Estabilização da taxa de covid no AM preocupa especialistas

Redução lenta das médias em um patamar maior do que o fim da primeira onda, circulação de variante e flexibilização geram temor sobre possibilidade de novo recrudescimento da pandemia

21 abr 2021 - 10h20
(atualizado às 10h34)

Após uma explosão de casos e óbitos em janeiro, o Amazonas está em um período de tendência de estabilização após uma queda nas taxas da covid-19 nas últimas semanas, aproximando-se das médias do início de dezembro. Os números ainda preocupam especialistas ouvidos pelo Estadão, especialmente por serem considerados altos, o que facilitaria um novo recrudescimento com a flexibilização das medidas de distanciamento social, a circulação de variantes e a vacinação em ritmo lento.

Profissionais de saúde retiram corpo de paciente de Covid-19 que morreu em casa em Manaus
11/01/2021 REUTERS/Bruno Kelly
Profissionais de saúde retiram corpo de paciente de Covid-19 que morreu em casa em Manaus 11/01/2021 REUTERS/Bruno Kelly
Foto: Reuters

Na semana encerrada no sábado, 10, por exemplo, a média foi de 879 casos por dia, 10% a menos do que há 14 dias, mas ainda 1,3 vezes mais do que o registro do início de dezembro, como destaca análise do professor Henrique Pereira, um dos coordenadores do projeto Atlas ODS Amazonas, da UFAM. A interpretação é que as taxas estão com uma tendência de estacionamento após uma queda lenta, mas em patamares considerados elevados, semelhantes aos do início da segunda onda da pandemia no Estado.

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Situação semelhante se repete entre as internações, também em tendência de estabilidade, com média 37 hospitalizações por dia, o que é 10% superior ao registrado no começo de dezembro. Já os óbitos caíram 30% em uma semana, aproximando-se da média do início de dezembro. Na segunda-feira, 19, por exemplo, foram sete confirmados. No balanço da terça-feira, 20, 28 pacientes de covid-19 aguardavam por leito no Estado, dos quais 24 eram do interior.

 

Pereira destaca que, como em 2020, a pandemia cresceu no Amazonas antes de outros Estados, o que justifica ter apresentado também uma queda nos números enquanto os demais estavam em colapso. "Da mesma forma, foi o epicentro precoce da pandemia. A redução de indicadores na primeira onda também aconteceu aqui primeiro, os boletins de maio já apontavam desaceleração", compara.

"Estamos estabilizando, mas a redução desacelerou. Estamos estabilizados em um platô maior que o interior. Isso é preocupante, pois está em uma velocidade que mostra que o vírus ainda circula na população", comenta. "Mas, se o isolamento cair de novo, esse pessoal protegido da doença vai se expor e pode ter aceleração novamente."

Outro ponto que destaca é que o novo pico coincidiu com o período chuvoso, o chamado "inverno amazônico", que está no fim. Por isso, o professor se preocupa com a velocidade da vacinação contra a covid-19, que precisa atingir a maior parte da população adulta preferencialmente antes do segundo semestre.

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Os números de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG), que incluem outras doenças respiratórias e casos de covid-19 não confirmados em testes, já mostraram que o cenário é de estabilização em um patamar mais alto do que registrado após o pico da primeira onda.

A situação foi alertada no boletim Infogripe da última semana, feito pela Fiocruz, onde é destacado que o Amazonas, o Rio Grande do Norte, o Rio Grande do Sul, Roraima e Santa Catarina apresentam "indícios de que podem estar interrompendo a tendência de queda ainda em valores significativamente elevados". "No caso do Amazonas, caso se confirme a estabilização, ela se dá em valores acima do pico observado no mês de outubro", ressalta o boletim.

Pesquisador da Fiocruz Amazônia, Jesem Orellana salienta que a baixa testagem de covid-19 faz com os dados do SRAG sejam os mais confiáveis para acompanhar o andamento da pandemia. "Basicamente, é uma repetição de 2020, com dois agravantes: a circulação da variante P1 e a sensação de relaxamento total, muito maior do que foi em novembro, dezembro, que resultou nessa curva mais aguda", diz.

Ele explica que uma redução era esperada devido ao crescimento rápido e intenso entre dezembro e janeiro. "É normal cair depois de uma explosão muito aguda. Os dados seguem altos. Quando se tem uma exposição massiva e se associa isso a medidas de restrição, por óbvio que vai ter redução de internação, de mortalidade."

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O cientista considera que outros países têm aprendido mais com os erros brasileiros do que o próprio País. Por isso, lamenta que os mesmos erros (como a flexibilização precoce) do ano passado estão se repetindo agora, e mais rapidamente do que em 2020. "(A redução é) muito em função da exaustão da pandemia pela total negligência, não porque Manaus tem algo legal a ensinar à humanidade. Manaus está fazendo agora um laboratório a céu aberto que permite o vírus fazer o que bem entende e precisa."

Orellana diz que a principal medida nesse cenário seria a realização de testes em massa, monitoramento de contactantes, vigilância genômica de novas cepas e acompanhamento dos infectados para evitar que o quadro piore e necessite de hospitalização, a exemplo do que ocorre em países como a Nova Zelândia. "Agora está naturalizado ter 10, 15 mortes por dia em Manaus, estão naturalizando os altos níveis de contágio e mortalidade, o que permitiu que o vírus circulasse."

Além disso, ele aponta que é necessário não criar "grande expectativa" em relação aos efeitos da vacinação em curto e médio prazo, pois é preciso atingir a maioria da população para parar significativamente com a circulação do vírus. "A medida que vai tendo casos novos vai abrindo possibilidade de ter novas mutações. Isso fica pior quando o processo de vacinação é lento", diz.

O Estadão procurou o governo do Amazonas, mas não obteve retorno até esta quarta-feira, 20.

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