STF e Forças Armadas abrem diálogo em busca de pacificação

Desgaste do ministro da Defesa fez o Supremo buscar interlocução com Exército; comandantes tentam ficar distantes de radicalização

22 jun 2020 - 05h11
(atualizado às 07h50)

BRASÍLIA - Na manhã de 10 de junho, uma quarta-feira, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), se encontrou com o general Edson Leal Pujol, comandante do Exército, no quarto andar do principal prédio do Setor Militar Urbano. Em plena crise entre o Palácio do Planalto e o Judiciário, Gilmar pretendia medir a temperatura no Quartel General. O encontro evidenciou o afastamento do ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, da interlocução entre os poderes.

Ministro Gilmar Mendes durante entrevista
Ministro Gilmar Mendes durante entrevista
Foto: Adriano Machado / Reuters

Gilmar indicou que o Supremo não tem intenção de interromper o mandato de Bolsonaro. Observou, ainda, que muitas avaliações sobre o comportamento dos magistrados não passam de "teorias conspiratórias". Nas palavras do ministro, a preocupação na Corte é com o "telefone sem fio", uma série de mensagens "dúbias" de Bolsonaro em relação à democracia, e também com a insistência dele em sugerir que as Forças Armadas estariam com o governo numa possível ruptura institucional. Pelo Twitter, o próprio Gilmar afirmou que "Exército não é milícia". Além disso, a ideia de que os militares podem fechar o STF e o Congresso foi classificada pelo magistrado como "incompatível" com a Constituição de 1988.

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Pujol mais ouviu do que falou naquele encontro, conforme apurou o Estadão. Gilmar encontrou ali um general econômico nas palavras, mas que deu a entender a existência de um mal estar nas Forças Armadas com posições de ministros da Corte em relação ao Planalto, possivelmente numa referência a ações de Celso de Mello e Alexandre de Moraes.

A conversa entre o ministro e o general também girou em torno de missões militares de logística e apoio ao combate à pandemia do coronavírus e da Operação Verde Brasil, de repressão ao desmatamento na Amazônia.

O comandante do Exército se mantém calado ao longo da sucessão de crises, voltado às responsabilidades da área. No encontro com Gilmar, sinalizou que não aceita nem mesmo o papel de interlocutor político da caserna ou do governo com o Judiciário, que era do ministro da Defesa. O posto está vago.

O general Fernando Azevedo e Silva, que já foi assessor do atual presidente da Corte, Dias Toffoli, perdeu espaço na interlocução depois de emitir três notas para explicar atos e declarações de Bolsonaro e sobrevoar com ele, num helicóptero, uma manifestação antidemocrática na Esplanada.

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Mesmo com a recusa em ocupar o posto de Azevedo e Silva, Pujol recebe pedidos de encontros. Do lado do governo não faltam convites. Bolsonaro tem insistido em aparecer ao lado dos comandantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica. Foram três reuniões oficiais desde abril, um recorde da Presidência, fora as que não estão previstas na agenda. Na última quarta-feira, por exemplo, Bolsonaro chamou Pujol para assistir à cerimônia de arriamento da bandeira, no Palácio da Alvorada. Com esses gestos, o presidente procura mostrar que as três forças estão ao seu lado. Assim, alimenta um discurso caro aos apoiadores extremistas, insinuando que poderia haver um golpe militar em andamento, mesmo sem uma sinalização direta sobre isso.

Villas Bôas

Quando assumiu a pasta da Defesa, em janeiro de 2019, Azevedo e Silva avisou aos comandantes militares que tinha a prerrogativa de fazer manifestações políticas. Argumentou que estava num posto com essa característica. Diante disso, a exemplo de Pujol, o almirante Ilques Barbosa, da Marinha, e o brigadeiro Antônio Carlos Bermudez, da Aeronáutica, evitam exposições nas mídias sociais e se mantêm quietos, focados nas ações de suas áreas.

Em 2018, às vésperas do julgamento do habeas corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o então comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, afirmou no Twitter que repudiava "a impunidade" e que a força estava "atenta às suas missões institucionais", sem explicar o que pretendia dizer com aquela expressão. Hoje, Villas Bôas, na reserva, tem um "exército" de 780 mil seguidores no aplicativo e seu exemplo de intromissão na política não é seguido pelos atuais comandantes, que só possuem contas institucionais nas redes sociais.

Na esteira de Villas Bôas, porém, muitos militares da ativa criaram perfis pessoais no Twitter e no Facebook. Pujol não aceitou. Em julho do ano passado, o então chefe do Estado Maior do Exército e atual ministro da Casa Civil, general Walter Braga Netto, assinou a portaria 196, que proibiu a militância virtual dos militares da ativa. Braga Netto observou que manifestações políticas não estavam previstas no Estatuto dos Militares e no Regulamento Disciplinar do Exército. A única ressalva era para integrantes do Alto Comando do Exército, que podem ter perfis funcionais, mas possuem recomendações expressas de não usar esse instrumento para qualquer tipo de manifestação política.

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