RIO - Após ter sua estratégia de investimentos praticamente congelada pela pandemia da covid-19, a Previ quer retomar em 2021 a diversificação de seu portfólio. O plano é alocar até R$ 7 bilhões em ativos como fundos imobiliários, multimercados e investimentos no exterior. A fundação dos funcionários do Banco do Brasil também seguirá buscando a renovação da carteira de renda variável, com a participação em ofertas de ações, retomada já na segunda metade de 2020. Além disso, dará ênfase à modularização na política de investimentos do período 2021-2027, possibilitando a adoção de diretrizes específicas para seus diferentes planos.
Dona de um patrimônio total de R$ 219,9 bilhões, a Previ é o maior fundo de pensão do País. Depois de amargar um déficit de R$ 23,6 bilhões no auge da crise, em março, o maior fundo de pensão do País conseguiu reverter o quadro na reta final de 2020. No acumulado até novembro registrou um superávit acumulado de R$ 7,5 bilhões no Plano 1, de benefício definido, que concentra a parcela mais relevante de seus recursos. Já o Previ Futuro, plano de contribuição variável, teve rentabilidade de 2,29% no acumulado do ano.
Segmento mais penalizado no auge da crise, a renda variável encerrou novembro com rentabilidade positiva de 17,34%. O diretor de Investimento da Previ, Marcelo Wagner, avalia que a aceleração no retorno do mercado de ações foi sustentada pela participação resiliente do investidor de varejo na bolsa e pelo aumento da liquidez global após a definição da eleição americana, levando o Brasil a reboque. "Na crise os preços descem de elevador e sobem de escada. Mas a carteira sai mais resiliente do que a fechada em 2019. A Previ fechará 2020 numa situação bastante saudável e com superávit no Plano 1", afirma.
A carteira de R$ 199,3 bilhões do Plano 1 manteve uma maior concentração em renda variável (46,3%) e renda fixa (44,7%), seguidas por investimentos imobiliários (5,7%), operações com participantes (2,72%), investimentos estruturados (0,45%) e investimentos no exterior (0,15%). A meta em 2021 é retomar o plano de diversificação desse portfólio, posto em compasso de espera pela turbulência que a pandemia detonou nos mercados.
As ações para atingir o resultado seguirão a nova política de investimentos definida para o período 2021-2027. Nela, os princípios fundamentais que regem os investimentos da Previ passaram a constar de um único documento, como o uso de critérios ASGI (socioambientais, de governança e integridade). Por outro lado, os planos ganharam módulos anexos à política, que detalham as especificidades de cada um deles. A mudança permitirá que ajustes e correções de rota possam ser feitos de forma cirúrgica e com maior eficiência.
"Algumas estratégias conversam mais com o Plano 1 (de benefício definido, em que a maioria dos participantes já gozam do benefício) e outras mais com o Previ Futuro (contribuição variável) e o Previ Família (contribuição definida). A modularização permite a flexibilidade de fazer subportfólios", diz o diretor de Investimento da Previ.
Os primeiros passos nesse sentido começaram a ser implementados já em 2020. Um exemplo foi a criação de uma carteira de hedge de passivos (Liability Driven Investment) focada no Plano 1. Aproveitando oportunidades geradas na crise, o fundo adquiriu R$ 13,3 bilhões em títulos de renda fixa de longo prazo - a maioria NTN-Bs com vencimento em 2055 - dos quais R$ 11,5 bilhões alocados no maior e mais antigo plano da Previ.
"É como comprar uma apólice de seguros, casando o prazo médio de seus ativos com o de seus passivos. São aplicações que trazem mais estabilidade e resiliência para o plano, funcionando como uma espécie de imunização para os próximos 35 anos", diz Wagner, lembrando que a Previ tem obrigações a cumprir até o ano de 2095.
Já no Previ Futuro e no Previ Família, ainda em fase de acumulação, a estratégia adotada será a de busca pelo desempenho. No ciclo 2021-2027 também foram fortalecidas as estratégias ligadas aos riscos associados a cenários de estresse, com a previsão de que as tolerâncias de cada plano sejam analisadas ainda mais profundamente.
