PF identifica dez generais na trama para matar Lula, Alckmin e Moraes, diz jornal

Forças Armadas não se manifesta sobre troca de mensagens que identifica núcleo de oficiais de alta patente

21 nov 2024 - 11h22
(atualizado às 11h44)
Principal alvo da operação foi o general Mário Fernandes
Principal alvo da operação foi o general Mário Fernandes
Foto: Reprodução/Youtube

Deflagrada pela Polícia Federal na terça-feira, 19, a operação Contragolpe resultou na prisão de militares suspeitos de estarem envolvidos no planejamento de assassinatos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), do vice-presidente Geraldo Alckmin e do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. A ação também expôs uma ampla rede de integrantes do alto escalão das Forças Armadas, incluindo oficiais de alta patente que compartilhavam informações sobre um golpe de Estado e eram apontados como responsáveis por “pacificar” o País após uma eventual ruptura institucional.

Durante as investigações, foram encontrados mensagens, documentos, áudios e registros de reuniões que citavam, em diferentes níveis de envolvimento, pelo menos 35 militares. Entre os mencionados estavam dez generais, 16 coronéis do Exército e um almirante, apontando a possível participação desses oficiais na trama antidemocrática, supostamente articulada durante o governo de Jair Bolsonaro (PL). As informações são do blog do Fausto Macedo, do jornal O Estado de São Paulo. 

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O principal alvo da operação foi o general Mário Fernandes, ex-secretário-executivo do governo Bolsonaro. A análise de seu celular pela PF revelou trocas de mensagens em que ele e outros militares criticavam o Alto Comando do Exército, afirmando que “tinha que acabar” e declarando: “Quatro linhas da Constituição é o cacete”.

As conversas, marcadas por tom inflamado, evidenciam, segundo apontam os investigadores, a insatisfação de alguns membros das Forças Armadas com a postura da cúpula do Exército, que não teria apoiado o suposto plano para manter Jair Bolsonaro no poder após sua derrota nas eleições.

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Em uma das mensagens, um colega de Mário escreveu: “Kid Preto, cinco não querem, três querem muito e os outros, zona de conforto. É isso. Infelizmente. E a lição que a gente deu para a esquerda é que o alto comando ele tem que acabar. Se cria um general de cinco estrelas ou se promove, se mexe na promoção dos generais e só se promove nos próximos oito anos só um general quatro estrelas. Como é nos outros exércitos. Aí acaba essa palhaçada de unanimidade, acaba essa porra. Foi essa aula que a gente deu para eles, infelizmente.”

Além das mensagens, foi com Fernandes que a Polícia Federal obteve documentos fundamentais para o avanço das investigações. Entre eles, o plano denominado "punhal verde amarelo", que incluía o envenenamento de Lula e o assassinato de Moraes por meio de uma bomba. Além disso, foi encontrada uma minuta de gabinete de crise que teria como objetivo “pacificar” o País após uma eventual ruptura institucional, sob a liderança de aliados próximos de Bolsonaro: os generais Augusto Heleno e Walter Braga Netto.

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Já com o major Rafael de Oliveira, também alvo da operação realizada na terça-feira, foram localizados um arquivo e mensagens relacionadas à operação denominada ‘Copa 2022’, que abordava a prisão ilegal e execução de Moraes. Embora tenha sido iniciada, a operação foi abortada pouco antes de ser concluída. Com o tenente-coronel Hélio Ferreira Lima, a Polícia Federal encontrou uma planilha detalhando o golpe, contendo mais de 200 linhas que descreviam, passo a passo, o plano para a ruptura democrática.

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Foto: Reprodução/PF

Outro alvo da operação foi Lucas Garellus, capitão que trocou mensagens com Rafael de Oliveira e outros coronéis. Ele foi investigado por suspeita de ter colaborado no monitoramento de Moraes. Além disso, mensagens registradas no grupo de WhatsApp ‘Dosssss!!!’ mostram o major Rodrigo Bezerra Azevedo, outro suspeito de estar envolvido na ação ‘Copa 2022’, expressando frustração por a adesão das Forças Armadas ao golpe não ter ocorrido, especialmente após Bolsonaro viajar para os Estados Unidos em 30 de dezembro.

