PT busca mudar artigo 142 da Constituição e restringir militares em cargos civis

Partido se mobiliza por PEC que altera dispositivo usado por bolsonaristas para pedir intervenção; proposta também proíbe a participação de membros da ativa em cargos públicos

15 fev 2023 - 21h52
(atualizado às 23h05)
A Constituição do Brasil, promulgada em 1988, não admite movimentos separatistas que buscam transformar estados em novos países. Mas a possibilidade de repartir um estado da federação existe. E já até aconteceu.
A Constituição do Brasil, promulgada em 1988, não admite movimentos separatistas que buscam transformar estados em novos países. Mas a possibilidade de repartir um estado da federação existe. E já até aconteceu.
Foto: reprodução jures.com.br / Flipar

O PT tentará proibir a participação de militares da ativa em cargos públicos e acabar com operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO). Passado o carnaval, deputados do partido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva deflagrarão uma ofensiva com o objetivo de obter 171 assinaturas para apresentar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que reformule o artigo 142. O dispositivo trata do papel das Forças Armadas, mas vem sendo distorcido por bolsonaristas como justificativa para defender uma intervenção militar no País.

Apesar das articulações do PT, o Palácio do Planalto resiste à ideia, sob o argumento de que não é hora de comprar nova briga. O artigo 142 é sempre citado por apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) que não aceitam o resultado das eleições. A leitura da extrema direita é a de que o texto autoriza a atuação das Forças Armadas como poder moderador, se convocadas a realizar uma intervenção. Juristas e ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) rechaçam esse entendimento. A ideia de alterar o artigo para afastar interpretações distorcidas tem apoio do ministro do Supremo Gilmar Mendes.

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A atual redação do artigo 142 estabelece que as Forças Armadas se destinam à "defesa da Pátria, à garantia dos Poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem". Os petistas querem retirar da Constituição justamente o trecho que prevê a garantia da lei e da ordem e, no lugar, determinar que os militares assegurem "a independência e a soberania do País e a integridade do seu território". A proposta estabelece, ainda, que militares devem ir imediatamente para a reserva se aceitarem cargos públicos.

Rebelião

A expressão "lei e ordem" foi encaixada no anteprojeto da Constituinte, em 1987, e a tentativa de apagá-la do texto quase custou uma rebelião militar. À época, o então deputado José Genoino (PT) queria trocar a expressão por "ordem constitucional". Fernando Henrique Cardoso, então líder do PMDB no Senado, conseguiu negociar um meio-termo para que a atuação militar na manutenção da ordem só ocorresse em caso de chamado de um dos Poderes.

Para a cúpula do PT, é preciso usar o momento de consternação após a tentativa de ataque golpista de 8 de janeiro para emplacar a alteração constitucional e conter a politização das Forças Armadas. De autoria dos deputados Carlos Zarattini e Alencar Santana, o texto, batizado de "PEC antigolpe", tem, nos bastidores, aval do deputado Rui Falcão, que vai presidir a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara.

"As Forças Armadas precisam ter claro que o seu papel é o de defesa do território nacional e da soberania, e não o de promover ações de repressão internas", disse Zarattini ao Estadão. "Além disso, incluímos trecho para limitar a participação de militares da ativa em cargos civis. Quem quiser entrar no governo que vá para a reserva."

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O movimento ocorre na sequência de um turbulento início de governo no que diz respeito à relação do Planalto com os militares. Na campanha do ano passado, uma ala do PT pediu que Lula incluísse no programa de governo um capítulo com mudanças no artigo 142. O então candidato barrou a sugestão para não criar atritos com militares.

A desconfiança do governo sobre a atuação das Forças Armadas, no entanto, cresceu depois da invasão do Planalto, do Congresso e do STF. A crise instalada levou Lula a trocar o comando do Exército. Após os ataques, o petista disse que as Forças "não são poder moderador como pensam que são".

Crise

Mesmo assim, no Planalto e no Ministério da Defesa há temor de que PEC possa "contratar" uma nova crise com os militares em um momento no qual a relação está pacificada, mas ainda com cicatrizes provocadas pelos últimos episódios. Existe, ainda, a avaliação de que o tema tende a dividir a base de apoio de Lula, também composta por partidos do Centrão.

O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, afirmou que o assunto não está em debate. "Isso não foi discutido. Quando chegar mais essa polêmica, a gente vê", declarou Padilha.

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Zarattini, por sua vez, disse não esperar o apoio do Planalto. "Não é uma iniciativa do governo, mas fomos estimulados pelas declarações do próprio presidente e do comandante do Exército, general Tomás Miguel (Paiva), contra a politização das Forças Armadas", destacou o deputado, que é vice-líder do governo. "Achamos que esse é o melhor momento para resolver o problema do artigo 142 porque houve uma tentativa de golpe e a extrema direita está mais fraca", completou.

Para o deputado Ivan Valente, do PSOL, sigla que protocolou ação no STF pedindo para declarar inconstitucional o artigo 142, está na hora de mexer na questão dos militares.

Na avaliação do general Roberto Peternelli, ex-deputado, o texto não deve prosperar no Congresso. "Essa PEC é casuística e iria gerar atrito desnecessário com as Forças. Existem outras prioridades no Congresso, como a reforma tributária", disse o general.

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