Renda variável
Na ponta da renda variável também houve inovação. Com algum alívio nos mercados a partir do segundo semestre do ano passado, o fundo voltou a analisar a participação em ofertas de ações, montando uma carteira com mandato específico para analisar a entrada em IPOs e follow on (novas emissões). A estratégia, que será mantida em 2021, incluiu uma análise prévia da governança e gestão de riscos das novas entrantes da bolsa, dando agilidade à execução de ordens.
A entidade participou de quatro dos 28 IPOs da bolsa em 2020: da Rede D'Or - em que foi o principal investidor brasileiro -, das varejistas Quero-Quero e Grupo Mateus, além da Petz, do segmento de cuidado animal, incluída entre os chamados "setores do futuro" na visão do fundo. Também participou da oferta subsequente da companhia de logística Rumo. Mantendo a estratégia de adquirir participações menores e sem controle nas empresas participadas, na casa de 2%, a Previ desembolsou R$ 629,39 milhões nessas operações.
Os desinvestimentos em renda variável também ganharam um pé no freio durante a crise. A Previ tem perto de R$ 85 bilhões em participações em companhias como Vale, Magazine Luiza, Petrobrás e Neoenergia, mas em meio ao cenário turbulento de 2020 deixou claro aos participantes estar preparado para enfrentar a crise sem precisar vender ativos com valores depreciados, o que não deve mudar nos próximos dois anos. O mercado vem monitorando qual será a estratégia da Previ especialmente em relação aos papéis da mineradora Vale, liberados para a venda após a extinção do acordo de acionistas em novembro passado, do qual o fundo era signatário.
"O passivo manda no ativo. Não está no radar fazer movimentos relevantes em qualquer das participadas no universo de curto prazo, isto é, 2021 e 2022", afirma o diretor de Investimento da Previ. Ao fim de novembro, a participação da Previ na Vale somava R$ 15,9 bilhões.
A nova política de investimentos da Previ aponta um intervalo de 37,21% a 50,35% para a alocação em renda variável e de 37,36% a 54,94% para a renda fixa em 2021. Já os investimentos no exterior poderiam chegar a 4% da carteira, o que seria um salto levando em conta que sua participação atual está em torno de 0,15% do portfólio do Plano 1.
Wagner conta que a Previ já estruturou dois fundos exclusivos voltados à alocação offshore, um de renda fixa e outro de renda variável. Inicialmente, o investimento em equity (ações) puxará esse movimento, com foco em ativos na Ásia e América do Norte.
O diretor interino de Planejamento da Previ, Ricardo Serone, confirma que em 2021 o fundo vai trabalhar com uma diversificação de portfólio maior, aumentando a possibilidade de investimentos no exterior e buscando atingir uma carteira de renda fixa mais balanceada entre títulos públicos e instrumentos privados. "Em termos de valores, dependendo das condições do mercado podemos chegar (a um orçamento para diversificação) de R$ 5 bilhões a R$ 7 bilhões", diz. O valor é R$ 2 bilhões superior ao teto estimado em 2020.
Serone destaca que a evolução da questão fiscal seguirá determinante para o Brasil este ano. O cenário base visto pela Previ é de juros estáveis e inflação controlada pelo alto nível de ociosidade da economia. Na revisão da política de investimentos, o fundo de pensão manteve a meta atuarial de seus planos. Para o Plano 1, ela é de INPC mais 4,75% e no Previ Futuro INPC mais 4,62%.
"Enquanto a parte fiscal não estiver mais clara, fica difícil para o País do ponto de vista da (recuperação da) economia real", analisa. "Acreditamos que as reformas vão ocorrer de maneira mais lenta e gradual no Brasil. Do ponto de vista da economia mundial, tudo depende de uma variável básica: a eficácia da vacina da covid-19, que pode trazer desafios e oportunidades", diz Serone.