Após o Supremo Tribunal Federal (STF) afirmar que "uma mentira repetida mil vezes não vira verdade", em referência ao discurso do presidente Jair Bolsonaro e de seus aliados de que a Corte teria proibido o governo federal de atuar contra a disseminação da covid-19, o chefe do Executivo reagiu nesta quinta-feira, 29, prometendo rebater o Supremo por meio de uma nota.
"Não vai ser para peitar o Supremo, até porque eu estou por cima, eu tenho noção de judô", disse, em conversa com apoiadores na manhã desta quinta-feira, 29.
Bolsonaro classificou a manifestação do Supremo como "fake news". Ele novamente distorceu a decisão unânime dos magistrados, tomada em 15 de abril de 2020, e manteve o discurso de que a Corte teria limitado sua atuação ao determinar que Estados e municípios têm autonomia para decidir sobre medidas de enfrentamento à pandemia.
A decisão do STF, contudo, não retirou da União nem do presidente a responsabilidade pelas ações de combate ao vírus.
"Nós vamos demonstrar tudo que nós fizemos em meia dúzia de pequenos parágrafos, para todo mundo entender, não só nessa questão financeira, o total do gasto do endividamento de vocês foi mais de R$ 700 bilhões no ano passado, não só para Saúde, bem como rolagem de dívida entre de municípios, antecipação de receita, auxílio emergencial, tudo foi feito nessa parte", afirmou.
Segundo o presidente, "o Supremo cometeu crime ao dizer que prefeitos e governadores, de forma indiscriminada, poderiam suprimir todo e qualquer direito previsto no inciso quinto da Constituição, inclusive o ir e vir". Em crítica às medidas decretadas por Estados e municípios para conter o vírus, Bolsonaro disse que os gestores fizeram "barbaridades autorizadas pelo STF".
Insistindo no discurso de acusações, Bolsonaro justificou que não fechou "nenhum botequim", uma vez que "não adianta tomar uma providência porque prefeitos e governadores tinham mais poder que eu". De acordo com o chefe do Executivo, os gestores "tentaram derrubar a economia". "Estado não pode parar por muito tempo", reforçou.
STF rebate versão
Em vídeo divulgado na quarta-feira, 28, o Supremo reforçou o teor da decisão tomada pelos ministros da Corte, pela qual determinou que Estados e municípios têm autonomia para executar as medidas necessárias para conter o avanço do novo coronavírus, sem limitar a atuação do governo federal.
A decisão do Supremo foi usada, erroneamente, por Bolsonaro ao longo do ano passado como justificativa para a ausência de uma coordenação do governo central nas ações de combate ao vírus.
No vídeo, o STF rebateu Bolsonaro afirmando que uma "mentira repetida mil vezes não vira verdade". O presidente ficou insatisfeito com a publicação e disparou: "Isso é verdade, deveriam aplicar para a esquerda".
Numa peça de 30 segundos, a Corte reforça que "é falso que o Supremo tenha tirado poderes do presidente da República de atuar na pandemia", explica a narração. "É verdadeiro que o STF decidiu que União, estados e Prefeituras tinham que atuar juntos, com medidas para proteger a população."
Narrativa
Essa não é a primeira vez que o STF se manifesta para desmentir Bolsonaro em relação a essa decisão. Em 18 de janeiro, quando o presidente aproveitou o colapso do sistema de saúde em Manaus para culpar os ministros pela ausência de atuação direta do governo federal no combate à pandemia.
A Secretaria de Comunicação Social do Supremo emitiu nota em que negou que o tribunal tenha proibido o Planalto de agir para conter a disseminação da doença. "É responsabilidade de todos os entes da federação adotarem medidas em benefício da população brasileira no que se refere à pandemia", diz o texto.
Ao longo da pandemia, o tribunal foi acionado em diversos impasses travados entre governos municipais, estaduais e federal na definição de ações para o controle da doença. Isso porque, enquanto a maioria dos governantes locais defendiam o isolamento como estratégia mais eficaz para frear o avanço do vírus, Bolsonaro insistia na reabertura da economia. Em um segundo momento, os entraves em torno de tratamentos e da obrigatoriedade da vacinação também foram judicializados.