Em um gesto político, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP) permitirá que deputados federais e senadores de São Paulo destinem recursos do governo estadual para os municípios. A concessão é importante principalmente em um ano eleitoral, quando os parlamentares intensificam o uso de emendas para financiar obras e impulsionar candidaturas de aliados em suas bases eleitorais.
Parlamentares federais indicam emendas somente ao Orçamento do governo federal. Historicamente, no entanto, eles conseguem direcionar de maneira informal recursos do orçamento estadual por meio de articulações junto ao governador de turno. A negociação geralmente ocorre caso a caso e somente quem apoia o governo costuma ser contemplado.
A novidade neste ano é que Tarcísio acordou que as emendas de bancada impositivas, atualmente em R$ 316 milhões, sejam divididas igualmente entre o custeio do Hospital das Clínicas e o programa Muralha Paulista, que integra câmeras de monitoramento do Estado e das prefeituras. O valor exato pode variar porque o Orçamento de 2024 ainda não foi sancionado.
Em troca, cada um dos 70 deputados federais e três senadores, inclusive a oposição, indicarão R$ 10 milhões no orçamento paulista, em um total de R$ 730 milhões. O acordo foi publicado no site do governo de São Paulo junto com a lista de indicações de cada parlamentar. Até o ano passado, o endereço disponibilizava apenas as indicações dos deputados estaduais.
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Indicações são semelhantes às emendas Pix
Marina Atoji, diretora de programas da Transparência Brasil, compara as indicações dos deputados no orçamento estadual às chamadas emendas Pix — modalidade revelada pelo Estadão em que o dinheiro é transferido para as contas das prefeituras sem que haja vinculação a uma obra ou programa específico.
"Tem muitas indicações absolutamente genéricas. 'Infraestrutura urbana' pode ser desde asfaltamento até colocar placa ou pintar o meio-fio. Então isso não representa, necessariamente, uma melhoria na qualidade do gasto público", avalia ela.
Atoji não enxerga irregularidade no acordo. Ela critica a destinação de verbas para o programa Muralha Paulista, que considera pouco transparente, ao contrário do acordo entre o governador e os parlamentares. A iniciativa utiliza inteligência artificial para vigilância em massa a partir das câmeras instaladas em todo o território estadual. Em pelo menos uma ocasião, também foram usadas informações relativas à biometria facial dos cidadãos.
"O governador desidrata um programa que comprovadamente tem resultados positivos na segurança pública, que são as câmeras corporais, e incrementa um programa sobre o qual os próprios cidadãos têm muito pouca informação, inclusive sobre a segurança dos dados", afirma a diretora da Transparência Brasil.
A Secretaria de Segurança Pública disse, por meio de nota, que 19 mil infratores foram detidos no ano passado com o auxílio da Muralha Paulista e que 88 armas ilegais haviam sido retiradas de circulação até novembro devido a avisos emitidos pelo sistema.
"As informações das câmeras de todo o território são interligadas às forças de segurança, com monitoramento de rodovias e cidades, além da integração com o sistema Córtex, software de inteligência que reúne várias bases de dados do país com análise de informações a partir do CPF", informou a pasta.
Ainda segundo a secretaria, o programa de câmeras corporais para os policiais está mantido para 2024, assim como os contratos para a manutenção dos equipamentos. Em uma entrevista no início do ano, Tarcísio de Freitas disse que não iria investir na compra de mais câmeras pois considerava que o equipamento não protege o cidadão. O governador afirmou que é necessário direcionar o recurso para outras ações de segurança pública.