O decano do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Celso de Mello, atendeu ao pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) e enviou para a primeira instância da Justiça Federal do Distrito Federal o inquérito que apura suposto crime de racismo cometido pelo ex-ministro da Educação Abraham Weintraub.
"A competência da Justiça Federal para prosseguir neste Inquérito justifica-se em razão do que dispõe a cláusula inscrita no art. 109, inciso V, da Constituição Federal, considerada a circunstância de que o Estado brasileiro promulgou a Convenção das Nações Unidas sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial", observou Celso de Mello.
Em parecer enviado ao Supremo, o vice-procurador-geral da República, Humberto Jacques de Medeiros, afirmou que, apesar da apuração de práticas racistas não ser 'monopólio da Justiça Federal', o caso se trata de 'delito praticado por agente público federal em exercício de cargo público de governo, passível de responsabilização também da União'.
"Não bastante, dá causa a reação de Estado estrangeiro por sua representação diplomática no País", afirmou, citando a nota 'categórica' da Embaixada da China no Brasil sobre o caso. A representação chinesa disse que a declaração de Weintraub tinha cunho 'fortemente racista' e teria causado 'influências negativas no desenvolvimento saudável das relações entre os dois países.
O ex-ministro é investigado por racismo após publicar um tuíte em que insinuou que a China vai sair 'fortalecida da crise causada pelo coronavírus, apoiada por seus 'aliados no Brasil'. A publicação usou uma imagem de personagens da Turma da Mônica ambientada na Muralha da China e substituiu a letra "r" pelo "l", para fazer referência ao modo de falar do personagem Cebolinha, o que foi visto como insulto aos chineses.
Em depoimento à PF, ele negou que o teor da publicação tenha sido racista e disse que eram críticas ao governo chinês: 'ditadura comunista que despreza os princípios que regem uma democracia liberal', e não ao povo do País.
Weintraub está nos Estados Unidos após controversa viagem que entrou na mira do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União. subprocurador-geral Lucas Furtado vislumbrou indícios de fraude pelo uso do passaporte diplomático - que deve ser utilizado por ministros apenas em viagens oficiais do cargo.
A entrada de brasileiros em território americano está suspensa por ordens de Washington, permitindo apenas a passagem de autoridades durante a pandemia do novo coronavírus. Weintraub entrou no país ainda como ministro e, após estar em território estrangeiro, foi exonerado da chefia do MEC. Na terça, 23, o Planalto retificou o decreto que demitia o ex-ministro, tornando seu efeito retroativo para o dia 19 de junho - mesma data em que ele embarcou para os EUA.
Segundo o subprocurador Lucas Furtado, o fato do governo ter retificado a data de exoneração de Weintraub, quando ela havia sido publicada depois dele entrar nos Estados Unidos, confirmaria a fraude. "Antes, era ilegal e parecia haver fraude. Agora, confirmou", disse.
O ex-ministro da Educação alegou que deixou o País às pressas por ter medo de ter a prisão decretada. Além do inquérito que apura suposto crime de racismo em uma publicação contra a China, Weintraub é alvo do inquérito que apura 'fake news', ofensas e ameaças contra a Corte. Durante reunião ministerial, ele afirmou que colocaria os 'vagabundos' do STF na cadeia.
A demissão de Weintraub fazia parte de um acordo costurado pelo Planalto para garantir uma trégua com o Supremo.