Congresso reage à demissão de Mandetta e teme piora na pandemia

Parlamentares cobraram do novo ministro, o médico oncologista Nelson Teich, a adoção de uma agenda técnica; Governadores lamentam mudança na pasta

16 abr 2020 - 18h38
(atualizado às 20h05)

SÃO PAULO E BRASÍLIA - O Congresso reagiu à troca no Ministério da Saúde com críticas ao presidente Jair Bolsonaro e elogios a Luiz Henrique Mandetta. A demissão fez os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), divulgarem pela primeira vez uma nota conjunta. As cúpulas das duas Casas relataram temor de que a saída de Mandetta prejudique o combate ao novo coronavírus no País.

Além disso, parlamentares cobraram do novo ministro, Nelson Teich, a adoção de uma agenda científica. "O trabalho responsável e dedicado do ministro foi irreparável. A sua saída, para o País como um todo, nesse grave momento, certamente não é positiva e será sentida por todos nós", afirmaram Maia e Alcolumbre. Os dois fazem parte do mesmo partido do ex-ministro.

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O presidente da Câmara, Rodrigo Maia
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil / Estadão

A demissão ocorreu após os presidentes da Câmara e do Senado ficarem ao lado de Mandetta na orientação sobre isolamento social, tema de disputa entre o ex-ministro e Bolsonaro. "A maioria das brasileiras e dos brasileiros espera que o presidente Jair Bolsonaro não tenha demitido Mandetta com o intuito de insistir numa postura que prejudica a necessidade do distanciamento social e estimula um falso conflito entre saúde e economia", diz a nota.

No documento, os parlamentares manifestam expectativa de que o novo titular da pasta dê continuidade ao bom trabalho que vinha sendo desempenhado pelo Ministério da Saúde. Os dois fizeram apelo por um trabalho com base na ciência. "A vida e a saúde dos brasileiros devem ser sempre nossa maior prioridade."

No Congresso, há temor de que a troca na equipe cause uma confusão no combate à pandemia. "Eu só lamento que, no momento de grave crise no Brasil e no mundo, essa substituição eventualmente cause um pouco de distúrbio no conjunto de atos que estão sendo tomados", afirmou o vice-presidente do Senado, Antonio Anastasia (PSD-MG), desejando em seguida sucesso ao substituto.

Nos últimos dias, Mandetta desabafou com o senador e primo Nelsinho Trad (PSD-MS), relatando cansaço e pressão no cargo e vendo sua demissão como certa. Trad tentou reverter a situação e apelou para um acerto com o presidente Jair Bolsonaro, o que não ocorreu. "O Mandetta acertou mais do que errou. Qualquer professor passaria ele de ano. Não vai faltar para ele convite", disse o senador.

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O presidente do DEM, partido de Mandetta, ACM Neto, emitiu nota para defender o posicionamento do ex-ministro durante a crise, em linha com a Organização Mundial da Saúde (OMS). "Não temos dúvidas que o ex-ministro Mandetta ainda contribuirá muito para a vida pública nacional", diz a nota. ACM ainda mandou um recado para Nelson Teich, esperando "que o novo ministro possa pautar as suas decisões em critérios técnicos e científicos" para evitar um crescimento desenfreado do vírus.

Na oposição, parlamentares fizeram críticas a Bolsonaro, mas também ironizaram o histórico do ex-ministro. "A demissão de Mandetta não passa de um acerto de contas por parte de um chefe que, no auge de sua mediocridade, não tolera um auxiliar se destacando mais do que ele", disse o líder do PSB na Câmara, Alessandro Molon.

Nas redes sociais, o deputado Jorge Solla (PT-BA) publicou uma mensagem do ex-ministro quando era deputado federal e votou pelo impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, em 2016. "És responsável por tudo que cativar", escreveu o parlamentar petista. O líder do PSL no Senado, Major Olimpio (SP), afirmou que, se o novo ministro Nelson Teich persistir na defesa do isolamento para todas as pessoas "não vai durar 30 dias no cargo ou terá que rasgar o seu diploma."

Governadores lamentam saída de Mandetta

A saída de Luiz Henrique Mandetta foi lamentada por governadores. Chefes dos Executivos estaduais que defendem medidas de isolamento social, ao contrário do que prega o presidente Jair Bolsonaro, cobraram que Nelson Teich siga as orientações da Organização Mundial de Saúde (OMS) no combate à pandemia.

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O paulista João Doria (PSDB) disse que a demissão de Mandetta foi uma "perda para o Brasil". "Espero que (Teich) siga procedimentos técnicos e atenda às recomendações da OMS." O tucano Eduardo Leite, do Rio Grande do Sul, lembrou a "competência e dedicação exemplar" do antigo ministro. Para Ronaldo Caiado (MDB), de Goiás, Mandetta cumpriu sua missão, apesar de todas as "limitações" da pasta.

Em São Paulo, embora as declarações oficiais sejam de lamento, a avaliação dos gestores da saúde de Estado é a de que há pouco que o governo Bolsonaro possa fazer para alterar, ou até atrapalhar, a forma como a pandemia vem sendo combatida com troca de ministros.

O entendimento é que os recursos financeiros da União de que o Estado de São Paulo precisava para enfrentar a doença já foram transferidos, e a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que reafirmou a autonomia para estados e municípios definirem as polícias de Saúde já serve como barreira para eventuais ataques à política de isolamento, pivô dos atritos entre Mandetta e Bolsonaro.

O secretário de Estado da Saúde de São Paulo, José Henrique Germann, também lamentou ontem a saída de Mandetta. Questionado sobre a troca no ministério e a indicação de Teich, respondeu ao Estado: "Não o conheço". Na sequência, Germann completou: "E olha que estou aqui (na Saúde) há 30 anos".

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