Por que não há presos por atos de vandalismo em Brasília?

Governador Ibaneis Rocha chegou a dizer que ordenou a prisão de autores de ataques violentos, mas nenhuma ocorrência foi registrada; analista cita 'leniência' das autoridades

13 dez 2022 - 13h51
(atualizado em 14/12/2022 às 10h04)
Bolsonaristas queimaram carros e tentaram invadir a sede da Polícia Federal em Brasília no final da noite desta segunda-feira, 12.
Bolsonaristas queimaram carros e tentaram invadir a sede da Polícia Federal em Brasília no final da noite desta segunda-feira, 12.
Foto: Estadão Conteúdo/Wilton Junior

BRASÍLIA E SÃO PAULO - Os atos de vandalismo na noite desta segunda-feira, 12, na capital federal terminaram sem que nenhum do autores dos episódios de violência fossem presos. Os manifestantes, que pregam uma intervenção militar para impedir a posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), tocaram fogo em pelo menos oito veículos, apedrejaram uma caminhonete do Corpo de Bombeiros, tentaram invadir a sede da Polícia Federal e atacar diversos prédios públicos e privados na área central de Brasília.

Em nota, a Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal disse que "não foram constatadas prisões relacionadas aos distúrbios civis ocorridos". Segundo a pasta, "para redução dos danos e para evitar uma escalada ainda maior dos ânimos, a ação da Polícia Militar se concentrou na dispersão dos manifestantes". Na noite de segunda-feira, 13, o governador Ibaneis Rocha (MDB) chegou, no entanto, a dizer que a ordem era prender os vândalos.

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Durante os protestos violentos, bujões de gás foram colocados ao lado de veículos que foram incendiados. Pedaços de concreto e pedras colocadas no meio de vias para impedir a passagem de carros. Na ação, a PM usou bombas de gás e balas de borracha, mas não se aproximou de nenhum grupo. Nem mesmo os homens que tentaram jogar um ônibus de cima de um viaduto e depois atearam fogo no veículo foram abordados. Vídeos e fotos da depredação mostram que os policiais guardavam distância dos vândalos.

Apesar da ausência de prisões até o momento, o governo do DF afirmou que os autores dos ataques, "uma vez identificados, serão responsabilizados". Ainda de acordo com a Secretaria, a Polícia Federal vai investigar "os crimes relacionados aos atos que atentem contra a instituição e crimes de natureza federal".

Diferente do que aconteceu neste ano, nos protestos que se iniciaram em junho de 2013, o catador de latas Rafael Braga chegou a ser preso preventivamente durante os atos. Acusado de ter dois coquetéis molotov, ele foi condenado por portar material explosivo. Em 2017, Braga teve a prisão convertida em domiciliar. Além dele, a ativista Elisa Quadros, conhecida como "Sininho" e outros quatro manifestantes que participaram dos protestos foram presos em 2014. Posteriormente, eles foram soltos.

'Leniência'

Para o diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima, um ponto preocupante diz respeito ao que chamou de "grau de leniência das autoridades". Segundo o especialista, houve leniência tanto das forças policiais, quanto das federais como estaduais, e das Forças Armadas.

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"Na justificativa de que as reclamações são legítimas e que deve-se oferecer liberdade de expressão, estamos aceitando que se interprete e a lei e que atos antidemocráticos que precisam ser puníveis não o sejam em nome de uma condescendência e de uma tolerância que nunca foi vista no País. Movimentos sociais foram punidos por atos muito menores."

Lima afirma que seria "muito importante" um posicionamento do Procurador-geral da República, Augusto Aras, sobre os atos de violência em Brasília. "Neste momento, seria muito importante que o procurador-geral da República (Augusto Aras) cobrasse de autoridades que ainda estão no cargo punições a essas pessoas que desrespeitam a ordem e democracia. Não foram feitas prisões, o Corpo de Bombeiros não atuou de forma célere para apagar os incêndios dos ônibus. Primeiro deixou a coisa acontecer para depois atuar. Essa demora é muito perigosa e mostra o grau de comprometimento da institucionalidade", afirmou.

Para Lima, o acirramento dos atos, com ações de violência e vandalismo, vão exigir do próximo governo uma atenção especial na repactuação federativa e na atenção ao sistema de segurança pública no que fiz respeito às ações federais e das policiais estaduais.

'Atos servem de termômetro para a posse', diz coronel reformado da PM de SP

Na avaliação do coronel reformado da PM de São Paulo José Vicente da Silva, as ações causaram estranheza por revelarem atos de violência e vandalismo. "Isso não era notado até então, mas os serviços de inteligência precisam estar atentos, se colocar no meio dos manifestantes para colher informações prévias", afirmou.

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O contexto, no entanto, deve ser avaliado e estudado agora como uma espécie de termômetro. "Será que esse grau de animosidade se revela em todo o Brasil? E, mais: o que pode ocorrer até o dia 1ª de janeiro, quando se espera reunir até 500 mil pessoas em Brasília? Daqui pra frente, o serviço de inteligência precisa de muita atenção e articulação com todas as forças para desenhar cenários de segurança. Não se pode descartar até mesmo optar por uma cerimônia mais discreta. Multidões sempre são muito perigosas."

Em entrevista coletiva na segunda-feira à noite, o futuro ministro da Justiça, Flávio Dino, afirmou que as medidas de repressão serão tomadas. Dino lembrou que o motivo alegado pelos bolsonaristas para começarem os ataques foi justamente a determinação para que um dos radicais fosse preso. "As medidas de responsabilização já adotadas, as que foram adotadas hoje e que serão adotadas irão prosseguir. Não há hipótese de haver passos atrás na garantia da ordem pública em razão da violência. Estado brasileiro tem o dever de agir", declarou.

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