A ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu liminar que suspende os efeitos de uma portaria editada pelo Ministério do Trabalho que restringiu as regras para a fiscalização de trabalhadores em condições análogas à de um escravo.
Rosa Weber atendeu a um pedido da Rede Sustentabilidade, que sustentou que a norma tinha o "inconfessável propósito" de inviabilizar uma das mais importantes políticas públicas, a de combate ao trabalho escravo.
Numa dura peça, o partido havia apontado em sua petição que a portaria foi uma das "mais abjetas barganhas" da história do país. "Trocou-se a impunidade na escravidão pela impunidade na corrupção", criticou.
A Rede cita o fato de bancada ruralista no Congresso --setor sempre crítico à legislação sobre o tema-- ser numerosa e coesa, tornando-se essencial para o presidente Michel Temer, especialmente no momento em que tramita na Câmara dos Deputados uma segunda denúncia criminal contra ele.
"Assim, certamente não foi por mera coincidência a edição, nesse exato momento, da malsinada Portaria do Ministério do Trabalho nº 1.129/2017, que, se cumprida, praticamente destruirá a política pública brasileira de combate ao trabalho escravo", afirmou o partido.
Na decisão, com data de segunda-feira, Rosa Weber argumentou que a norma restringe "indevidamente" o conceito de redução à condição análoga à de escravo, o que contraria os princípios da Constituição. A ministra também contestou a exigência de ato prévio do ministro do Trabalho para divulgar a chamada "lista suja" do trabalho escravo.
"Vale ressaltar que, a persistir a produção de efeitos do ato normativo atacado, o Estado brasileiro não apenas se expõe à responsabilização jurídica no plano internacional, como pode vir a ser prejudicado nas suas relações econômicas internacionais, inclusive no âmbito do Mercosul, por traduzir, a utilização de mão de obra escrava, forma de concorrência desleal", afirmou a ministra.
A ministra do STF disse ainda que as alterações empreendidas na portaria configuram quadro de "aparente retrocesso" no campo da fiscalização e da sanção administrativa, como técnica de prevenção e promoção da erradicação do trabalho escravo, de modo a dificultar a política pública de combate à prática.
Rosa Weber concedeu liminar para suspender os efeitos da norma até o julgamento do mérito da ação.
O Ministério do Trabalho afirmou, em nota após a decisão da ministra do STF, que caberá à Advocacia-Geral da União (AGU) adotar eventuais medidas jurídicas em relação à decisão. A pasta frisou que vai cumprir integralmente a decisão, apesar de considerá-la uma liminar sem ter ouvido a outra parte.
"Ademais, refira-se que não é a primeira vez que o assunto 'lista suja do trabalho escravo' chega ao exame da Corte Suprema, a qual já suspendeu liminarmente a divulgação da referida listagem no início de 2015, no fluir da Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 5209, tendo a divulgação da lista em referência ficado sobrestada por quase dois anos", disse.
O ministério afirmou, ainda, que reitera seu total compromisso em continuar aprimorando as ações de combate ao trabalho escravo a fim de livrá-los de condição "que avilta a dignidade humana".
"Tanto é assim que, dentro do processo salutar de debate público afeto às democracias, o Ministro do Trabalho já havia decidido por aceitar as sugestões da procuradora-geral da República, dra. Raquel Dodge, no sentido de aprimorar a portaria recentemente editada, com a finalidade de se aliar segurança jurídica ao primado da dignidade da pessoa humana, certamente os dois pilares sobre o qual se edifica o Estado Democrático de Direito brasileiro", destacou.