O ajuste fiscal implementado pela presidente Dilma Rousseff (PT) no início deste segundo mandato vai ser estendido também a programas sociais do governo – com exceção do Bolsa Família e do Minha Casa, Minha Vida, duas das principais bandeiras da campanha pela reeleição.
O anúncio foi feito por Dilma a empresários de materiais para construção, após um dos representantes do setor fazer uma lista de cobranças à petista durante a abertura da Feicon Abimat, considerada a maior feira do setor de construção civil da América Latina – são cerca de mil marcas expostas, de 25 países. O evento começou hoje no centro de Convenções do Anhembi, zona norte de São Paulo.
Dilma falou a uma plateia de aproximadamente 100 empresários. Minutos antes, ao chegar, recebeu vaias de trabalhadores dos estandes, irritados com a política econômica do governo federal ou simplesmente com o esquema de segurança que, por algumas horas, os impediu de acessar os estandes.
Longe das vaias, em um auditório afastado dos estandes, o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Materiais de Construção (Abramat), Walter Cover, classificou como “um momento delicado” a atual conjuntura do País e como “crítica” à área de infraestrutura. Cover defendeu ajustes na economia feitos pelo governo – “são absolutamente necessários”, disse – e afirmou: “Importante dizer que o empresário, em sua grande maioria, tem mantido o equilíbrio, quer a governabilidade, a permanência do processo democrático e está fazendo e irá fazer a crítica precisa, cirúrgica, não a simplista e generalista, e se posicionará para dialogar e buscar o consenso toda vez que for procurado”, declarou.
Para o executivo, porém, a expansão das linhas de crédito imobiliário e a manutenção de programas sociais do governo são medidas que precisam ser mantidas e/ou melhoradas para oferecer respostas ao setor. “Esses programas sociais mantêm renda e emprego das famílias”, destacou.
Dilma respondeu que serão feitos ajustes, mas não no Bolsa Família e nem no Minha Casa – o qual, disse, tem como meta atingir mais 3 milhões de moradias construídas até o fim de 2018. Sem citar diretamente a operação Lava Jato, em que empreiteiras são acusadas de pagamento de propina a funcionário da Petrobras, Cover também defendeu que, “sem deixar de punir”, seja encontrada “uma solução institucional que permita que grandes e pequenas empresas responsáveis pelas obras do Minha Casa, Minha Vida” não sejam prejudicadas “por falta de confiança e segurança no recebimento”.
Sobre os programas, Dilma afirmou que uma auditoria no Bolsa Família ano passado, no período eleitoral, constatou que 750 mil famílias haviam ingressado no programa no mandato, enquanto 1,3 milhão de famílias haviam deixado porque “mudaram de patamar de emprego e renda”. O Minha Casa, disse, tinha uma meta em que o governo se diz “mais audaz” no prognóstico: a terceira etapa do programa, prevista para começar este ano, prevê chegar a 3 milhões de moradias até 2018, contra a previsão inicial de 2,75 milhões de moradias. “Vamos definir aprimoramentos à luz das contribuições”, pediu Dilma.
Sobre os ajustes e correções que serão feitos nos demais programas, a presidente não entrou em mais detalhes, mas definiu: devido à crise “conjuntural” por que o Brasil passa, ao lado de outros países – “vivemos a segunda etapa da crise mais forte que o mundo passou desde 1929”, citou –, os ajustes serão necessários.
“Nós vamos ter de ajustar. Eu não estou aqui dizendo que nós vamos acabar com toda a concepção política. Por exemplo, o Minha Casa, Minha Vida, permanece intacto; Bolsa Família permanece intacto. Mas outros programas, não é que nós vamos acabar com eles”, afirmou. “Nós temos de fazer correções e ajustes, e eles são necessários. Justamente para isso nós estamos adotando medidas que ajustam as contas públicas, o porquê, como eu disse para vocês, é que nós absorvemos no orçamento do governo federal uma parte importante da crise. Mas essas correções e esses ajustes têm propósitos muito claros: primeiro, eles reforçam ainda mais os fundamentos econômicos do País, e constroem novas condições para a retomada tanto do crescimento, quanto do emprego. O ajuste não é o fim em si”, completou.
"Nós não estamos tomando as medidas de correção e ajuste para voltarmos a um momento agora no passado, um momento áureo, mas porque nós achamos que é possível, sim, sermos ainda melhores que fomos, termos condições de superar todos os desafios que estão na nossa frente", encerrou.
A presidente e a comitiva presidencial, na qual estavam os ministros Thomas Traumann (Comunicação Social) e Gilberto Kassab (Cidades) deixaram o Anhembi sem falar com a imprensa.
Bandeira de campanha
O Bolsa Família, que, segundo Dilma, não deverá passar por medidas de ajuste, foi não apenas umas das principais bandeiras de campanha petista pela reeleição, como principal ponto de embate entre Dilma e seus adversários de primeiro e segundo turno, Aécio Neves (PSDB) e Marina Silva (PSB). A campanha da ex-senadora pelo Acre acusava o PT de espalhar boatos de que o programa acabaria se Dilma perdesse; já Aécio, para quem os petistas faziam "terrorismo" sobre o futuro da iniciativa, chegou a defender mudanças no benefício para que ele não fosse pago permanentemente ao cidadão.