O que estão compartilhando: vídeo em que uma mulher sugere que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva teria "inventado" a queda e o ferimento na cabeça para não ir ao encontro do Brics, organizado entre os dias 22 e 24 de outubro, na Rússia. Segundo ela, não existiriam imagens do ferimento do presidente. O motivo para que ele inventasse o acidente doméstico, segundo a autora do conteúdo, seria porque a identificação dos líderes do Brics ocorreria por reconhecimento da íris.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é falso. Há sim imagens do ferimento na cabeça de Lula após ele cair no Palácio do Alvorada, em 19 de outubro, e ser levado ao Hospital Sírio-Libanês, em Brasília. Uma foto publicada pelo Estadão no dia 25 mostra os pontos de sutura na nuca do presidente (veja mais abaixo). A reportagem não localizou qualquer notícia informando que os participantes do encontro do Brics tiveram que passar por reconhecimento de íris para estarem na cúpula. O conteúdo alimenta a teoria da conspiração que diz que Lula teria morrido e sido substituído por um sósia. O Verifica já desmentiu outros conteúdos dessa natureza (1, 2, 3, 4 e 5).
Especialistas recomendaram atividade logo após artroplastia do quadril
A autora da gravação faz uma série de alegações falsas envolvendo a saúde do presidente Lula e a realização da cúpula do Brics na Rússia. Ela afirma, por exemplo, ser estranho que o presidente, com quase 80 anos, tenha se recuperado de uma cirurgia de prótese de quadril em menos de 40 dias. "Em menos de um mês ele já subia e descia escada e fazia pequenas corridinhas para se exercitar", afirma, como exemplo do que considera anormal em relação ao presidente.
Lula foi submetido a uma operação no quadril em 29 de setembro do ano passado por conta de uma artrose. O presidente foi operado no Hospital Sírio Libanês em Brasília e colocou uma prótese substituindo partes desgastadas do fêmur direito, chamada artroplastia total de quadril. Dois dias depois, em 1º de outubro, ele recebeu alta.
A artroplastia total de quadril, à qual Lula foi submetido, tem índices altos de satisfação e baixa taxa de complicações. Médicos ouvidos pelo Estadão informaram que há casos em que a alta ocorre já no dia seguinte, sendo que, em média, o paciente fica três dias internado.
Eles acrescentaram que, para evitar complicações, o ideal é que o paciente volte logo a caminhar e alguns já começam a fisioterapia no mesmo dia da operação, mas é mais frequente que os primeiros passos, com suporte de muleta ou andador, aconteçam no dia seguinte. O boletim médico divulgado pelo Sírio-Libanês um dia após o procedimento informava que Lula estava estável, que havia caminhado pela manhã e realizado sessões de fisioterapia.
À época da cirurgia de Lula, os especialistas que o acompanharam informaram que ele teria que usar andador por algumas semanas por causa do equilíbrio. O presidente chegou a dizer que não apareceria com o equipamento ou de muleta para que sempre fosse visto "bonito", frase que foi criticada por pessoas com deficiência.
Depois da operação, o presidente se recuperou completamente, apenas fazendo o repouso e a fisioterapia receitada. Em setembro deste ano, ele fez um exame de raio-x para monitorar a cirurgia.
Lula não tem 'sósia com 10 dedos'; postagem usa vídeo invertido para espalhar teoria conspiratória
Não, médicos que operaram Lula não foram executados após cirurgia
Há imagens do ferimento na cabeça de Lula, ao contrário do que diz o post
A autora do conteúdo afirma, ainda, ser surpreendente Lula ter caído às vésperas da reunião do Brics, batido a nuca, ter levado pontos e, segundo seu médico particular, ter sofrido um pequeno sangramento no cérebro. "Se ele levou cinco pontos na nuca, onde está o curativo? Porque ele já apareceu diante das TVs, em vídeos, em fotos e não há curativo na nuca dele", diz.
Em 25 de outubro, o Estadão publicou uma imagem que mostra os pontos de sutura na nuca do presidente e que foi registrada durante reunião de assinatura do novo acordo para a reparação de danos causados pela tragédia de Mariana, em Minas Gerais. Foi a primeira aparição pública do presidente após o acidente doméstico.
Lula caiu no banheiro enquanto cortava a unha do pé e foi levado à unidade do hospital Sírio-Libanês, em Brasília. Ele foi suturado e, após o atendimento médico, foi liberado para retornar ao Alvorada.
O acidente resultou em uma pequena hemorragia cerebral e, por recomendação médica, Lula não viajou para a cúpula do Brics. O ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, chefiou a delegação brasileira no encontro.
Em 22 de outubro, outra avaliação médica foi feita e o presidente foi considerado apto a trabalhar. No dia seguinte, 23, ele participou da Cúpula do Brics, a partir de Brasília, por videoconferência. Nesta segunda-feira, 28, Lula tirou os pontos de sutura.
A viagem à Rússia não foi a única cancelada após o acidente. Lula não foi para São Paulo, na véspera do segundo turno das eleições; para a Colômbia, para a COP da Biodiversidade; e para o Azerbaijão, onde participaria da COP-29, a conferência do clima da ONU.
Vídeo faz afirmações falsas sobre segurança da Cúpula do Brics
A responsável pela gravação diz, por fim, que só quem entrava no local de reunião do Brics eram os "number one" (número um) de cada país e que, como fator de segurança, foi usado reconhecimento de íris dos líderes. "Era preciso aparecer diante de uma máquina para que a inteligência artificial fizesse a leitura da íris dos olhos para dizer se realmente o cidadão era o cidadão. Aí veio bem a calhar essa queda, né? O cidadão não comparece à reunião e aparece uma vídeochamada. Nada além de muito estranho", afirma.
O Verifica não encontrou qualquer notícia que confirmasse que ocorreu reconhecimento por íris dos participantes da cúpula. A reportagem questionou a organização do evento deste ano sobre esse tema, mas não houve resposta. O Itamaraty também foi procurado, mas recomendou que a reportagem buscasse a presidência do Brics.
De qualquer forma, não é verdade que apenas os líderes máximos das nações presentes estiveram nas reuniões. Fotos para as quais posam apenas chefes das delegações participantes mostram nove pessoas: o presidente da Rússia, Vladimir Putin; o primeiro-ministro da Etiópia, Abiy Ahmed; o presidente do Egito, Abdel Fattah al-Sisi; o presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa; o presidente da China, Xi Jinping; o primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi; o presidente dos Emirados Árabes Unidos, Sheikh Mohammed bin Zayed Al Nahyan; o presidente do Irã, Masoud Pezeshkian; e o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Mauro Vieira, que representou Lula no evento. Já as imagens de reunião entre os líderes mostram que diversas outras pessoas estavam na sala. Um exemplo é essa foto registrada durante uma reunião ampliada dos líderes.