A aprovação na Câmara dos Deputados da medida provisória 665, que altera regras de acesso ao seguro-desemprego, embora tenha sido um alívio e uma vitória para o governo da presidente Dilma Rousseff, não significa o fim das dificuldades do governo no Congresso, especialmente para as demais votações das medidas de ajuste fiscal, na avaliação de analistas.
Com baixa popularidade e sofrendo com a tensão constante entre os dois maiores partidos da coalizão governista, PT e PMDB, o governo deverá novamente sofrer para aprovar a MP 665 no Senado, a medida provisória 664, que muda regras de acesso a benefícios previdenciários, e o projeto que retira parte da desoneração da folha de pagamento, que ainda serão analisados na Câmara.
"Foi uma vitória muito importante do governo nesse momento de rearticulação, ainda mais se a gente levar em conta que a presidente da República, segundo as pesquisas, está em seu pior momento em termos de aprovação popular", disse à Reuters o cientista político Rubens Figueiredo, do Cepac.
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"Você tem um Congresso aprovando medidas impopulares enviadas por uma presidente impopular. Isso não é pouco", afirmou Figueiredo.
"Cada votação vai demandar um esforço específico (do governo) para essa votação. Eu acho que essa vitória apertada não garante outras vitórias", ressalvou.
O governo editou essas medidas no final do ano passado no âmbito do esforço de reequilibrar as contas públicas. A aprovação das MPs é considerada essencial para o governo cumprir a meta de superávit primário, equivalente a 1,2 por cento do Produto Interno Bruto (PIB).
O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, tem sido presença constante nas reuniões para negociar a aprovação das medidas de ajuste e desempenhou papel importante no convencimento de parlamentares ao apontar as consequências que a rejeição do ajuste teria para a economia.
Ainda assim, a mudança nas regras do seguro-desemprego teve uma tramitação tumultuada na Câmara, marcada pela tensão entre petistas e peemedebistas e deserções na base aliada, o que culminou com a aprovação da medida por uma margem estreita de votos e com o apoio de alguns deputados do DEM, um dos partidos mais ferrenhos na oposição a Dilma.
"A aprovação da 665 demandou um leque de negociações bastante amplo, incluindo com a oposição", disse à Reuters uma fonte com conhecimento dessas reuniões.
Essas negociações incluíram a pressão do PMDB, até mesmo uma pressão pública do vice-presidente Michel Temer, responsável pela articulação política, para que o PT assumisse posição clara a favor do ajuste.
Contaram também, de acordo com essa fonte, com participação do prefeito de Salvador, Antônio Carlos Magalhães Neto (DEM), para ajudar a conseguir apoio de alguns parlamentares do partido oposicionista à medida.
Risco Renan
A intensidade da articulação política do governo terá de continuar alta, para garantir a aprovação das mudanças em benefícios trabalhistas no Senado e a vitória da alteração nos benefícios previdenciários na Câmara.
"Como a gente teve uma vitória (na aprovação da 665), o pessoal está bastante otimista (com a aprovação da 664 na Câmara)", disse a fonte.
Na avaliação do analista da Tendências Rafael Cortez, a aprovação da MP 665 na Câmara pode pavimentar caminho para que a 664 também seja aprovada pelos deputados.
"O governo agora sabe mais calcular a força que tem dentro de cada partido", afirmou Cortez.
Já no Senado, o analista aposta em uma aprovação mais tranquila da 665 do que na Câmara porque, entre outros motivos, o número de parlamentares é menor e o PDT, partido da base aliada que votou em peso contra a MP na Câmara, não deve ter a mesma posição no Senado, na opinião de Cortez.
Ele, no entanto, aponta um risco: o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), que tem feito críticas quase diárias ao ajuste fiscal do governo e não poupou sequer Temer, que também é presidente do PMDB, de críticas públicas.
"Ele pode eventualmente dificultar a entrada na agenda da MP", disse o analista, que apontou o risco de a medida ficar com um prazo apertado para ser aprovada no Congresso. As duas MPs têm de ser aprovadas pelo Congresso até 1º de junho, caso contrário, perdem a validade.
O governo reconhece que a pauta do ajuste fiscal é difícil e, segundo disse a fonte à Reuters, já está elaborando uma nova estratégia para aprovar a MP 665 no Senado.
"Tem que ter um novo tipo de abordagem", disse a fonte. "Ali (no Senado), vai ser um novo campo", acrescentou.
A expectativa de analistas ouvidos pela Reuters é de que as medidas de ajuste sejam aprovadas pelo Congresso, mas sem uma demonstração de força da base aliada.
"Essa votação (da MP 665 na Câmara) mostrou que a base do governo é muito frágil", disse o cientista político Carlos Melo, do Insper.
"Aprova (as medidas do ajuste)? Aprova, mas sempre no sufoco, sempre nas cordas, sempre no côrner", acrescentou.