Os militares citados na representação da Polícia Federal como envolvidos direta ou indiretamente na trama golpista foram organizados em três vertentes principais:

  • Militares que dialogavam abertamente sobre o golpe: Incluem aqueles que discutiam explicitamente a ruptura institucional, chegando a expressar insatisfação com a demora na execução do plano.
  • Integrantes do hipotético Gabinete Institucional de Gestão da Crise: Nomeados como participantes de um gabinete que seria formado após a ruptura para “pacificar” e reorganizar o País.
  • Membros do Núcleo de Oficiais de Alta Patente com Influência: Oficiais de elevada hierarquia e poder decisório dentro das Forças Armadas, identificados como peças-chave na articulação do plano.

Núcleo de oficiais de alta patente

De acordo com a Polícia Federal, Mário Fernandes – principal alvo da Operação Contragolpe – seria um dos membros do Núcleo de Oficiais de Alta Patente da trama golpista. A maioria dos militares mencionados como parte desse grupo já havia sido alvo da Operação Tempus Veritatis em fevereiro.

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Os investigadores afirmam que os membros desse núcleo, “utilizando-se da alta patente militar que detinham, agiram para influenciar e incitar apoio aos demais núcleos de atuação por meio do endosso de ações e medidas a serem adotadas para consumação do Golpe de Estado”.

Além de Mário Fernandes, a Polícia Federal inclui outros nomes, como o almirante Almir Garnier Santos, que foi comandante da Marinha entre abril de 2021 e dezembro de 2022, e, segundo o delator Mauro Cid, teria colocado suas tropas à disposição para ajudar Bolsonaro a iniciar um golpe de Estado após as eleições.

Também é citado Laércio Vergilio, coronel da reserva que trocou mensagens sobre o golpe com Ailton Gonçalves Moraes Barros – capitão expulso do Exército e preso em investigações relacionadas a fraudes no cartão de vacinação do ex-presidente.

Outros generais apontados pelos policiais federais são: Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa, que enviou um relatório ao Tribunal Superior Eleitoral sem apresentar provas, lançando suspeitas sobre a eleição; Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa e vice na chapa de Bolsonaro em 2022, que participou de uma reunião em sua residência, onde foi aprovado o plano de ação ‘kids pretos’ contra Moraes (parte de um plano maior que visava o assassinato de Lula e Alckmin); e Estevam Theóphilo, general e ex-chefe do Comando de Operações Terrestres do Exército (Coter), que, em conversa com o ex-presidente, teria se mostrado favorável ao golpe e se responsabilizado por recrutar os ‘kids pretos’ para a ação contra Moraes.

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Todos os citados nas investigações anteriores da PF negaram envolvimento em atividades criminosas.

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"Vai ser guerra civil", disse coronel

As mensagens trocadas por Mário Fernandes com seus colegas de farda são pontos destacados na representação da Operação Contragolpe devido aos detalhes identificados nos diálogos.

Em uma das conversas, o coronel Roberto Criscuoli escreveu, logo após o segundo turno: “Mario, eu tava até conversando agora com o pessoal aqui, cara. Se nós não tomarmos a rédea agora, depois eu acho que vai ser pior. Na realidade vai ser guerra civil agora ou guerra civil depois. Só que a guerra civil agora tem uma justificativa, o povo tá na rua, nós temos aquele apoio maciço. Daqui a pouco nós vamos entrar numa guerra civil, porque daqui a alguns meses esse cara vai destruir o Exército, vai destruir tudo.” Questionado pelo Estadão, Criscuoli negou qualquer envolvimento em planos para assassinar autoridades.

