STF pode retroceder 23 anos caso Lula indique um homem para vaga de Rosa Weber

Em 132 anos de história, o STF teve 171 ministros. Só três são mulheres

4 set 2023 - 20h07
(atualizado às 21h09)
Novo ministro do STF, Cristiano Zanin cumprimenta a presidente da Corte, ministra Rosa Weber, durante cerimônia de posse nesta quinta-feira, 3.
Novo ministro do STF, Cristiano Zanin cumprimenta a presidente da Corte, ministra Rosa Weber, durante cerimônia de posse nesta quinta-feira, 3.
Foto: Nelson Jr./SCO/STF

Se o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) indicar um homem para a vaga que abrirá no fim deste mês de setembro por causa da aposentadoria da ministra Rosa Weber, o Supremo Tribunal Federal (STF) voltará 23 anos no tempo - quando tinha nos seus quadros apenas uma mulher, a ministra Ellen Gracie.

Em 132 anos de história, o STF teve 171 ministros. Só três são mulheres. Ellen Gracie, a primeira, foi indicada em 2000 por Fernando Henrique Cardoso (PSDB) para a vaga deixada por Luiz Octavio Pires e Albuquerque Gallotti. Seis anos depois, Cármen Lúcia assumiu uma cadeira na Corte pela indicação de Lula, ainda em seu primeiro mandato.

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Rosa Weber, que hoje preside o Tribunal, entrou em 2011 para substituir Gracie. Há uma expectativa de que outra mulher seja indicada para assumir a vaga dela, para que a quantidade de ministras não seja reduzida no Supremo.

Nos corredores do Planalto, no entanto, não há sinais de que isso vá acontecer. Como mostrou o Estadão, o presidente tem dito que quer indicar uma pessoa de sua confiança para a vaga, com quem possa "trocar ideias", e não tem em vista o nome de nenhuma mulher.

Como forma de compensar a possível indicação de um homem para a vaga de Rosa Weber, Lula tem prometido mais mulheres em outros tribunais, a exemplo da indicação da advogada criminalista Daniela Teixeira para uma das cadeiras do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Ela já viajou a Portugal na mesma comitiva do presidente e é considerada uma pessoa com bom trânsito no governo petista.

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Custos políticos

A escolha de uma pessoa para o cargo de ministro do Supremo tem poucos requisitos constitucionais: reputação ilibada, notável saber jurídico e pelo menos 35 anos. De acordo com a cientista política Marjorie Marona, professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), esses requisitos legais são atravessados por fatores políticos.

"Nem sempre essas duas demandas - governabilidade e representatividade -, que são igualmente legítimas e que fazem parte da dinâmica política da democracia constitucional, são convergentes", disse a professora, que também é coordenadora do Observatório da Justiça Brasileira.

Para Marona, caso Lula indique um homem para a vaga de Rosa Weber, haverá um custo político pelo conflito que isso causa com o clamor de vários setores por uma mulher. "Já temos uma sub-representatividade de gênero (no STF). Haveria custos políticos que certamente ele não quer encarar."

Minoria no Judiciário

A professora da Universidade Federal do Ceará (UFC), Celestina Sales, enxerga uma mudança no perfil das reivindicações das mulheres nos últimos vinte anos. "No início do século XX, a luta era para expandir direitos, para entrar no mercado de trabalho, por educação. Dos anos 2000 para cá, há uma grande luta das mulheres pelos espaços de poder."

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Para ela, dentre os Três Poderes, o Judiciário é o mais difícil nesse quesito. "Principalmente em um espaço como o STF, que é de muito poder", afirmou Sales, que é pós-doutora em Ciências Sociais pela Universidade de Lisboa.

O anuário Justiça em Números 2023 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), publicado no dia 1º de setembro, mostra que a média total dos órgãos do Judiciário tem 38% de magistradas. Quando se olha para a segunda instância (Tribunais de Justiça, Tribunais Regionais do Trabalho e Tribunais Regionais Federais) esse número cai para 25%. Algumas Cortes não têm mulheres.

As três magistradas do Supremo representam 1,75% de todos os ministros que a Corte já teve.

Reconhecimento de cidadania

"O mundo jurídico foi constituído e instituído a partir de uma noção masculina. O próprio Direito já foi utilizado para tirar as mulheres dos espaços de poder", afirmou Emmanuela Denora, advogada, professora e doutoranda em Direitos Humanos e Democracia pela Universidade Federal do Paraná (UFPR).

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Muitas conquistas legais significativas para as mulheres têm menos de 100 anos: o direito ao voto veio em 1932, a lei do desquite é de 1942 e, só em 1962, com o Estatuto da Mulher Casada, as mulheres adquiriram o direito de vender seus bens sozinhas e abrir uma conta no banco.

Denora explica que o reconhecimento é uma das etapas do processo de inclusão. "Quando a gente fala em inclusão, estamos falando de reconhecimento. Porque, apesar de as pessoas existirem, elas precisam de reconhecimentos de cidadania."

Não basta ser mulher

Sobre a possibilidade de outra mulher entrar no Supremo, a advogada afirma que não basta apenas o gênero. "É necessário que ela (uma futura ministra) tenha uma ocupação comprometida, para que outras mulheres também possam estar lá." Denora afirma que voltar à configuração do STF de 23 anos atrás, quando se tinha apenas uma ministra, é um gesto "anacrônico".

Celestina Sales complementa: "Não queremos qualquer mulher." "Uma mulher ali pode não mudar todo o Supremo, mas faz uma grande diferença no sentido da representação. Existem mulheres com currículo e competência para assumir esse lugar", disse.

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Além dos movimentos que lutam para uma indicação que não reduza o número de ministras na Corte, também há os que pedem uma ministra negra. O último negro a estar no Supremo foi o ministro Joaquim Barbosa, aposentado em 2014.

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