A Câmara dos Deputados aprovou na madrugada desta quinta-feira (4/11) em primeiro turno a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que altera alguns compromissos do governo federal com o orçamento, a chamada PEC dos Precatórios.
Depois de ser votada em primeiro turno, o texto segue para deliberação de destaques e para o segundo turno, o que pode acontecer ainda esta semana, ou na semana que vem. O placar da votação foi de 312 a 144 — considerado apertado, com apenas quatro votos a mais que o necessário (308) para aprovação.
Caso a matéria seja definitivamente aprovada sem alterações no Congresso, as duas principais medidas da PEC, a alteração no cálculo do teto de gastos do governo e a flexibilização do pagamento de precatórios pela União, abrirão espaço para mais R$ 91,6 bilhões de gastos em 2022, ano eleitoral. Um dos objetivos do Planalto é direcionar estas verbas para o programa Auxílio Brasil, programa social planejado para substituir o Bolsa Família com valor de R$ 400.
Os precatórios são dívidas da União já reconhecidas pela Justiça, sem possibilidade de novos recursos.
No último domingo (31/10), o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou à BBC News Brasil que aprovação da PEC dos Precatórios é o "plano A" para bancar o Auxílio Brasil.
Após Bolsonaro falar em plano B para bancar o Auxílio Brasil caso a PEC dos Precatórios não passe, Paulo Guedes disse que trabalha com o plano A, mas reconheceu preocupação do mercado com coordenação política.
Veja a resposta a Matheus Magenta, enviado da BBC News Brasil a Roma: pic.twitter.com/aUv8BI2xBc
— BBC News Brasil (@bbcbrasil) October 31, 2021
O valor de R$ 400, maior que o previsto inicialmente, e as alterações no teto de gastos previstas na PEC, geraram críticas sobre uma irresponsabilidade fiscal do governo e até uma sequência de pedidos de exoneração no Ministério da Economia.
O governo batalhou nos últimos meses pela mobilização de parlamentares em prol da PEC dos Precatórios. Até o início da sessão na quarta-feira na Câmara, havia dúvidas sobre se haveria quórum suficiente para votação e sobre as chances de aprovação.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), vem nas últimas semanas se movimentando para viabilizar a votação da PEC, e na quarta-feira argumentou que a matéria deveria ser votada logo para garantir o pagamento do Auxílio Brasil assim que possível.
Na véspera da votação, em uma edição extra do Diário da Câmara dos Deputados, Lira permitiu que deputados em viagem oficial — como aqueles que estão na Cúpula do Clima em Glasgow (COP26) — votassem remotamente. Deputados de oposição, como o líder da minoria, Marcelo Freixo (PSB-RJ) criticaram no plenário esta alteração, apontando-a como uma manobra para garantir a votação da PEC.
Lira também trabalhou para resolver o problema dos precatórios ligados ao antigo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef). A União tem pelo menos R$ 16 bilhões de dívidas com os Estados da Bahia, Ceará, Pernambuco e Amazonas por conta de um erro no repasse de recursos do fundo. Uma lei determinou que parte desses precatórios fossem direcionados a professores dos Estados e municípios afetados.
Antes da votação, o presidente da Câmara havia dito que negociou diretamente com os governadores para garantir o pagamento destes precatórios e viabilizar a deliberação sobre a matéria na Casa. Lira afirmou que estas medidas para resolver a questão do Fundef seriam apresentadas como um substitutivo no plenário.
Em entrevista à BBC News Brasil, Gil Castelo Branco, da organização Contas Abertas, avaliou que a abertura de bilhões para o orçamento do governo graças à PEC deverá viabilizar não só o pagamento do Auxílio Brasil, mas também de algo que é frequentemente acionado como moeda de troca em acordos entre o Planalto e o Congresso: as emendas parlamentares, especificamente as chamadas "emendas de relator".
"Parte do valor para o Auxílio Brasil já está previsto na lei orçamentária. Dos R$ 91 bilhões que o governo anunciou, R$ 50 bilhões iria para o auxílio", afirmou Castelo Branco. "O resto o governo diz que é para poder corrigir os parâmetros do orçamento, mas a gente sabe que na prática ele vai para as emendas."