois de deixar a presidência da Câmara dos Deputados no mês passado, sem conseguir eleger seu sucessor, Rodrigo Maia (DEM-RJ) vai reorganizando sua estratégia política. Abandonado nessa disputa pelo presidente nacional do DEM, ACM Neto, Maia vai deixar o partido. Ele disse ao Estadão que deve se filiar ao MDB ou a um novo partido de Centro, embora tenha dúvidas sobre a viabilidade dessa segunda alternativa. "O MDB é um partido com quadros com quem eu tenho uma relação histórica muito importante. E me sentiria confortável", afirma o deputado.

Ex-presidente da Câmara, Rodrigo Maia
08/08/2019
REUTERS/Amanda Perobelli
Ex-presidente da Câmara, Rodrigo Maia 08/08/2019 REUTERS/Amanda Perobelli
Foto: Reuters

Paralelamente, Maia segue à frente da articulação de uma candidatura de centro contra Bolsonaro. Ele defende que os quatro principais nomes do grupo - João Doria (PSDB), Luciano Huck (sem partido), Luiz Henrique Mandetta (DEM) e Eduardo Leite (PSDB) - passem o ano debatendo e apresentando suas ideias, mas que isso produza uma candidatura única até o final de 2021. "Nessa eleição, mais importante do que nas outras, os projetos pessoais têm de ser engavetados. Todos têm o direito de colocar o seu projeto até um determinado momento. A partir daí, é óbvio que tem de se consolidar uma candidatura."

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Para Maia, todo o desgaste sofrido pelo presidente Jair Bolsonaro abre espaço político para uma candidatura de oposição nesse campo. Especialmente, com todos os problemas enfrentados pelo governo na condução do combate à pandemia do coronavírus. Ainda assim, ele insiste que não havia condições políticas para abrir um processo de impeachment contra o presidente, apesar dos mais de 60 pedidos que foram apresentados na Câmara durante sua gestão.

Maia defende, agora, a criação de uma CPI da Pandemia para investigar os erros e irregularidades cometidos pelo governo. E não tem dúvidas de que, em algum momento, Jair Bolsonaro e o ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, serão responsabilizados por seus atos no enfrentamento da pandemia. Leia a entrevista:

Desde o ano passado, o senhor busca organizar uma candidatura de centro de oposição ao governo Bolsonaro. Mas o processo de sucessão no comando da Câmara causou um racha entre os partidos que participavam dessa discussão, inclusive no seu partido, o DEM. Ainda é possível montar essa candidatura de centro?

Ela vai ser montada porque a sociedade quer uma candidatura fora dos extremos. E tem uma parte importante da sociedade que quer uma candidatura no nosso campo. Liberal, democrático, o nome que se queira dar. O que precisamos entender é que, dos nomes que temos, começando pelo governador de São Paulo, João Doria, e passando pelo Luciano Huck, Luiz Henrique Mandetta e Eduardo Leite, daqui tem de sair um nome. Nessa eleição, mais importante do que nas outras, os projetos pessoais têm de ser engavetados. Todos têm o direito de colocar o seu projeto até um determinado momento. A partir daí, é óbvio que tem de se consolidar uma candidatura. Todos quatro, cada um com as suas vantagens e desvantagens, têm de fazer isso. Claro que o governador de São Paulo sempre tem um peso enorme na economia brasileira e na vida política brasileira. Mas todos têm as suas qualidades e acho que desses quatro nomes tem de sair uma chapa.

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O ex-ministro Sérgio Moro não faz parte desse pacote de possíveis candidatos?

No meu, não. Até porque não converso com ele. Acho que ele não está nesse campo 100%. Mas como eu também não converso, não sei em qual campo que ele está.

Mas há uma restrição a uma adesão dele a esse grupo?

Eu acho que todo apoio é bem-vindo. Mas não acho que ele deva participar como candidato. Primeiro, eu acho que ele não é candidato. Eu acho que o Moro é candidato ao Supremo Tribunal Federal. Então, ele vai procurar uma candidatura que garanta essa vaga a ele, como Bolsonaro garantiu a ele. Eu acho que esse é o projeto de vida dele. Não acho que ele tem sangue na veia para a política. Agora, é óbvio que é um quadro que tem apoio na sociedade. Você ter o apoio do Moro pode ajudar, dependendo do contexto político. Até porque a gente viu, nitidamente, que nos últimos anos a revelação sobre o que era aquela estrutura em Curitiba, tirou muito apoio daquele grupo que ele comandava. Mas não acho ruim ter o apoio do Moro, desde que não precise ter esse tipo de compromisso, o que não é correto.

