Em 2022, o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), morou em um apartamento de luxo localizado no bairro de Jurubatuba, na Zona Sul da capital. O imóvel pertence a Fernando Marsiarelli, proprietário da Imóveis Ravello Ltda e da empreiteira FFL Sinalização Comércio e Serviços Ltda. Desde 2021, o empresário firmou contratos com a prefeitura que somam mais de R$ 600 milhões, todos obtidos com dispensa de licitação. A informação é do repórter Flávio Ferreira, do jornal Folha de São Paulo.
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À Folha, o prefeito confirmou ter residido no apartamento, mas afirmou que desconhecia o fato de o proprietário ser um fornecedor do município, alegando que a situação foi uma “grande e infeliz coincidência”.
Nunes também disse que arcou com apenas um quarto do valor do aluguel do imóvel, afirmando que o restante foi quitado pela imobiliária que intermediou a locação, utilizando uma indenização referente a uma dívida anterior com o prefeito.
A imobiliária é de propriedade de Ronaldo do Prado Farias, que já manteve contratos com creches conveniadas à prefeitura e atuou como diretor da SPObras (São Paulo Obras), cargo que ocupou por indicação do MDBista.
Com relação à FFL, a empreiteira firmou contratos de obras com a Prefeitura de São Paulo, sem licitação, que ultrapassam R$ 600 milhões desde 2021, com destaque para intervenções emergenciais em pontes, viadutos e margens de córregos, conforme informações do portal do Tribunal de Contas do Município (TCM) obtidas pelo jornal.
Os contratos sem licitação mais expressivos foram celebrados em 2023, após Nunes ter residido no imóvel, totalizando R$ 386,7 milhões. O apartamento, pertencente ao empreiteiro, possui 266 metros quadrados e está localizado em um edifício com dois apartamentos por andar.
Prefeito nega irregularidades
Nunes afirmou que sua família viveu no apartamento por aproximadamente quatro meses, entre o final de maio e setembro de 2022, período em que sua residência, localizada no bairro de Interlagos, passava por reformas.
Segundo o prefeito, foi sua esposa, Regina, quem conduziu as negociações sobre a locação com a imobiliária Lopes Invest House, que apresentou seis opções antes de finalizar o contrato.
Ele alegou que só soube do acordo após sua concretização pela esposa e que nunca teve qualquer contato com o empresário proprietário do imóvel.
“Eu posso garantir que tudo [foi] correto, de forma idônea, nada de irregular, nenhum tipo de benefício. Nem conhecemos essa pessoa, zero de relação e de contato que possa suscitar algum privilégio ou algum benefício voltado à questão de ele prestar serviço à Prefeitura de São Paulo”, disse Nunes.
Questionado sobre o pagamento do aluguel, o prefeito afirmou que, do valor total de R$ 48 mil referente à locação, R$ 35 mil foram pagos pela imobiliária de Ronaldo Farias.
De acordo com Nunes, esse arranjo teria ocorrido porque a empresa de Farias tinha uma dívida com ele nesse montante e utilizou o pagamento de parte do aluguel como forma de compensar o débito. Ele também afirmou que a sede da imobiliária opera em um imóvel de propriedade de uma de suas empresas.
Segundo o prefeito, durante oito meses no período da pandemia, a imobiliária pediu o adiamento de pagamentos mensais no valor de R$ 6.000. O crédito acumulado por esse acordo, conforme alega, foi utilizado para abater parte do aluguel do apartamento em que sua família residiu em 2022.
As movimentações envolvendo o imóvel ocorreram em períodos próximos. Conforme registros da Jucesp (Junta Comercial de São Paulo), o empreiteiro Fernando Marsiarelli fundou a empresa Imóveis Ravello Ltda em 13 de abril de 2022. Pouco depois, em 16 de maio, a Ravello adquiriu o apartamento posteriormente ocupado pelo prefeito Nunes.
Segundo uma cópia do contrato apresentada pelo prefeito, o acordo de locação foi firmado em 26 de maio de 2022, apenas dez dias após a compra do imóvel. O documento, no entanto, menciona erroneamente a imobiliária de Ronaldo Farias como proprietária do apartamento, quando, na verdade, ele pertence à empresa de Marsiarelli.
O contrato de locação foi inicialmente estipulado para três meses, mas, de acordo com Nunes, foi prorrogado por mais um mês devido ao atraso na reforma de sua residência.
Imóvel já foi usado por outro integrante da prefeitura
O apartamento em que residiu o prefeito, pertencente ao empreiteiro, foi o mesmo que, de acordo com o UOL, passou a ser utilizado no início de 2023 por Eduardo Olivatto, então chefe de gabinete da Secretaria de Infraestrutura Urbana e Obras (Siurb). Durante esse período, Olivatto registrou uma empresa e indicou o imóvel como endereço oficial da sede da nova companhia.
O UOL também revelou que Olivatto morava com sua família em outro apartamento de propriedade da Ravello, empresa do empreiteiro, localizado em um prédio de alto padrão no bairro de Pinheiros, na Zona Oeste da capital.
Olivatto, que foi um dos principais alvos de críticas ao prefeito na última eleição municipal, foi exonerado por Nunes no mês passado.
Empresário nega relação com Nunes
Procurado pela Folha para comentar sobre o imóvel utilizado pelo prefeito, Marsiarelli negou qualquer vínculo com Nunes.
Em nota, ele declarou: a “Imóveis Ravello é proprietária de diversos imóveis, incluindo o apartamento mencionado. A Ravello não alugou o referido imóvel ao prefeito. A transação foi intermediada por uma imobiliária parceira, a AGL Imóveis SS Ltda (Lopes Imobiliária), que não pertence a Fernando Marsiarelli”.
“O aluguel foi acordado para uma temporada de quatro meses, para a família Nunes, por um valor compatível com o mercado, e todos os pagamentos, incluindo as despesas do imóvel, foram realizados normalmente”, afirmou.
“É importante destacar que a família Nunes assinou o contrato sem qualquer intermediação da Ravello. Fernando Marsiarelli não conhece o prefeito Ricardo Nunes nem participou de qualquer negociação relacionada às locações dos imóveis da empresa Ravello, que são administrados por algumas imobiliárias”, completou.
