"É uma situação bastante estranha. Mesmo com tanto tempo e com tanta divulgação, não tivemos nenhuma resposta", diz o químico João Winck, de 63 anos, sobre o desaparecimento da mãe.
Nesta sexta-feira (21), o mistério sobre Beatriz Winck completa uma década. "São 10 anos sem resposta. Às vezes desanima e dá vontade de desistir [da busca por respostas], porque não houve evolução na investigação", declara João à BBC News Brasil.
Beatriz, que na época tinha 77 anos, sumiu durante uma excursão ao Santuário Nacional de Aparecida, no interior de São Paulo. Segundo os familiares, ela foi vista pela última vez enquanto esperava o marido, o aposentado Delmar Winck, que estava em uma loja do local.
A Polícia Civil de São Paulo investiga o caso, mas até hoje não foi encontrado nenhum indício sobre o paradeiro de Beatriz.
João, o primogênito dos quatro filhos de Beatriz e Delmar, é o principal responsável por buscar notícias da mãe. Desde 2012, ele começou a fazer investigações por conta própria e ações para divulgar o desaparecimento dela.
Atualmente, uma página no Facebook com milhares de seguidores e um site são as principais formas que ele usa para compartilhar o caso e receber possíveis novas informações.
Ao longo dos últimos 10 anos, ele já recebeu inúmeras mensagens sobre o possível paradeiro dela e diversas imagens de idosas que poderiam ser Beatriz. O químico afirma que deu atenção a todas as suspeitas que chegaram e as encaminhou às autoridades policiais. "Mas nunca houve nada que se tratasse realmente dela", lamenta.
O desaparecimento em Aparecida
Beatriz morava em Portão, no interior do Rio Grande do Sul, e viajou a Aparecida (SP) com o marido em uma excursão. Eles, que eram casados havia cerca de 60 anos, costumavam viajar com frequência a diferentes lugares com grupos de idosos. "Os meus pais estavam sempre juntos. A minha mãe não fazia nada sem o meu pai", diz o primogênito do casal.
Pouco antes da viagem a Aparecida, conta João, Beatriz passou por exames que mostraram que ela não enfrentava problemas sérios de memória ou algo que a impedisse de ter a autonomia de participar de excursões com o marido.
No dia em que a aposentada desapareceu, ela e o marido haviam acabado de chegar a Aparecida. Segundo Delmar relatou na época, ele e a esposa decidiram caminhar pelo Santuário, que na data estava lotado de turistas.
Ainda conforme Delmar contou na época, ele pediu que a esposa o esperasse na porta de uma loja de artigos religiosos enquanto ele aguardava em uma fila para pagar pelos itens que havia comprado. "Ele pagou e saiu da loja, mas não encontrou mais a minha mãe", detalha João.
Nos registros de segurança do Santuário, conta João, não havia imagens do momento em que a idosa desapareceu. "Descobrimos que as filmagens ali eram feitas uma em cima da outra. Então nada ficava registrado."
Em nota à BBC News Brasil, o Santuário Nacional de Aparecida afirma que colaborou com com tudo o que foi "solicitado e direcionado" pela polícia em relação ao desaparecimento de Beatriz.
O Santuário afirma, ainda em nota, que "possui estrutura e protocolos que são acionados quando as pessoas se desencontram de seus familiares, sendo efetivo o reencontro ainda no mesmo dia."
Desde o desaparecimento da idosa, os familiares já tentaram diversas formas de encontrar respostas sobre o que aconteceu com Beatriz: distribuíram milhares de panfletos na região de Aparecida, tiveram o apoio de diversos voluntários que se mobilizaram na cidade para procurar Beatriz e divulgaram o caso intensamente por meio da imprensa.
A aposentadoria dela, segundo a família, logo foi bloqueada para evitar que o dinheiro pudesse ser usado por outras pessoas, caso ela tivesse sido vítima de algum tipo de crime. A polícia também começou a fazer buscas por Beatriz.
João não descarta que a mãe possa ter ficado desorientada, tenha tido algum problema de saúde ou até tenha sido vítima de um crime. Mas ele frisa que nunca soube de nenhum caso de idosa desmemoriada, perdida ou internada em um hospital que pudesse ser associado a Beatriz.
"Acho muito estranho o desaparecimento dela. A gente fez de tudo, divulgou de todas as formas possíveis e nunca surgiu uma informação concreta, absolutamente nada. Alguém poderia ter visto ela, mas até hoje não temos nada concreto ou qualquer indício. Isso me deixa com a pulga atrás da orelha."
Uma década sem resposta
O primogênito de Beatriz estima que recebeu, ao longo dos anos, cerca de 200 fotos de idosas que as pessoas suspeitavam que poderia ser aposentada. Naquelas em que realmente havia alguma característica semelhante à mãe, ele dava mais atenção.
O químico diz ter viajado a dezenas de cidades brasileiras em busca de asilos, hospitais ou qualquer possível pista da mãe, além de ter entrado em contato com autoridades locais em diversas cidades.
Nos últimos anos, diz João, as mensagens com possíveis pistas de Beatriz diminuíram cada vez mais. "Agora são cerca de duas ou três por mês", estima.
Desde o desaparecimento, ele costuma se apegar a qualquer tipo de informação que possa indicar o paradeiro dela.
"Ontem recebi uma mensagem de uma menina que disse que viu uma reportagem sobre a minha mãe. Ela disse que tem um pouco de mediunidade e que acredita que minha mãe pode estar em uma determinada cidade", conta João.
"Eu me apego a tudo, a qualquer possibilidade. Ela me mandou mensagem ontem e já pesquisei a cidade e mandei e-mail para a Prefeitura", detalha ele, que conta que ainda não recebeu uma resposta.
João diz que mantém a esperança de descobrir o que aconteceu com Beatriz. "Tenho certeza de que vou encontrar a minha mãe e continuo na busca. O meu sentimento diz que vou encontrá-la viva, mas tenho que estar consciente de que talvez não seja possível. Hoje ela teria 87 anos e a família dela é muito longeva, sempre viveram quase 100 anos. Mas estou consciente de que ela não é mais uma pessoa jovem", diz.
Para João, esclarecer o desaparecimento da mãe é também uma forma de dar uma resposta ao pai dele. "O meu pai completa 92 anos daqui a duas semanas e está acamado após alguns AVCs (Acidente Vascular Cerebral) nos últimos cinco anos. Ele não consegue ficar em pé sem um apoio, mas está lúcido e tem consciência do desaparecimento da minha mãe. Ele me pergunta às vezes sobre isso e eu digo para ele que isso é responsabilidade minha."
"É um assunto que a gente não toca mais com ele, porque ele começa a chorar quando fala disso", acrescenta.
Em nota à BBC News Brasil, a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo afirma que continua apurando o desaparecimento de Beatriz por meio da Delegacia de Polícia de Investigações sobre Pessoas Desaparecidas.
Segundo a pasta, ainda são feitas buscas para tentar localizar a aposentada. "Qualquer informação que possa contribuir com o trabalho policial pode ser fornecida via Disque Denúncia (181)", orienta a secretaria.
- Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/brasil-63323583