'Precisamos ir à Europa ouvir as críticas', diz Salles

Ministro do Meio Ambiente afirma que aproximação com a iniciativa privada é positiva para tratar do desmatamento

13 jul 2020 - 05h11
(atualizado às 07h58)

Em um tom menos beligerante, o ministro de Meio Ambiente, Ricardo Salles, se diz disposto a dialogar com as empresas brasileiras e investidores externos para buscar soluções conjuntas para a questão ambiental. Com o cargo em xeque nas últimas semanas e muito criticado pela fala de que o governo deveria aproveitar que a mídia estava com a atenção voltada à pandemia do coronavírus para "ir passando a boiada", no dia 22 de abril, durante reunião ministerial, Salles admitiu falhas na comunicação e afirmou que vai estreitar as relações com a iniciativa privada e países europeus para debater soluções completas para a Amazônia.

Ministro Ricardo Salles
09/10/2019
REUTERS/Adriano Machado
Ministro Ricardo Salles 09/10/2019 REUTERS/Adriano Machado
Foto: Reuters

A seguir, os principais trechos da entrevista:

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Nas últimas semanas vimos um movimento de empresários e investidores pedindo mudanças de atitude sobre a política ambiental. Por que os investidores estrangeiros e empresários nacionais estão descontentes?

Acho que essa aproximação de empresas de vários setores é positiva. Nós tivemos duas reuniões (na quinta-feira, com investidores estrangeiros, e na sexta-feira, com empresas nacionais). As preocupações são expressadas de maneira diferente. O estrangeiro não tem o conhecimento que o nacional tem em diversos assuntos, mas no geral vai na linha do desmatamento. E nós, por outro lado, pudemos mostrar a eles que pode ter colaboração entre governo e setor privado.

O desmatamento tem aumentado e há uma preocupação das empresas, desde as queimadas na Amazônia no ano passado, de que o governo não tem agido de forma eficiente para combate. Como as conversas estão sendo conduzidas com o setor privado?

Nós entendemos que é necessária ter uma postura firme das atividades ilegais de toda a natureza: garimpo ilegal, de madeira, de grilagem de terra. Isso compõe o primeiro pilar da estratégia do governo. São cinco pilares. O primeiro é comando e controle, que é muito necessário realmente. O segundo é uma discussão no Congresso, neste momento, sobre como fazer a regularização fundiária para você ter a responsabilização das pessoas de acordo com o Código Florestal. Depois, o pagamento pelos serviços ambientais. Ou seja, premiar quem tem boas práticas ambientais. Para isso, o governo lançou o projeto Floresta Mais, que é um projeto piloto de R$ 500 milhões que pode se expandir, inclusive com a ajuda dos investidores estrangeiros. O quarto pilar é o zoneamento econômico e biológico, que poderá trazer um planejamento territorial para a Amazônia. E, por fim, trazer investimento privado para colocar de pé a agenda da bioeconomia.

E como faz isso?

O pressuposto é que a floresta preservada tem de valer mais que a floresta devastada.

As empresas e investidores fizeram pesadas críticas à política ambiental. O governo insiste em dizer que é uma questão de geopolítica e protecionismo.

Acho que as coisas se somam. Que há interesses comerciais entre países e mercados, não tem dúvida. Mas se soma a isso uma percepção da sociedade e consumidores sobre o tema ambiental, percepção essa que é justa. E há também um sentimento das empresas, que querem manter sua competitividade no Brasil e no exterior e que querem participar mais das discussões e dilemas ambientais.

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As empresas dizem já sofrer boicotes. Como ajudá-las?

O que podemos fazer é ajudar as empresas a responder esses questionamento e, eventualmente, se precisar de ações concretas, nós faremos. Por isso que é preciso que as empresas estejam próximas ao governo para trazer essas informações e a gente responder.

O sr. reconhece que falhou nessas demandas ambientais?

Acho que preciso melhorar realmente a comunicação e trazer as pessoas para participarem desse debate. O vice-presidente Hamilton Mourão convidou alguns embaixadores estrangeiros para irem à Amazônia quando passar a pandemia. Por outro lado, precisamos ir à Europa e outros países para dar informações e ouvir as críticas. Ou seja, encontrar um caminho comum de soluções completas para a Amazônia.

Então existe uma certa falha neste processo. O sr. está fazendo uma espécie de 'mea culpa'?

A comunicação nossa precisa melhorar. Se a gente puder contar com as empresas brasileiras para ajudar, isso vai ser importante porque têm capilaridade, agilidade, e uma série de diferenciais que tornam mais rápida do que a missão governamental. Isso é verdade.

Como as empresas podem ajudar? Por que só agora o sr. procurou a iniciativa privada?

A ajuda pode se dar de várias formas. Há questões pontuais, que é o programa Adote um Parque para que 132 unidades de conservação da Amazônia possam ser adotadas por empresas privadas nacionais e estrangeiras. Mas do que isso as empresas devem - e o vice-presidente Mourão abriu essa oportunidade - participar desses debates nossos sobre o que fazer para enfrentar os desafios da Amazônia, seja no conselho da Amazônia ou no conselho do fundo da Amazônia.

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Enfrentamos também um racha no agronegócio em relação às questões ambientais. Há uma ala muito radical, alinhada ao governo, que diz que o problema não existe.

Acho que precisa se aproximar todos os lados. Todos precisam ouvir - cada lado tem aí suas ponderações e suas perspectivas. Essa conversa tem de ser feita de maneira transparente e rápida.

A sua fala no dia 22 de abril na reunião ministerial com o Bolsonaro "de passar a boiada" pegou muito mal e gerou muitos protestos. Como o sr. avalia hoje essa fala?

Primeiro, a gente tem de explicar para a sociedade os desafios da burocracia e de ter uma regra. Se você me perguntasse se era uma frase para ser dita ao público desta forma, acho que não. Tem de explicar melhor. É o que tenho feito nesta entrevista. É uma questão de ter mais eficiência, ter mais transparência, diminuir burocracia, que são processos sempre necessários. E explicar isso de forma mais didática.

Há comentários em Brasília de que o sr. não está mais à altura da pasta. Como recebe essas críticas?

Essa escolha é do presidente da República. Ele é que tem fazer isso. Temos de receber as críticas com naturalidade e corrigir se tiver algo a fazer. O governo tem um nível técnico elevado. A gente tem de olhar para a frente e trabalhar em conjunto. O governo tem muita coerência e homogeneidade.

Como o sr. se defende das ações de improbidades administrativas que é acusado?

Eu acho que a ação é improcedente até porque vários temas que são tratados ali reúne muita coisa ao mesmo tempo. Elas já estão sendo discutidas em outros processos e o governo tem demonstrado que há fundamentos para todos os temas.

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