O Instituto Nacional de Doenças Transmissíveis da África do Sul (NICD, na sigla em inglês), comunicou, nesta quinta-feira (25), a descoberta de uma nova variante do coronavírus. Essa cepa, segundo os cientistas, tem uma "constelação incomum" de mutações e há preocupação sobre o risco de escape da proteção da vacina. Ainda não há, porém, comprovação científica sobre essa possibilidade.
Chamada de B.1.1.529, a nova variante é responsável por 22 casos de covid-19 no país até o momento. Adrian Puren, diretor executivo da NICD, afirmou, em comunicado à imprensa, que embora os dados até o momento sejam limitados, os especialistas do Instituto estão trabalhando para estabelecer mecanismos de vigilância para entender a nova variante e suas implicações. "Os desenvolvimentos estão acontecendo de forma rápida e o público tem nossa garantia de que manteremos todos avisados".
Os casos detectados e a porcentagem de testes positivados estão aumentando rapidamente nas províncias de Gauteng, a mais populosa do país, North West e Limpopo. Michelle Groome, chefe da divisão de vigilância e resposta em saúde pública do NICD, disse que as autoridades de saúde provinciais continuam em alerta máximo e estão priorizando o sequenciamento de amostras positivas para covid-19. Autoridades, porém, afirmaram que ainda é cedo para dizer se serão impostas novas restrições.
O pesquisador brasileiro Tulio de Oliveira, diretor do Centro para Resposta à Epidemias e Inovação da África do Sul (CERI), disse, que a variante é de grande preocupação e que o mundo deveria fornecer apoio à África do Sul e à África e não discriminar ou isolar o continente. "Ao protegê-lo e apoiá-lo, protegeremos o mundo. Faço um apelo para bilionários e instituições financeiras. Temos sido muito transparentes com as informações científicas. Identificamos, tornamos os dados públicos e alertamos, pois as infecções estão aumentando. Fizemos isso para proteger nosso país e o mundo, apesar de sofrermos potencialmente uma discriminação massiva."
Oliveira disse ainda que a nova variante é preocupante no nível mutacional. "A África do Sul e a África precisarão de apoio (financeiro, de saúde pública, científico) para controlá-la para que não se espalhe pelo mundo. Nossa população pobre e carente não pode ficar presa sem apoio financeiro."
Segundo o pesquisador, como essa variante pode ser detectada por um PCR normal, antes do genoma completo de sequenciamento, o que torna mais fácil para rastrear e entender a transmissibilidade da nova cepa. "Estimamos que 90% dos casos em Gauteng, pelo menos 1000 por dia, são desta variante", disse.
Oliveira, que faz parte da força-tarefa para sequenciamento do vírus, afirmou ao Estadão que, embora poucos casos tenham sido identificados, provavelmente há "milhares". O pesquisador disse que, apenas na quarta-feira (24), o CERI recebeu mais de mil amostras para a análise e que a equipe está "trabalhando contra o relógio" para entender os efeitos de transmissibilidade, vacinas, reinfecção, gravidade da doença e diagnósticos.
Segundo a Rede para Vigilância Genômica da África do Sul, a variante já foi identificada em amostras coletadas de 12 a 20 de novembro em Gauteng, Botswana e em Hong Kong, de um viajante sul-africano. "Os primeiros sinais de laboratórios de diagnóstico mostram que a B.1.1.529 aumentou rapidamente em Gauteng e pode já estar presente na maioria das províncias. Podemos fazer algumas previsões sobre o impacto das mutações nesta variante, mas ainda é incerto, e as vacinas continuam a ser a ferramenta crítica para nos proteger", disse a instituição. Nesta sexta-feira, o governo sul-africano fará uma sessão de urgência com a OMS (Organização Mundial da Saúde) sobre a evolução do vírus.