Transposição não está 'seca' na Paraíba; moradores protestaram contra agência estadual de águas

DUAS MANIFESTAÇÕES REGISTRADAS EM JANEIRO COBRARAM DA CAGEPA MELHORIAS NO ABASTECIMENTO EM LOCALIDADES ATENDIDAS EM ESQUEMA DE RODÍZIO

22 jan 2025 - 16h27

O que estão compartilhando: vídeo em que um homem afirma que o povo paraibano está fechando rodovias em protestos contra o governo Lula por falta de água. Ele diz, ainda, que o "canal do São Francisco" está seco.

O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é enganoso. Alguns protestos por falta de água foram registrados em rodovias da Paraíba neste mês, mas as manifestações não foram direcionadas ao governo federal, e sim contra a Companhia de Água e Esgotos da Paraíba (Cagepa). O órgão informou que não há interferência do governo federal nos casos reclamados.

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A Agência Executiva de Gestão das Águas do Estado da Paraíba (Aesa) garantiu que não há falta de água na Paraíba por questões ligadas à Transposição do Rio São Francisco. "A transposição está operando normalmente e garantindo segurança hídrica ao Estado".

O mesmo foi comunicado pelo Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional, responsável pela Transposição. Segundo o órgão, atualmente, a infraestrutura fornece água para Paraíba no eixo norte, com cerca de 2.500 litros por segundo, a partir da barragem Caiçara, e no eixo leste, com vazão média de 3.000 litros por segundo. Há "quantidade de água suficiente para atendimento aos Estados da Paraíba, Pernambuco e Ceará", segundo a pasta.

O autor do vídeo foi procurado, mas não respondeu.

Leitores solicitaram checagem deste conteúdo por meio do WhatsApp do Estadão Verifica, pelo número (11) 97683-7490.

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Saiba mais: ao longo do conteúdo, o homem que aparece nas imagens afirma que vídeos que circulam em redes sociais demonstram que o povo paraibano está sofrendo com falta de água e fazendo protestos em rodovias. Contudo, ele não mostra os vídeos citados.

O homem acrescenta que a polícia chegou nestas manifestações dando tiro de borracha e soltando bombas e gás de pimenta, colocando a população para correr, incluindo crianças. "Gente com balde de água, com balde seco correndo nas costas, com um litro, com um galão, e o couro e a borracha comendo porque o povo tava em busca de água", declara.

Além disso, o autor da gravação questiona "cadê as águas do São Francisco", afirmando que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) levou a água do rio para jorrar por todo o Nordeste, incluindo a Paraíba, e que atualmente o canal do São Francisco está sem água.

Sobre o vídeo foi acrescentada uma legenda que diz: "povo brasileiro continua sofrendo com o descaso do governo Lula".

Vídeo de protesto no Nordeste é antigo e não tem relação com a Transposição do São Francisco

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Vídeo mostra canaleta de drenagem, não canal da Transposição sem água na Paraíba

Protestos tiveram como alvo a companhia de água do Estado

A reportagem pediu ao autor da postagem no TikTok que indicasse os vídeos que ele cita, mas não houve resposta. Uma busca nas redes sociais e por notícias neste sentido levou a imagens gravadas na região rural de Campina Grande, onde protestos foram registrados ao longo de janeiro por moradores que estavam sem receber água nas torneiras. Ocorre que as manifestações não eram direcionadas ao governo federal, mas sim à Cagepa.

A TV Paraíba (1, 2 e 3) noticiou um desses protestos, que fechou a rodovia estadual PB-100, no distrito de Galante, em 6 de janeiro. Na ocasião, moradores apontaram a Cagepa como responsável pela falta de água, que já durava dias. Conforme as reportagens, manifestações semelhantes vinham ocorrendo em várias localidades da zona rural do agreste da Paraíba.

Em entrevista ao canal, o morador Fabiano Teixeira de Andrade informou que o protesto teve o objetivo de atrair um representante da companhia à comunidade. "A gente tá querendo que a Cagepa venha se pronunciar à população sobre a falta de água".

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Reclamando que os cidadãos pagam pela água, mas não a recebem, em entrevista ao mesmo veículo, o morador Djaci Serafim também cobrou ação dos responsáveis pelo serviço: "a Cagepa tem que explicar para a população de Galante o que está acontecendo".

A TV Correio (1 e 2) noticiou um protesto semelhante, mas na rodovia PB-177, no município de Pedra Lavrada, em 8 de janeiro. Ao canal de televisão, o vice-prefeito, Gilvan Porto, informou que o abastecimento da cidade estava precário e que o atendimento regional da Cagepa deixava a desejar, o que causou revolta na comunidade. Ele declarou, ainda, que durante a manifestação a Cagepa se comprometeu a solucionar o abastecimento em 15 dias.

A reportagem tentou conversar com as associações de moradores das duas localidades, mas não conseguiu localizar os representantes.

Procurada pelo Estadão Verifica, a Cagepa confirmou terem sido registrados dois protestos considerados pacíficos, em Galante e no município de Pedra Lavrada, e afirmou que as manifestações foram encerradas depois que integrantes da companhia chegaram para iniciar um diálogo. O órgão negou que tenha havido confronto entre policiais e manifestantes, como alega o autor do vídeo. O Verifica também não localizou qualquer notícia nesse sentido.

Sobre a falta de água, a Cagepa informou que, no distrito de Galante, parte da zona rural é abastecida em sistema de rodízio, e justificou que o aumento da temperatura, juntamente com o período de férias, causou uma elevação considerada no consumo, o que tem ocasionado o prolongamento das interrupções temporárias. Conforme o órgão, o trabalho dos técnicos da Cagepa tem diminuído as intermitências, garantindo que o rodízio venha funcionando dentro de um cronograma preestabelecido que é de conhecimento da população.

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Em relação a Pedra Lavrada, cidade também abastecida em sistema de rodízio, o órgão explica que os moradores são contemplados em dias alternados e que houve prolongamento das intermitências por conta do aumento de consumo. A Cagepa diz que a situação da cidade está "bem próxima de ser resolvida em definitivo", com a conclusão, prevista para fevereiro, do trecho da adutora TransParaíba. A infraestrutura transportará água do açude Epitácio Pessoa, em Boqueirão, até o município.

Transposição está funcionando normalmente na Paraíba

A alegação de que o "canal do São Francisco" está sem água também não é verdadeira. De acordo com a Aesa, a água entra no eixo leste da transposição e chega à Paraíba, onde o fluxo está normal, com uma vazão atual de 2,21 m³/s, conforme o monitoramento realizado pela agência.

Segundo o órgão, a região de Campina Grande não enfrenta problemas de abastecimento e está com segurança hídrica. Algumas áreas específicas da zona rural, especialmente em regiões como Sertão, Alto Sertão, Cariri e Curimataú, podem enfrentar estiagem, mas isso não tem relação com a transposição. "É importante destacar que estamos iniciando o período chuvoso nas regiões mais carentes de água", diz a nota enviada à redação.

Por fim, a alegação feita no vídeo de que Bolsonaro foi quem levou as águas do São Francisco já foi desmentida anteriormente pelo Estadão Verifica. O Eixo Leste da transposição entrou em pré-operação em março de 2017, quando foi inaugurado pelo ex-presidente Michel Temer (MDB). As águas chegaram ao açude Epitácio Pessoa, localizado no município de Boqueirão, depois de 41 dias, em 18 de abril daquele ano. Esse reservatório é justamente o que abastece a região de Campina Grande.

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