A ministra Laurita Vaz, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), anulou a decisão que reduziu as penas a que os pilotos americanos Joseph Lepore e Jan Paul Paladino tinham sido condenados pelo acidente com o Boeing 737 da empresa aérea Gol, no qual morreram 154 pessoas, em setembro de 2006. Réus nas ações penais ajuizadas pelo Ministério Público Federal (MPF) em Sinop (MT), Lepore e Paladino foram inicialmente condenados a quatro anos e quatro meses de prisão, em regime semiaberto. Após recorrerem da decisão de primeira instância, eles obtiveram, no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), a redução da pena para três anos, um mês e dez dias em regime semiaberto – sentença contra a qual continuam recorrendo.
Em dezembro de 2013, a ministra reformou o acórdão do TRF1, reduzindo as penas de Lepore e de Paladino para dois anos e quatro meses de detenção, em regime aberto, pelo crime de atentado contra a segurança do transporte aéreo.
Segundo a assessoria do STJ, o MPF recorreu da decisão da ministra, acusando o cartório do TRF1 de separar em dois diferentes processos os recursos apresentados pela defesa dos pilotos e o ajuizado pelo Ministério Público, quando ambos deveriam ser analisados em conjunto, no âmbito do único processo que tramitava no TRF1. Devido ao erro processual, a ministra não teve acesso ao recurso do MPF, com a argumentação contrária dos procuradores, acatando o recurso dos pilotos.
Ao constatar o erro do TRF1, a ministra anulou sua própria decisão, determinou que o equívoco seja reparado e os recursos sejam reunidos para análise conjunta pelo STJ. Com isso, volta a valer a primeira sentença do TRF1, de três anos, um mês e dez dias.
O advogado de Lepore e de Paladino, Theo Dias, foi procurado, mas ainda não se manifestou sobre o caso. Nesta terça-feira, o MPF pediu ao STJ que decrete a prisão preventiva dos norte-americanos e que determine ao Ministério da Justiça que peça aos Estados Unidos a extradição dos pilotos, com base em tratado assinado pelos dois países. Caso os Estados Unidos não aceitem extraditar os dois pilotos, a subprocuradora-geral da República, Lindôra Maria Araujo, sugere que o processo penal seja transferido do Brasil para as cortes americanas.
O acidente
O voo 1907 da Gol, que fazia a rota Manaus-Rio de Janeiro, com escala em Brasília, caiu no norte do Mato Grosso, em 29 de setembro de 2006 e matou os 148 passageiros e seis tripulantes. O acidente ocorreu após uma colisão com um jato executivo Legacy, fabricado pela Embraer, que pousou em segurança numa base aérea no sul do Pará.
Os pilotos do Legacy, os americanos Joseph Lepore e Jan Paul Paladino, são acusados de não terem acionado o Sistema de Alerta de Tráfego e Prevenção de Colisão (TCAS), equipamento responsável pelo contato entre a aeronave e as torres de transmissão. A denúncia do Ministério Público Federal, apresentada em maio de 2007, relata que o transponder do avião da Gol permaneceu ligado durante todo o voo, mas o do Legacy, a partir de um certo momento, foi desligado. O transponder é um aparelho que interage com os radares secundários do controle aéreo e com outros transponders, fornecendo informações sobre a posição e o deslocamento das aeronaves.
A sequência de erros que causou o acidente passou também por uma falha de comunicação entre controladores brasileiros e pilotos do jato, que, sem entender as instruções, teriam posto a aeronave na mesma altitude do voo da Gol, 37 mil pés. Em maio de 2007, os pilotos e quatro controladores de voo foram denunciados pelo Ministério Público Federal por crime de atentado contra a segurança do transporte aéreo nacional. Os americanos foram absolvidos da acusação de negligência em dezembro de 2008, mas, em 2010 a Justiça anulou a absolvição e ordenou o reinício do julgamento.
Em maio de 2011, eles foram condenados pela Justiça de Mato Grosso a quatro anos e quatro meses de prisão em regime semiaberto por expor a perigo aeronave própria ou alheia e pelo ato ter resultado em morte. A pena, no entanto, foi convertida em prestação de serviço comunitário e proibição do exercício da profissão e seria cumprida nos Estados Unidos, onde os pilotos residem.
Em 2008, os controladores de voo Leandro José Santos de Barros e Felipe Santos dos Reis foram absolvidos sumariamente de todas as acusações pela Justiça Federal. Jomarcelo Fernandes dos Santos também foi isentado do crime, em maio de 2011. Na mesma decisão, a Justiça de Mato Grosso condenou Lucivando Tibúrcio de Alencar a prestar serviços comunitários por atentado contra a segurança do transporte aéreo.
Na Justiça Militar, a ação penal militar para apurar a responsabilidade de cinco controladores que trabalhavam no dia do acidente - quatro denunciados pelo MPF e João Batista da Silva - só foi instaurada em junho de 2008. Em outubro de 2010, quatro deles foram absolvidos - apenas Jomarcelo Fernandes dos Santos foi condenado por homicídio culposo. Ele recorreu ao Superior Tribunal Militar (STM), mas o órgão manteve a condenação, em fevereiro de 2012.