E como fazer para que esses quatro nomes se transformem numa só candidatura?

O ideal é que todos trabalhassem em conjunto. Até fazendo um debate nacional, em vários Estados, com vários temas, para que todos pudessem ficar mais conhecidos fora de seus campos. Acho que seria o melhor caminho. E uma regra para que você saísse na virada do ano com um nome só.

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Seu partido, o DEM, sinalizou um alinhamento ao Planalto pela Presidência da Câmara. Agora, o presidente do partido, ACM Neto, fala que Mandetta pode ser candidato do DEM em 2022. É possível ou não contar com o DEM nessa articulação?

O senador Antonio Carlos Magalhães, diferente do neto dele, dizia que deputado a gente não empresta. O Neto resolveu emprestar os deputado dele, entregar a base dele para o bolsonarismo. Eu acho muito difícil acreditar nele, por mais que, de forma desesperada, agora ele esteja tentando criar no Mandetta um candidato. Não pelo Mandetta, que é um candidato forte e que nos estimula nesse processo político. Mas o Neto acabou entregando a base dele, por um acordo menor, ao bolsonarismo. E vai ser muito difícil tirar essa base da estrutura do governo e da estrutura da execução orçamentária, que garante a reeleição de deputados.

Então, vocês contam com o Mandetta, mas não contam com o DEM?

Eu não acho impossível. Mas vai depender muito da verdadeira intenção do presidente do partido em relação ao Mandetta. Porque só dele ter lançado o Mandetta, certamente o Luciano Huck deve ter olhado, o Doria deve ter olhado, puxa, esse menino está mentindo de novo. Prometeu para a gente que ia nos apoiar e está jogando o Mandetta para tentar se salvar do acordo que fez com o Bolsonaro na eleição para Presidente da Câmara. O problema é que quando você comete um erro, vem uma sucessão de erros. O Mandetta será um ótimo candidato, com muita chance de vitória. Mas a credibilidade do presidente do partido é cada vez menor. Porque ele trai o ex-presidente da Câmara e todo um grupo de partidos. E ele foi um dos defensores da candidatura do deputado Baleia Rossi (MDB-SP) e da aliança com a esquerda para a eleição. Isso fica claro, ninguém tem mais dúvida disso. Ele tinha compromisso de filiar o Luciano Huck, de apoiar o Ciro Gomes, de apoiar o Doria também, para não perder o Rodrigo Garcia. Agora, lança o Mandetta. O que tem de real aqui? Porque na hora em que ele diz que pode apoiar do Ciro ao Bolsonaro, o que ele diz? Eu não vou apoiar ninguém.

Sua saída do DEM é irreversível?

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Com certeza.

E para qual partido vai?

Eu estou conversando. Hoje, converso mais com o MDB. E tem também a possibilidade da construção de um partido de Centro. Ou a fusão de alguns partidos.

Criação de um partido não é meio inviável pelo tempo para a eleição do ano que vem?

Com a cláusula de desempenho, com o fim da coligação, se alguns partidos não entenderem que precisam se organizar, isso pode ser uma oportunidade de criar um partido de centro, com 25 a 30 deputados. É um partido do tamanho do DEM, do tamanho do PSDB. Pode ser uma boa alternativa para caminhar.

Qual seria sua tendência hoje? Houve também conversas com o PSL...

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Hoje, estou nessas duas alternativas. O PSL eu acho muito importante que venha para a nossa aliança, que saia de uma vez do bolsonarismo. Mas não posso ir para o PSL porque nem eu posso ir para lá com os bolsonaristas ainda lá dentro, nem eles vão me aceitar. Mas acho que eles têm um timing diferente do meu e não vão tomar nenhuma decisão sobre isso nas próximas quatro semanas. E eu não posso ficar sem partido mais trinta dias. Não que eu faça a filiação formal, por causa da questão da fidelidade partidária. Mas eu preciso anunciar, em mais algumas semanas, o meu partido. Para que eu possa voltar ao plenário da Câmara para participar de discussões como, por exemplo, a da PEC emergencial. Eu quero fazer representando algum partido. Então, não posso ficar seis meses sem, pelo menos, uma oficialização de um caminho. E hoje estou para essas duas opções.

A maior tendência seria fechar com o MDB?

O MDB é um partido com quadros que eu tenho uma relação histórica muito importante. E me sentiria confortável. Claro, isso tem de passar pela sinalização do prefeito do Rio, Eduardo Paes, pelo vereador Cesar Maia...

