Em meio a uma crise com procuradores da Lava Jato, a Procuradoria-Geral da República (PGR) afirmou que o modelo de forças-tarefas - base da operação de combate à corrupção - está esgotado, é desagregador e incompatível com a instituição. A manifestação foi assinada pelo vice-procurador-geral, Humberto Jacques, nesta terça-feira, 30, ao rejeitar a prorrogação do empréstimo de dois procuradores com dedicação exclusiva para trabalhar na força-tarefa da Greenfield.
A força-tarefa da Operação Greenfield, responsável pelo ressarcimento de mais de R$ 11,6 milhões aos cofres públicos, já contou com 5 procuradores com dedicação exclusiva. Agora terá apenas o titular do caso, Anselmo Lopes, e os apoios de outros procuradores com acúmulo de funções. Segundo informações enviadas à reportagem, o planejamento estratégico da operação está cumprido em 41,4% e ainda faltam cumprir 109 metas. Embora ainda não tenha havido manifestação, procuradores lamentam a redução da capacidade de trabalho.
Três procuradores da Lava Jato de São Paulo também perderam a dedicação exclusiva à operação, assim como um procurador da força-tarefa no Paraná. Os seis procuradores terão de acumular os casos de corrupção com os processos das unidades de origem, o que diminui a capacidade de colaboração com as forças-tarefas.
A decisão do vice-PGR, designado pelo procurador-geral Augusto Aras para tratar do assunto, fala que é preciso encontrar uma solução definitiva para os arranjos de composição das forças-tarefas da Lava Jato, que são vistos como precários porque são feitos temporariamente e geram desgastes na hora de renovação.
Somado à a decisão de só permitir a continuidade de procuradores nas forças-tarefas mediante acúmulo de funções, o próprio tom da mensagem do braço-direito amplia o atrito entre as forças-tarefas e a PGR, após o entrevero entre a Lava Jato de Curitiba e a subprocuradora-geral Lindora Araújo, que coordena os processos que envolvem a operação no Supremo Tribunal Federal (STF).
A justificativa do vice-PGR para o fim da exclusividade de dedicação de procuradores nas forças-tarefas foi atender, ao mesmo tempo, essas equipes e e as unidades do Ministério Público Federal (MPF) que requisitaram o retorno dos procuradores cedidos - Naviraí-MS, Sinop-MT e Limoeiro do Norte-CE.
Nos bastidores do MPF, no entanto, a leitura é que a PGR está desidratando as forças-tarefas para forçar a criação da Unidade Nacional Anticorrupção (UNAC) - proposta em discussão no Conselho Superior do MPF - ou alguma outra solução.
A proposta da UNAC é citada no parecer de Jacques, como sendo uma consequência do esgotamento do modelo das forças-tarefas. A criação da unidade, porém, é algo que ainda demandaria muito debate no Conselho Superior do MPF, sobretudo, pelas desconfianças após as últimas declarações da Lava Jato e da PGR.
Uma das dificuldades para o avanço da UNAC diz respeito ao acesso aos dados obtidos por investigações - quem teria permissão para analisar os dados e sob quais condições. Esse tema se torna ainda mais delicado depois de a PGR ter cobrado dados da Lava Jato no Paraná afirmando que há justificativa legal, do que a força-tarefa discorda.
A crise com o Paraná foi deflagrada na semana passada, após a subprocuradora-geral Lindora Araújo visitar a unidade em Curitiba em busca da cópia de dados obtidos pela operação, mas os procuradores negaram e fizeram uma representação na Corregedoria do Ministério Público Federal, que abriu uma sindicância para apurar irregularidades dos dois lados.
A relação entre a cúpula da PGR e procuradores das forças-tarefas de combate a corrupção ficou ainda pior após uma nota pública da PGR, neste domingo, ter afirmado que a Lava Jato não é um órgão autônomo e que não se pode operar fora da legalidade e clandestinamente.
O comentário estremeceu o MPF e foi visto como a mais forte crítica disparada contra procuradores da Lava Jato pela PGR desde o início da operação, atingindo até, indiretamente, ex-procuradores-gerais e magistrados que chancelaram atos da Lava Jato.
A Associação Nacional de Procuradores da República (ANPR) rebateu as suspeitas lançadas pela PGR sobre as forças-tarefas. "Não há fatos idôneos que autorizem, considerado o seu histórico de atuação, a desqualificação do trabalho por elas realizado e muito menos a imputação de pechas de ilegalidade e/ou clandestinidade em sua atuação", disse a ANPR em nota nesta terça-feira, 30.