Amigo de Michel Temer há 30 anos, o consultor político Gaudêncio Torquato diz acreditar que o presidente consegue sobreviver à iminente votação na Câmara que pode levar ao seu afastamento, mas tem dúvidas se ele resistirá a novas denúncias.
"O grande teste será enfrentado por ocasião da votação da denúncia na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) e no plenário. O governo tende a passar pelo primeiro teste, seja porque ele substituiu alguns dos deputados na comissão, seja porque ainda tem alguma força", afirmou Torquato à BBC Brasil.
"A minha dúvida, e o meu receio, é que nas próximas (denúncias) talvez os deputados já achem mais difícil não aprovar."
A CCJ da Câmara dos Deputados discute nesta semana a primeira denúncia feita pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, contra o presidente. Ele é acusado de corrupção passiva sob suspeita de ter recebido propina do empresário Joesley Batista, da JBS, através do ex-deputado Rodrigo Rocha Loures.
Como a abertura de uma ação penal teria como consequência o afastamento de Temer, é preciso que a Câmara autorize a investigação antes de o assunto ser analisado pelo Supremo Tribunal Federal. Caso ambos autorizem o processo, o peemedebista se tornaria réu e ficaria afastado por até 180 dias para o julgamento.
A expectativa é que Janot apresente mais duas denúncias contra Temer - por obstrução de Justiça e organização criminosa - antes do fim de seu mandato na Procuradoria, em setembro.
Para Torquato, essas eventuais novas ações seriam mais difíceis para o presidente, já que no recesso os deputados voltam a entrar em contato com suas bases, que devem pressionar pela queda de Temer.
Se a votação da primeira denúncia não for feita antes do recesso, que começa na terça, há o risco de Temer cair até mesmo neste primeiro momento, avalia o consultor político.
"Eles voltarão depois de ter tido esse contato, e como o presidente é impopular junto à base, vai haver uma pressão muito forte para que haja alguma mudança."
Torquato, que havia dito que operações da Polícia Federal não iriam derrubar o governo se a economia estivesse bem, diz que reconsiderou sua opinião. "Ficou mais grave para o governo, mesmo com a economia melhorando."
Consultor político durante todo o processo que levou Temer ao Palácio do Planalto, ele diz que não tem conversado com o amigo nos últimos meses. "Não quis incomodá-lo, ele está com muita gente aconselhando. Estou observando à distância."
A cúpula
O grupo informal que o consultor e professor da USP havia montado para aconselhar o presidente - com nomes como o historiador Marco Antonio Villa e o cientista político Rubens Figueiredo - desidratou em dezembro passado.
"Não tinha mais clima. Nessa altura, a crise é tão grande que não dá tempo de dar sugestões", diz Torquato.
E ele não é único amigo que não mais tem estado próximo ao presidente. Outras pessoas de seu círculo pessoal também acabaram afastadas, mas por outros motivos. Rocha Loures e o advogado José Yunes, que chegaram a ser presos recentemente, são exemplo disso.
Já os braços direitos de Temer no Planalto, os ministros Moreira Franco (Secretaria-Geral da Presidência) e Eliseu Padilha (Casa Civil), aceleraram o passo, se encontrando com o maior número de deputados possível nas últimas semanas para garantir uma votação favorável na Câmara.
Boa parte do ministério, no entanto, não estaria assim tão preocupada com uma eventual mudança, de acordo com duas pessoas ligadas ao governo - nomes como Mendonça Filho (Educação) e Fernando Coelho Filho (Minas e Energia) continuariam num eventual governo de Rodrigo Maia (DEM), que assumiria a Presidência interinamente caso Temer seja afastado.
Para alguns partidos da base aliada que ainda mantém ministérios, uma administração Maia seria um desgaste menor - é o caso do PPS, segundo um nome importante do partido.
A legenda ameaçou desembarcar quando o escândalo envolvendo Temer veio à tona. O então ministro da Cultura, Roberto Freire, deixou o cargo, mas Raul Jungmann (Defesa) acabou continuando no posto.
A aprovação da Reforma Trabalhista no Senado, na terça, será apresentada com uma prova de força de Temer - o que teria dado um novo gás aos deputados governistas.
Para Torquato, o governo está muito mais forte do que a imprensa "faz parecer".
"Quando você lê as coisas, vê que a gravidade é aumentada na mídia. A imprensa derrubou o governo há muito tempo, enquanto na realidade ele continua com força", critica ele.
Na semana passada, Torquato disse no Twitter que o clima pessimista de blogueiros o faziam ter vontade de se desligar das redes sociais.
"Seja qual for o desfecho, a crise política não vai terminar, porque o quadro para 2018 é conturbado", conclui.