Além de termos como "caravana" e "festa da Selma" (uma alusão disfarçada à saudação militar "selva"), que circularam bastante em redes bolsonaristas antes da invasão a prédios públicos de Brasília no domingo (8/1), uma outra palavra chamou a atenção pela frequência que passou a ser usada: refinaria.
"Desde o dia 2 de janeiro, no mínimo, já vinha ocorrendo essa movimentação para organizar caravanas para Brasília por meio de postagens de convocação, de memes em grupos de WhatsApp e do Signal [outro aplicativo de mensagens]. Houve uma semana de preparação para o que aconteceu. E o que a gente observa agora é o aumento assustador da palavra 'refinaria' nesses grupos", observa o pesquisador Leonardo Nascimento, da Universidade Federal da Bahia (UFBA).
Ele desenvolve ao lado de Letícia Cesarino, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e Paulo de Freitas Castro Fonseca, também da UFBA, um trabalho de monitoramento de grupos radicais de apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro.
Nos primeiros oito dias de 2023, houve 2.828 menções ao termo "refinaria" em 439 canais (que só transmitem anúncios) e 228 grupos (onde é possível trocar mensagens) bolsonaristas no app Telegram — enquanto nos oito dias anteriores foram apenas 39 menções à palavra, o que representa um aumento de mais 7.000%.
"Era um termo que quase não era mencionado, a não ser em discussões sobre redução da alíquota do imposto do combustível, e de repente ele aparece nos grupos, no contexto de que é necessário ir até as refinarias da Petrobras para atacá-las", afirma Nascimento. A finalidade seria impedir a distribuição de combustível.
"Ou seja, eles têm alvos específicos", diz. As mensagens repetem bordões comuns nos grupos como "o povo, para o povo, pelo povo!" e fazem uma convocação para ajudar outros radicais que estão em refinarias e distribuidoras de combustível.
A Federação Única dos Petroleiros (FUB), sindicato da categoria, disse estar em alerta desde a noite do domingo para verificar a situação de risco e anormalidade nas refinarias da estatal e informou que enviou um documento à Gerencia Executiva de Inteligência e Segurança Corporativa (ISC) da Petrobras.
Houve registro de tentativa de bloqueios de acesso a refinarias em locais como Araucária (PR), Canoas (RS) e São José dos Campos (SP), afirmou a FUB. Segundo o sindicato, a situação foi normalizada.
O senador Jean Paul Prates (PT-RN), indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para a presidência da Petrobras, postou no Twitter que convocações para bloquear acessos e provocar desabastecimento "foram todas evitadas com reforço na vigilância, na inteligência e apoio das forças policiais dos respectivos estados".
'Gerar medo constante'
O pesquisador da UFBA diz que focos de outros ataques começaram a ser cogitados nesses grupos. E afirma que gerar o medo constante é a essência do terrorismo — ele cita a visão formada pelo filósofo francês Jean Baudrillard sobre o tema.
"O medo de que ocorra algum evento catastrófico é a vitória deles. Isso é o terror. No momento em que você diz assim vai acontecer algo, não vai ter gasolina, que é o que eles estão falando, isso já é instaurar o terror."
"Minha maior preocupação é que esse tipo de ocorrência venha a se tornar frequente e com consequências desastrosas para o país", diz.
Invasores bolsonaristas podem pegar mais de 15 anos de prisão
Os bolsonaristas que invadiram e depredaram Congresso Nacional, Supremo Tribunal Federal e Palácio do Planalto cometeram diversos crimes e podem pegar, se somadas as penas, mais de 15 anos de prisão em regime fechado, segundo professores de Direito Penal.
Essa pena pode subir para até 30 anos caso as acusações incluam também crime de terrorismo, como sinalizou o ministro do STF Alexandre de Moraes.
Segundo os criminalistas, os invasores podem ser enquadrados em crimes contra as instituições democráticas, de associação criminosa e danos ao patrimônio público.