Todo o seu grupo político irá junto?

Eduardo não tem de tratar de eleição nos próximos dois anos. Agora, claro que o movimento que eu fizer, a nossa base eleitoral, de deputados, vereadores, quando tiver a janela partidária, poderá seguir. Mas eu não faria nenhum movimento político que não seja combinado com Cesar Maia e Eduardo Paes. Eu sou uma liderança, por ter sido presidente da Câmara, mas do ponto de vista regional, quem tem votos são o Eduardo e o Cesar Maia.

O eleitor liberal votou em Bolsonaro em 2018. Esse eleitor pode apoiar a candidatura de vocês em 2022?

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O presidente fez uma aliança com Paulo Guedes para atrair esse voto. Isso não tem mais agora. Acabou. Na primeira entrevista dada pelo Paulo Guedes em Davos, a narrativa acabou não convergindo com a realidade. Todas as expectativas que ele criou não foram concretizadas. Déficit primário zero. O problema todo é que o Paulo conhecia pouco a máquina pública. Quer dizer, o déficit primário está aí. Há a falta de um projeto, de uma agenda de ampliação da competitividade das empresas brasileiras. Isso nunca existiu. O único projeto ali, projeto de liberdade econômica, é muito generalista, de pouco impacto real na economia. E a proposta que deveria e poderia gerar um impacto na competitividade das empresas, num ambiente melhor de negócio, que é a reforma tributária, unificação dos impostos de bens e serviços, ele é contra. Ele inventa que vai aumentar a carga tributária. Quem aumentou carga tributária foi ele agora. E ele também queria a CPMF.

Ficou tudo na promessa?

No que ele prometeu, da redução de despesa, ele não entregou. A Previdência foi o Congresso que entregou. Nas três grandes privatizações que prometeu, não entregou nenhuma, nem acho que vai entregar. Por mais que tenha dado uma sinalização, não acho que vai privatizar nada agora. Na política de crescimento econômico, todas as sinalizações do governo são negativas. O governo é contra a reforma tributária, é contra o meio ambiente. O governo sinaliza que questiona as instituições democráticas. Então, o que acredito é que o problema do Brasil está exatamente na falta de projeto. Em 2019, eu disse que o governo era um deserto de ideias e que o Paulo Guedes era uma ilha nesse deserto. Agora, o território do deserto está aumentando e o Paulo Guedes se revelou só uma miragem.

Nos últimos dias, a pandemia do coronavírus disparou no Brasil, com recordes de mortes diárias. O que fez com que a situação ficasse desse jeito?

Nós estamos chegando nesse ponto pela total falta de articulação do Governo Federal no combate à pandemia. Pela negação, pelo estímulo pessoal da figura mais importante do País, que é o presidente, às aglomerações, ao não uso de máscara, ao confronto entre a economia e a vida. E que é um confronto falso. A gente sabe que a solução da pandemia está diretamente relacionada à solução da economia. Não tem uma solução descasada. Então, é esse conflito que o presidente estimula, de pequenos comerciantes, por exemplo, que têm razão no seu desespero. Tudo isso acabou gerando um ambiente na sociedade de que se pode negar o pior vírus que apareceu em cem anos.

Há muitas críticas ao governo pela falta de coordenação nacional no combate à pandemia...

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Os brasileiros estão pagando uma conta exatamente por essa falta de coordenação. Não que fosse possível evitar perda de vidas. Ou que a economia não fosse gerar uma perda de empregos, uma perda de renda e um aumento da pobreza. Ninguém está dizendo isso. Mas você olha o exemplo de Portugal agora. No início do ano, era o pior país. Fez o lockdown e, agora, a queda na contaminação e no número de mortes é muito grande. Então, ninguém está dizendo que tem de defender isolamento desse tipo. Até porque num País com grandes centros urbanos, onde moram duas, três famílias na mesma casa, ninguém está dizendo que é fácil fazer um lockdown. Mas, pelo menos, uma redução da circulação. Dentro dos próprios bairros já teria gerado um resultado positivo em relação a esse recorde de mortes.

O senhor acha que o governo negligenciou a aquisição de vacinas?