“Então eu acho que essa decisão tem que ser tomada urgente, cara. E o presidente não pode pagar pra ver também, cara. Ele vai destruir o nosso País, cara. Democrata é o cacete. Não tem que ser mais democrata mais agora. Ah, não vou sair das quatro linhas. Acabou o jogo, pô. Não tem mais quatro linhas. O povo na rua tá pedindo, pelo amor de Deus. Vai dar uma guerra civil? Vai dar. Eu tenho certeza que vai dar. Porque os vermelhos vão vir feroz. Mas nós estamos esperando o quê? Dando tempo pra eles se organizarem melhor? Pra guerra ser pior? Irmão, vamos agora. Fala com o 01 aí, cara”, continuou. 

Um dos interlocutores mais recorrentes do general, descrito pelo tenente-coronel Mauro Cid (ex-ajudante de ordens de Bolsonaro e delator) como um dos integrantes mais radicais do governo, é Reginaldo Vieira de Abreu. Durante uma conversa em que Mário criticava o Alto Comando do Exército, Vieira de Abreu respondeu: "O senhor me desculpe a expressão, mas quatro linhas é o caralho. Quatro linhas da Constituição é o cacete. Nós estamos em guerra, eles estão vencendo, está quase acabando e eles não deram um tiro por incompetência nossa. Incompetência nossa, é isso.”

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Vieira de Abreu chegou a solicitar uma reunião de Bolsonaro “só com a rataria” e sem a participação de indivíduos “acima da linha ética”. Ele não foi localizado pelo jornal para comentar o assunto.

Criação de Gabinete Institucional de Gestão da Crise

Os diálogos obtidos pela PF revelam o acesso de Mário Fernandes a figuras próximas de Bolsonaro, como o Capitão Sergio Rocha Cordeiro e o coronel Marcelo Câmara, ambos alvos de operações anteriores da PF. 

O general também manteve contato com Mauro Cid. Em uma troca de mensagens, ele informou ao então ajudante de ordens de Bolsonaro que havia conversado pessoalmente com o à época presidente. Além disso, no dia da reunião entre Bolsonaro e os comandantes das Forças Armadas, quando foi apresentada a minuta do golpe que circulava entre bolsonaristas, o militar enviou o seguinte áudio ao atual delator: “Força, Cid. Cid, acho que você está participando de uma reunião importante aí no Alvorada. Pô, mostra esse vídeo pro comandante, cara. Se possível, transmite durante a reunião, porra. Isso é história. E a história é marcada por momentos como esse que nós estamos vivendo agora. Força.”

Durante a investigação, a PF ainda encontrou uma minuta que detalhava a criação de um "Gabinete Institucional de Gestão da Crise", que teria sido ativado após a diplomação de Lula. Esse gabinete, com estrutura estratégica e de segurança, incluía aliados de Bolsonaro, como os generais Heleno Braga Netto. O grupo tinha a missão de fornecer apoio e coordenação no contexto de um golpe de Estado. A PF suspeita que o documento tenha sido impresso no Palácio do Planalto.

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O gabinete contaria ainda com uma assessoria de Comunicação Social – formada por dois coronéis da Polícia Militar do DF, dois coronéis do Exército e dois tenentes-coronéis - entre eles uma mulher. Havia ainda a previsão de uma Assessoria de Operações Psicológicas (sem militares designados), uma Assessoria Jurídica e uma Assessoria de Inteligência, que seria integrada por três coronéis.

Também haveria assessorias: parlamentar, com três coronéis; de relações institucionais, com o ex-assessor de Bolsonaro Filipe Martins; de administração; de TI, com um general; e de Segurança de Instalações, com outro general.

O Estado de São Paulo solicitou, por meio das assessorias de comunicação do Exército e da Marinha, posicionamentos dos militares mencionados no inquérito da Polícia Federal, mas não obteve retorno.

Em uma nota publicada no dia da operação, o Exército declarou que a instituição “não se manifesta sobre processos em curso, conduzidos por outros órgãos, procedimento que tem pautado a relação de respeito do Exército Brasileiro com as demais instituições da República”. Até o momento, as defesas dos detidos na operação também não se pronunciaram.

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Fonte: Redação Terra
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