A Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD) protocolou na quinta-feira (2), uma representação contra o presidente Jair Bolsonaro no Tribunal Penal Internacional em Haia, na Holanda. Na denúncia, a entidade alega que o chefe do Executivo praticou crime contra a humanidade ao incentivar ações que aumentam o risco de proliferação do novo coronavírus. Desde o início do avanço da covid-19, Bolsonaro minimizou a letalidade da doença e criticou o isolamento recomendado pelo próprio Ministério da Saúde.
A denúncia recupera um estudo da Imperial College, de Londres, que estima que até 1,1 milhão de brasileiros poderiam morrer caso as medidas de prevenção não fossem adotadas. "É precisamente o Presidente da República quem incita as pessoas a retornarem a seus postos de trabalho, as crianças a voltarem às escolas, os jovens a retornarem às universidades e as pessoas a circularem normalmente pelas ruas", afirma o documento.
Entenda quais são as acusações e as eventuais consequências da denúncia:
Quais são os argumentos apresentados pela Associação Brasileira de Juristas pela Democracia para denunciar o presidente Jair Bolsonaro?
A denúncia parte de uma crítica ao Procurador-Geral da República, Augusto Aras, que arquivou um pedido de entidades para que o órgão emitisse uma recomendação aconselhando Bolsonaro a seguir as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS) no combate ao coronavírus. O documento reforça que Aras é o único com competência para processar o presidente.
Na sequência, acusa Bolsonaro de crime contra a humanidade ao desrespeitar as recomendações da OMS e do Ministério da Saúde, incitando cidadãos a voltarem ao trabalho e, consequentemente, assumindo o risco de provocar a infecção e morte de milhares de pessoas
"A confusão criada pelo próprio presidente é absurda, ao desobedecer, ele mesmo, as diretrizes do próprio governo. Assim, se o presidente relata que a covid-19 não é perigosa, muitos brasileiros assim o entenderão, e colocar-se-ão em risco próprio, de seus familiares e de todas as pessoas com as quais tiverem contato", afirma o texto.
Segundo a ABJD, o presidente também teria cometido o crime de epidemia, previsto no artigo 267 do Código Penal Brasileiro e na lei 8.072/1990, além de infração de medida sanitária preventiva (artigo 268 do Código Penal) e violação à lei 13.979/2020, que prevê punições a quem descumpre as medidas de isolamento à covid-19.
Quais são os episódios apontados pela denúncia contra o presidente Jair Bolsonaro?
O documento aponta cinco momentos em que o presidente teria descumprido as recomendações da OMS e do Ministério da Saúde:
- O cumprimento a apoiadores aglomerados no Palácio do Planalto, quando Bolsonaro entrou em contato com centenas de pessoas, em 15 de março;
- O pronunciamento em rede nacional de rádio e TV, em que o presidente afirmou que não havia motivo para fechar escolas e chamou o coronavírus de "gripezinha", em 24 de março;
- A publicação do decreto 10.292, em que incluiu o funcionamento de igrejas e lotéricas como serviços essenciais, em 25 de março;
- O lançamento da campanha "O Brasil não pode parar", em que o governo estimulava a volta dos brasileiros ao trabalho, em 25 de março;
- A visita a comércios em funcionamento no Distrito Federal, em 29 de março.
Quais são as possíveis consequências para condenados no Tribunal Penal Internacional?
O decreto 4.388/2002, que trata da ratificação do Brasil ao Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, prevê pena de prisão aos condenados, sem especificar o período para cada tipo de crime.
"Pena de prisão por um número determinado de anos, até ao limite máximo de 30 anos, ou pena de prisão perpétua, se o elevado grau de ilicitude do fato e as condições pessoais do condenado o justificarem", dispõe o decreto. Além do encarceramento, o estatuto prevê ainda a aplicação de multas e confisco de bens.
A Constituição Federal também dispõe, no artigo 5º, que o País "se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão".
O que é o Tribunal Penal Internacional de Haia?
Tribunal Penal Internacional é o primeiro tribunal internacional permanente. Estabeleceu-se em Haia, na Holanda, em 2002, e tem poder para julgar crimes cometidos por indivíduos de países signatários. Atua em casos considerados internacionais, como crimes de genocídio, guerra e contra a humanidade.
A Associação Brasileira de Juristas pela Democracia se denomina uma associação civil sem fins lucrativos, criada em maio de 2018 para defender o regime democrático. Ainda de acordo com a descrição disponível em seu site, agrega 1300 associados pelo país, entre juízes, desembargadores, promotores, procuradores, advogados, defensores públicos, professores, servidores do sistema de justiça e estudantes de direito.