Existe toda uma negação da importância da vacina. E a gente vê que tudo é oportunismo. Eles mudam o discurso quando perdem a batalha de algum tema, como primeiro aconteceu com a vacina do Butantã, que começaram a chamar de chinesa. Depois, começaram a brincadeira de que todo mundo iria virar jacaré. Quando a vacina passou a ser confiável, depois dos testes, virou a vacina nacional. Não é mais uma vacina do Butantan. Depois, começou todo o enfrentamento para negar a necessidade de comprar outras vacinas. Quando o Congresso deu um passo, nessa semana, para autorizar Estados e Municípios a comprarem vacinas. o governo vai lá e resolve comprar. Depois de ter negado um acordo de compra com o presidente da Pfizer, no ano passado, por várias semanas, agora, resolve ir atrás da solução. Que é exatamente a vacina.

O que acha que aconteceu?

O governo opera muito mais no sentimento político do que na responsabilidade, na razão. Porque todos os passos e todos os recuos mostram, inclusive, que não há convicção de nada. A convicção deles, certamente, é um número de compartilhamentos no Twitter, no Facebook, os comentários...Tem essa rede social que acaba formando a opinião do governo e de boa parte dos seus auxiliares. Então, acho que estamos vivendo o pior momento exatamente pelo governo não ter assumido o seu papel. É tão claro isso que quase toda semana o presidente diz que o Supremo Tribunal Federal tirou dele essa responsabilidade.

O que o senhor acha de o presidente tentar empurrar a responsabilidade pelo aumento da pandemia para os governadores, alegando que, por ordem do Supremo, não pode fazer nada?

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O problema é que ele está mal assessorado ou não quer ouvir o que foi a decisão do Supremo, no ano passado. A decisão do Supremo disse: nós vivemos num país federado. Os municípios têm as suas responsabilidades. Os Estados têm as suas, e a União tem o papel fundamental de coordenar o Sistema Único de Saúde. É isso. Aliás, a vacinação está mais atrasada do que deveria porque o governo não quer abrir mão do seu poder. Na vacina, ele não quer, de forma nenhuma, autorizar que Estados comprem a vacina. Mas, para a sociedade, diz que o Supremo é quem barra a vontade do governo de comandar o processo político da saúde pública do Brasil.

Esse jogo de narrativa do governo está tendo impacto no combate da pandemia?

O jogo de narrativa e a negação do vírus e da vacina estão gerando um número muito maior do que deveria em perda de vidas. E, agora, a equipe econômica, pela primeira vez, fala que só a vacina é a solução. Porque vai gerar um impacto forte esse ano do não crescimento da economia, da perda de empregos e da perda de renda. E do aumento da pobreza no Brasil. Outro dia, o Cláudio Adilson, que escreve no Estadão, fez um artigo dizendo que pegou um estudo de outro economista mostrando que se você tivesse um planejamento feito desde o ano passado, organizado, até o meio do ano você conseguiria imunizar pelo menos toda a população acima de sessenta anos, você teria automaticamente uma projeção de crescimento muito maior que esse crescimento negativo. Porque um crescimento de 3% é um crescimento negativo. Só o efeito estatístico já deveria gerar um crescimento acima de 3% esse ano. Como devemos ter um crescimento abaixo de três, nós estamos gerando mais um recuo real da economia. E se a vacinação estivesse acontecendo, você teria um crescimento maior, a economia voltando, os empregos sendo garantidos e a pobreza sendo reduzida. O que conseguimos foi o inverso. Então, toda a política que o governo diz que faz em defesa da economia, porque a economia mata tanto quanto o vírus...O que acontece é o contrário. A posição do governo está levando o Brasil a perder mais vidas com a saúde e vai fazer o Brasil perder mais vidas também pelo impacto da economia na vida das pessoas.

Ainda faltam quase dois anos para o fim do mandato do presidente e ele planeja disputar a reeleição. Nessas condições que o senhor acabou de falar sobre a saúde e a economia, qual seria o impacto de mais quatro anos de mandato para Bolsonaro?

Não quero avaliar o que vai acontecer nos outros quatro anos. Mas acho que o ano de 2021 já vai ser de muita dificuldade para o Brasil. O número de mortos vai chegar a quanto? Trezentos mil mortos? Vai chegar a mais de trezentos e cinquenta mil. Vai ter queda da economia, aumento da pobreza. Vai ter mais brasileiros vivendo abaixo da linha da pobreza. Mais brasileiros com fome. As campanhas contra a fome do Betinho, por exemplo, tinham acabado e voltaram no final do ano. Doação de alimento não precisava mais. Esse tipo de pobreza não era mais vista. Querendo ou não, o presidente não toma decisões concretas em relação a nada. É tudo decisão política. Na questão de reduzir o imposto do botijão de gás, a economia que isso vai gerar é irrelevante. O que ele deveria ter pensado é como você faz uma política social para que mais de um milhão de famílias possam voltar a comprar o botijão de gás, cozinhar com gás, sem precisar cozinhar com lenha. É uma falsa ajuda. Porque essa questão não se resolve mexendo na parte tributária. Porque a questão tributária não serve para resolver política social no País. Ela se resolve com aumento de renda, com geração de emprego, com políticas sociais focalizadas para os mais vulneráveis. Nós já estamos desde o final de 2019 com essa informação de que o preço do botijão de gás estava gerando impacto na vida das pessoas mais pobres. E nada foi feito.

