Um evento da Prefeitura de São Paulo para entrega de obras no Jabaquara, na zona sul da capital, terminou em bate-boca entre o prefeito Ricardo Nunes (MDB) e os moradores da região. O encontro ocorreu nesta quinta-feira, 16, no Centro Educacional Unificado (CEU) Caminho do Mar.
A visita de Nunes ao bairro integra o programa "Prefeitura Presente", no qual o prefeito percorre a cidade para inaugurar obras e conversar com os moradores. A menos de um ano para as eleições municipais de 2024, o programa foi estruturado de maneira a impulsionar a pré-campanha de Nunes à reeleição. O prefeito é o segundo colocado nas pesquisas de intenção de voto, atrás do pré-candidato do PSOL, deputado federal Guilherme Boulos.
O encontro que deveria ser positivo para Nunes, entretanto, foi marcado por gritos e vaias contra a sua gestão. A discussão surgiu devido ao plano da Prefeitura de construir uma Vila Reencontro na região. Essas vilas servem de moradia temporária para famílias em situação de rua, sobretudo aquelas com crianças. Porém, uma parte dos moradores do Jabaquara é contrária ao projeto, pois teme que usuários de drogas da Cracolândia sejam encaminhados ao local.
Um evento da Prefeitura de São Paulo para entrega de obras no Jabaquara, terminou em bate-boca entre o prefeito Ricardo Nunes e moradores da região. Segundo a prefeitura, após o ocorrido, por iniciativa do prefeito, foi agendada a visita de moradores a uma unidade da Vila… pic.twitter.com/iqU4cs8QZN
— Política Estadão (@EstadaoPolitica) November 17, 2023
"Eu, como cristão, não acredito que estou escutando isso. É desumano o que você está fazendo", gritou o prefeito para um morador que é contrário à implementação da Vila Reencontro no bairro. O secretário municipal de Saúde, Luiz Carlos Zamarco, e o de Assistência Social, Carlos Bezerra Jr., também discutiram com parte da plateia durante o evento.
Por meio de nota, a Prefeitura esclareceu que o encontro foi interrompido "pelo protesto de um pequeno grupo que se posicionou contrariado com a instalação de uma unidade do projeto Vila Reencontro". O prefeito "reagiu à interrupção com indignação, ressaltando a importância da Vila Reencontro dirigido a recuperar a autonomia de famílias com crianças em situação de rua", diz o texto.
Após a discussão, Nunes propôs que uma comissão de moradores do Jabaquara fosse visitar uma Vila Reencontro em funcionamento para "eliminar dúvidas e todo tipo de preconceito em relação ao projeto". Para isso, a Prefeitura vai enviar um carro para buscar a comissão e levá-la até uma vila em funcionamento. O prefeito foi aplaudido pela iniciativa.
Em vídeo obtido pelo Estadão, uma moradora do Jabaquara diz que o bairro não é contra a construção da Vila Reencontro, e sim contra as condições habitacionais do projeto da Prefeitura. "Não queremos eles longe da gente, queremos eles perto, mas com qualidade de vida! Não em uma casa de lata", disse em referência às habitações. As casas, entretanto, não são construídas com lata, mas sim com poliisocianurato, um tipo de plástico termoendurecível geralmente fabricado na forma de espuma, sendo empregado como isolamento térmico rígido.
De acordo com informações da Prefeitura, cada residência da Vila Reencontro tem 18 metros quadrados. As unidades são semelhantes a contêineres, com banheiro, quarto e espaço para cozinhar. A ideia é que funcionem como moradias temporárias, por cerca de um ano.
Essas habitações fazem parte do Programa Reencontro, que tem como objetivo fornecer unidades habitacionais prioritariamente para famílias, com ou sem crianças, que tenham utilizado as ruas da cidade como moradia nos últimos três anos.
Nabil Bonduki, professor de Planejamento Urbano da USP, reconhece a importância da iniciativa da Prefeitura em relação à população em situação de rua. Porém, o especialista levanta questionamentos sobre o modelo de habitação temporária adotado pela gestão municipal. Em sua visão, seria mais benéfico se a Prefeitura buscasse alternativas para assegurar habitação permanente para as famílias que se enquadram no Programa Reencontro.
"As experiências pregressas de habitações temporárias no País deram problema. Na década de 1940, o Rio lançou um problema de moradia temporária, mas as pessoas acabaram morando por mais de 20 anos nessas casas. Se a Prefeitura desse um apoio econômico e social, essas famílias [da Vila Reencontro] poderiam ir para uma moradia definitiva", conta o professor.