É enganoso que o STJ tenha decidido que arma de fogo é 'instrumento de trabalho' de traficantes

POSTAGENS DISTORCEM DECISÃO DA CORTE QUE DECIDIU QUE O USO DE ARMAMENTO AGRAVA SENTENÇA CRIMINAL SEM GERAR UMA NOVA CONDENAÇÃO

11 dez 2024 - 12h26

O que estão compartilhando: que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou que o uso de arma de fogo em tráfico de drogas não gera crime por posse ilegal porque é um "instrumento de trabalho" do traficante.

O Estadão Verifica checou e concluiu que: é enganoso. O STJ decidiu, em 27 de novembro, que o uso de arma de fogo para o tráfico de drogas agrava a pena aplicada ao crime, mas não gera uma nova condenação específica (leia a decisão aqui). A tese que orienta tribunais do País definiu que a arma é um meio para a execução do tráfico e será punida dentro de um único delito. Não há na decisão nenhuma menção de que o armamento seria um "instrumento de trabalho" do traficante.

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Saiba mais: a alegação enganosa foi compartilhada nas redes depois que a terceira seção do STJ entendeu, em 27 de novembro, que o uso da arma de fogo para a prática do tráfico de drogas leva a um aumento da pena ao réu, e não a uma condenação específica por porte ou posse ilegal. O ministro Reynaldo Soares da Fonseca, relator do caso, ressaltou que a arma de fogo é um meio para viabilizar ou facilitar a prática do tráfico. "A conduta referente à arma de fogo é absolvida pela prática de outro delito, evitando, assim, a duplicidade de punição", diz a tese. A decisão visa evitar a sobrecarga penal de crimes que estão conectados.

De acordo com Cássio Barreto, criminalista do escritório Paschoini Advogados, se a arma de fogo estiver relacionada a execução do crime, como para a proteção de atividades ilícitas ou intimidação de terceiros, configura um instrumento para a prática de delitos mais severos e, portanto, servirá como majorante (aumento) da pena. "Por outro lado, caso a posse ou porte de arma de fogo não guarde correlação, ou seja, não for utilizada como instrumento do crime, mantem-se ambos delitos em concurso material", explica.

Henrique Sobreira Barbugiani Attuch, criminalista do escritório Wilton Gomes Advogados, esclarece que o entendimento firmado pelo STJ se orienta pelo princípio da consunção do direito. "Trata-se de uma construção racional que orienta juízes no momento em que efetivamente vão aplicar a lei, a fim de evitar uma dupla punição pelo mesmo fato", explica. "Alguns crimes são praticados visando a realização de outros, daí que estes são diferenciados entre 'crimes-meio' e 'crimes-fim'".

Attuch ressalta que no processo de sanção, pune-se o todo e não etapas isoladamente. "Isso motivou a Justiça a entender que, em alguns casos, não é necessário punir tanto a posse ilegal de arma de fogo e, concomitantemente, o tráfico de drogas". O art. 40, inciso IV, da Lei de Drogas (nº 13.343/2006) já prevê que o total da pena por tráfico, de cinco a 15 anos de prisão, pode ser aumentado de um sexto a dois terços se tiver sido praticado com emprego de arma de fogo.

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Os processos sobre o tema foram aprovados por unanimidade no STJ e o entendimento já era adotado por tribunais, segundo a relatoria. "A jurisprudência do STJ vem caminhando no sentido da aplicação desse princípio da consunção em diversos casos", avaliou Barreto. A tese fixada pelo tribunal também só deve ser adotada com a análise individual dos casos, de acordo com as circunstâncias.

Uma das postagens mais virais foi feita pelo senador Cleitinho Azevedo (Republicanos-MG). A reportagem procurou pela assessoria do parlamentar, mas não teve resposta. Outras agências de checagem, como Aos Fatos e Agência Lupa, também checaram conteúdos semelhantes.

Como lidar com posts do tipo: é comum que decisões judiciais com impactos na segurança pública sejam retiradas de contexto ou distorcidas nas redes sociais. Neste caso, seria necessário procurar pela repercussão do caso na imprensa profissional ou pela tese no site de processos do STJ a fim de checar se as informações são verdadeiras. O Verifica também consultou especialistas a fim de entender detalhes sobre a discussão.

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