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Por tudo isso que o senhor está falando, o comportamento do presidente em relação à pandemia não caracterizaria crime de responsabilidade? O senhor não poderia ter pedido a abertura do processo de impeachment quando ainda presidia a Câmara?

Olha, o impeachment é um julgamento jurídico-político. O crime de responsabilidade pode existir, como o crime comum pode existir também por parte do presidente. Nós temos dois instrumentos. Agora, no nosso caso, a base de decisão da Câmara é diferente de decisão da Procuradoria-Geral da República. É uma base estritamente política. A PGR abre uma investigação e tem os instrumentos para fazer uma pré-investigação. A Câmara não tem esse mesmo caminho. Então, a decisão acaba sendo, correta ou não, muito frágil do ponto de vista do embasamento jurídico. Agora, no Congresso, é sempre o julgamento político. E as bases do julgamento político eu acho que ainda não estão dadas. Nem antes, nem hoje. E acho que isso poderia gerar, como gerou nos Estados Unidos, um fortalecimento da narrativa radical no Brasil. Trump estava com a reeleição resolvida e perdeu pela pandemia. Não perdeu pelo processo de impeachment que sofreu e que foi derrotado no Congresso americano. Então, sem condição política, não adianta. O que sempre defendi, desde o ano passado, é que se as condições políticas não estão dadas e há indícios que as condições jurídicas podem existir, o melhor caminho era abrir uma CPI para investigar. Seríamos, vamos dizer assim, mais objetivos nessa pré-informação sobre a possibilidade ou não de o presidente ter cometido o crime de responsabilidade. Agora, sem dúvida nenhuma, todas essas posições polêmicas do presidente e do seu ministro da Saúde pagarão um preço em algum momento".

Terão uma responsabilização?

Terão uma responsabilização. O ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, até numa situação muito pior que a do Presidente. A gente não sabe nem se amanhã, se ele não for ministro da Saúde, como é que fica a situação dele".

O senhor acha que ele poderá ser preso?

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Isso não sei porque é problema do Judiciário prender, soltar. A minha opinião é que ele, sem estar protegido pelo cargo de ministro, terá muita dificuldade para defender os seus atos à frente do Ministério da Saúde. Porque daquilo que disseram que era bom, que é a logística, ele é um desastre. Tem também todos os atos na defesa de medicamentos não recomendados e que têm comprovada a sua ineficácia. Toda a desorganização da logística, da falta de apoio aos governos, começando pela situação do Amazonas, com a crise de Manaus. Como coordenador do sistema, não funcionou a logística, não apenas na questão do oxigênio, mas de UTIs, em articulação com Estados e municípios. Então, acho que, certamente, em algum momento, tanto o presidente, quanto o ministro da saúde, serão responsabilizados pelos seus atos".

Mas essa avaliação não justificaria a abertura do impeachment?

Eu continuo defendendo que o melhor instrumento seria uma CPI. Porque acho, inclusive, que o processo do impeachment, nesse momento, ajudaria o presidente. Porque tiraríamos da frente dele duas mil mortes diárias e colocaríamos um debate político entre os radicais do Bolsonaro e parte da sociedade, aonde esse seria o embate. Eles criariam uma narrativa a favor dele. Nesse momento, eu acho que uma CPI seria o melhor instrumento pra investigar.

Mesmo com as assinaturas já conseguidas, há dificuldade política para abrir uma CPI da Pandemia no Congresso...

No Senado. Na Câmara, na minha gestão, o pedido não chegou a obter as assinaturas necessárias. Até o dia 1º de fevereiro, as assinaturas não tinham chegado. Se tivessem chegado, eu tinha deferido. Eu acho que uma investigação é o caminho correto na relação do Legislativo com o Executivo. Com o número recorde de mortos, toda a desorganização do Sistema SUS pelo Ministério da Saúde, a negação da vacina e o atraso da compra das vacinas, é inevitável. O Brasil precisa e clama pela CPI".

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