De padre a ministro: gafes da quarentena não poupam ninguém

Episódios hilários se espalham pela internet, entre anônimos e famosos do mundo inteiro; autoridades brasileiras dão um baile nesse quesito

18 abr 2020 - 06h11
(atualizado às 12h09)

Brasília - O clima estava tenso. Ninguém se entendia. No plenário vazio da Câmara, onde Rodrigo Maia (DEM-RJ) presidia a sessão, a oposição tentava suspender a polêmica medida provisória do "trabalho verde e amarelo". Pela primeira vez, por causa do isolamento causado pelo novo coronavírus, os parlamentares se acotovelavam em uma sessão virtual que entraria pela madrugada de quarta-feira, 14. De sua casa, pela tela do computador, o deputado e relator Christino Áureo (PP-RJ), fazia a defesa da proposta. Foi quando risos de crianças invadiram os microfones e telas do plenário e dos parlamentares, por todo o País.

"Que isso? Que isso? Tem um tubarão aliiii? Meu Deeeeus!", dizia alguém ao microfone, seguido por gargalhadas de crianças. O deputado Christino Áureo ainda tentou prosseguir com a orientação de seu voto, mas desistiu, sem entender nada. Nos computadores dos 513 deputados, uma pessoa dizia: "Me Deeeeus! Tem um coala?", perguntava, em tom de brincadeira. As crianças caíam na gargalhada.

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Segundos depois, silêncio total. Nas telas dos parlamentares, aparecia apenas o nome do deputado Marcelo Ramos (PL-AM). Ele tinha esquecido de bloquear o som do computador onde tinha falado um pouco antes, e foi brincar com os filhos. Depois de fechar o som, em tom de brincadeira, Marcelo Ramos mandou uma mensagem pelo WhatsApp para Rodrigo Maia: "Só pra avisar que aqui na floresta amazônica não tem tubarão e nem coala. Meus filhos entraram no quarto e brinquei com eles. É aniversário da Marcelinha hoje. Rsrsrsrs."

Episódios hilários e gafes se espalham por toda a internet, entre anônimos e famosos do mundo inteiro. As autoridades brasileiras, no entanto, estão dando um baile nesse quesito. Na quarta-feira, 15, fazia um calor dos diabos no Amapá, acima dos 30 graus Celsius. Era dias de mais uma sessão do Tribunal de Justiça do Amapá (TJ-AP), mas desta vez, pelo computador.

Cada um em sua casa de posicionou para a teleconferência. O desembargador Carmo Antônio de Souza não teve dúvidas. Com aquele calorão todo, sentou-se de frente para a sua tela sem camisa, todo à vontade, sem ter noção de sua câmera estava ativada e que os colegas, de terno e gravata, o assistiam do outro lado.

Na sessão online do Tribunal de Justiça do Amapá (TJ-AP), o desembargador Carmo Antônio de Souza sentou-se de frente para a sua tela sem camisa, sem ter noção de sua câmera estava ativada.
Na sessão online do Tribunal de Justiça do Amapá (TJ-AP), o desembargador Carmo Antônio de Souza sentou-se de frente para a sua tela sem camisa, sem ter noção de sua câmera estava ativada.
Foto: TJ-AP/ Reprodução / Estadão Conteúdo

Há aqueles, porém, que não são apenas vítimas dos novos hábitos tecnológicos, mas também dos encantos dos efeitos especiais. Em Itajubá, no sul de Minas Gerais, o padre católico Luiz César Moraes não resistiu aos encantos do mundo digital e, sem querer, se entregou de vez às belezas eletrônicas.

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Era a última missa do domingo que fechava março. Tudo corria bem com a benção virtual de Padre Moraes, que soma mais de 30 mil seguidores no Facebook e 18 mil no Instagram. Por alguma razão do destino, porém, padre Moraes teclou, se querer, nos filtros de efeitos que colocam bigodes, chapéus, óculos, caras de gatos, cachorros e tudo o mais sobre o rosto das pessoas.

O sacerdote, sem notar, ainda rezava sua oração final, quando o milagre da multiplicação de risos tomou conta de seus fiéis. Quando tomou pé da situação, padre Moraes caiu no riso e ele próprio compartilhou as imagens. "Desculpem os efeitos, acionei sem ver para iniciar a gravação da bênção. Deus quer também um pouco de alegria. A intenção foi mesmo de oração. Os efeitos foram sem intenção."

Os efeitos renderam imagens inusitadas da benção
Foto: Facebook / @Luiz Cesar Moraes / Estadão Conteúdo

Os encontros virtuais, sejam estes de amigos, de famílias ou de trabalho já conseguiram cravar na história das quarentenas uma frase célebre: "Tão me ouvindo?". Nada supera essas três palavras, seguidas por imagens paralisadas, em péssima resolução, com bocas abertas e olhos fechados. Ninguém é poupado. Nem mesmo o Supremo Tribunal Federal (STF).

Nesta quinta-feira, 16, o ministro Ricardo Lewandowski, devidamente vestido com sua toga, em casa, defendia seu voto que discutia a participação de sindicatos em acordos de redução de salário e jornada. Sentado, em uma sala rodeada de livros, Lewandowski fazia um discurso denso, gesticulava, como é trivial das sessões da alta Corte. No ápice de sua retórica, porém, quando já se preparava para o parágrafo final e dizia sobre "o risco de mergulharmos num círculo vicioso de progressiva e acelerada...", tudo parou. Silêncio total.

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Na tela, como se nada tivesse ocorrido, Lewandowski seguia empolgado, falando e acenando com as mãos, mas ninguém o ouvia. O ministro Luiz Fux entrou em cena e fez o alerta. "Ministro Lewandowski, a sua..." Lewandowski seguia inabalável em seu discurso. Fux insistiu. "Ministro Lewandowski... a sua voz sumiu! A sua voz sumiu! Nesse último parágrafo do seu voto... clica no microfone!"

Fux acenava, arregaçava o colarinho da camisa, abria e fechava a mão ao lado do ouvido, se aproximava da tela. Nada dava jeito. "Ministra, Cármen (Lúcia), desbloqueie seu microfone e nos transmita algo", disse Fux. Cármen Lúcia respondeu: "Vossa Excelência está me ouvindo? Eu estou ouvindo Vossa Excelência perfeitamente."

Fux perguntou então: "mas está ouvindo o ministro Lewandowski?" "Não", respondeu Cármen. "Sumiu exatamente no último parágrafo, como Vossa Excelência fez anotar."

Passaram-se minutos e nada de som no computador de Lewandowski. Com a sessão parada, a TV Justiça devolveu a transmissão para o estúdio, de onde o apresentador sentenciou: "É uma situação muito comum, todo mundo sabe, todo mundo tem problema com internet." Tempos depois, uma outra falha técnica inviabilizou a continuidade do julgamento.

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Em "protesto" contra as sessões virtuais, o ministro Marco Aurélio Mello deixou a toga de lado e apareceu no vídeo usando uma camisa polo em uma outra sessão. Tentou convencer a Corte de que o olho no olho era fundamental, mas foi voto vencido.

Fora do Brasil, pipocam os casos de gafes que viralizam mundo afora. No mês passado, ficou famosa a história da "Pobre Jennifer!". Durante uma teleconferência com os colegas de trabalho, Jennifer resolveu ir ao banheiro. Acontece que levou o computador, com câmera e áudio ligados. Quando percebeu a situação, já sentada na privada, deu uma bicuda no computador. (Colaboraram Camila Turtelli e Rafael Moraes Moura).

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