O que já se sabe sobre a delação de Mauro Cid e como ela implica ex-presidente Jair Bolsonaro

Cid já deu informações importantes para a PF sobre a atuação do ex-presidente no caso das joias, no esquema das fraudes nos cartões de vacina e da tentativa de um golpe de Estado após a eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT)

24 out 2023 - 21h02
(atualizado às 21h40)
Mauro Cid
Mauro Cid
Foto: Mateus Bonomi/AGIF via Reuters Connect

A delação premiada do ex-ajudante de ordens, tenente-coronel Mauro Cid, pode tornar a situação jurídica do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), seu ex-chefe, ainda mais conturbada. Já foi revelado que Cid deu informações importantes para a Polícia Federal (PF) nos casos em que Bolsonaro é uma figura central nas investigações: a venda ilegal das joias sauditas, a fraude nos cartões de vacina no sistema do Ministério da Saúde e a tentativa de golpe de Estado após a divulgação dos resultados das eleições do ano passado.

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Ex-presidente teria ordenado fraudes em cartões de vacina

Segundo informações do portal UOL, Cid admitiu a sua participação no esquema de fraudes dos cartões de vacina de covid-19 no sistema do Ministério da Saúde e implicou Bolsonaro como o mandante. O portal diz que o ex-chefe do Executivo pediu que os cartões dele e da sua filha, Laura, de 13 anos, fossem manipulados.

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Segundo o tenente-coronel, os documentos fraudados foram impressos e entregues ao ex-presidente para que ele usasse quando "achasse conveniente". Os dados falsos de Bolsonaro e de Laura teriam sido inseridos no sistema do Ministério da Saúde por servidores da Prefeitura de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, no dia 21 de dezembro de 2022, nove dias antes do ex-chefe do Executivo viajar para os Estados Unidos antes da posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Naquela época, as leis americanas exigiam que os viajantes comprovassem a imunização contra a covid-19.

A declaração de Cid confirmou hipóteses já trabalhadas pela PF. Segundo os investigadores, Bolsonaro e os seus aliados tinham "plena ciência" das falsificações. O objetivo seria obter "vantagem indevida" em situações que necessitassem comprovação de vacina contra a covid no Brasil e nos Estados Unidos.

Em um depoimento para a PF no dia 16 de maio, Bolsonaro negou que ele e a filha teriam sido vacinados contra a covid-19. O ex-presidente também afirmou que não determinou e não tinha conhecimento das fraudes, o que agora é confrontado pela delação premiada do ex-ajudante de ordens.

Quem é Mauro Cid, o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro Quem é Mauro Cid, o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro

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Em suas redes sociais, o advogado e assessor de Bolsonaro, Fabio Wajngarten, rechaçou a hipótese de Bolsonaro ter ordenado a falsificação dos dados de vacinação, como Mauro Cid teria dito à PF. "Chance zero", disse Wajngarten na rede social X (antigo Twitter), completando: "Mundo todo conhece a posição do Pr @jairbolsonaro sobre vacinação. Como chefe de Estado, o passaporte/visto que ele possui não exige nenhuma vacina. Filha menor de idade jamais necessitou de vacinação, até porque possui comorbidades", afirmou Wajngarten.

Bolsonaro recebeu dinheiro ilegal de venda joias em mãos

Cinco dias depois de sair da prisão, foi revelado que Cid disse aos investigadores que entregou na mãos do ex-presidente uma parte do dinheiro proveniente do esquema ilegal de venda de joias no exterior. O tenente-coronel admitiu à PF que participou ativamente da venda de dois relógios, um da marca Rolex e outro da Patek Phillipe. O dinheiro da comercialização ilegal teria sido depositado na conta do seu pai, o general da reserva Mauro Cesar Lourena Cid. Bolsonaro, então, teria recebido em mãos US$ 68 mil de forma parcelada, com um repasse nos Estados Unidos e outro no Brasil.

Essas joias foram recebidas por Bolsonaro por conta do seu cargo de presidente da República e, por isso, deveriam ser incorporados ao acervo da União. Porém, as peças foram omitidas dos órgãos públicos, incorporadas ao estoque pessoal do ex-chefe do Executivo e negociadas para fins de enriquecimento ilícito, segundo as investigações. Cid disse que achava que a venda poderia ser imoral, mas não acreditava em uma ilegalidade das vendas.

As tentativas de vender as joias só foram paralisadas após o Estadão revelar, em março, que auxiliares de Bolsonaro tentaram entrar ilegalmente no Brasil com um kit composto por colar, anel, relógio e um par de brincos de diamantes entregues pelo governo saudita para o então presidente e a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro.

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Na delação, Cid também teria dito que a ideia de vender as joias de forma ilegal surgiu como uma forma de "bancar as despesas" processuais de Bolsonaro. "O presidente estava preocupado com a vida financeira. Ele já havia sido condenado a pagar várias multas", disse o tenente-coronel à PF.

Bolsonaro consultou comandantes de Forças Armadas sobre golpe de Estado

Outra informação cedida por Cid à PF durante a delação premiada foi a de que Bolsonaro teria se reunido com a cúpula das Forças Armadas, após o segundo turno das eleições presidenciais, para discutir a possibilidade de uma intervenção militar para reverter o resultado que elegeu Lula para a Presidência.

Segundo o tenente-coronel, apenas o comandante da Marinha, almirante Almir Garnier Santos, aderiu à proposta golpista. Bolsonaro viu a sua pretensão de permanecer no Palácio do Planalto se esvaziar após ouvir de um oficial do Exército que, em caso de um golpe, ele também acabaria sendo retirado da Presidência.

O Estadão apurou que a reunião a que se referiu Mauro Cid ocorreu sob uma atmosfera 'pesada'. No encontro, Bolsonaro revelada a sua ousada 'estratégia' para tentar impedir a chegada do petista ao Planalto.

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O convencimento da alta cúpula das Forças Armadas seria uma versão da "minuta do golpe", que daria um suporte jurídico à trama golpista. O documento teria sido entregue à Bolsonaro pelo assessor Filipe Martins, e dizia em prisão de adversários políticos e a convocação de novas eleições.

Questionado sobre o acordo de Cid com a PF por jornalistas e a afirmação do tenente-coronel sobre a reunião entre os comandantes das Forças Armadas, Bolsonaro disse, no último dia 18, que não tem conhecimento sobre conteúdo dito pelo ex-ajudante de ordens. "Não sabemos nem se é uma delação ou uma colaboração", afirmou.

"Vocês me acusam de querer dar golpe desde janeiro de 2019, quando eu assumi (a Presidência), e também antes, lá atrás. Tanto é que o relatório da CPMI cita fatos do século passado, como sendo golpista", afirmou.

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