"Estou exposto e sei que corro risco", afirma coveiro

James Alan é encarregado de quadra no Cemitério da Vila Formosa

12 abr 2020 - 05h10
(atualizado às 08h39)

James Alan, de 34 anos, encarregado de quadra no Cemitério da Vila Formosa. Morador de Cidade Tiradentes, zona leste de São Paulo. Casado, dois filhos.

Trabalho há sete anos no Serviço Funerário de São Paulo. Comecei como sepultador e hoje sou encarregado de quadra, uma espécie de líder dos sepultadores. Não tenho problema em ser chamado de coveiro. A verdade é que existe muita discriminação. Algumas pessoas pensam que é uma profissão suja. Ninguém quer ser coveiro. Mas somos pessoas higienizadas, a gente se cuida. Eu faço por que gosto e faço com carinho. Minha vida tem um propósito. Aqui é o lugar onde a gente mais valoriza a vida.

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Foto: Marcello Zambrana/Agif - Agência de Fotografia / Estadão Conteúdo

Este é o momento mais tenso desses sete anos. Nós fazíamos 40, 45 sepultamentos por dia. Hoje, fazemos 10, 15 a mais. O cuidado é redobrado por causa da pandemia. Redobrado e ao quadrado. Estou exposto e sei que corro risco de ser contaminado. Na maior parte do tempo, eu estou de luva e máscara, que são trocadas a cada duas horas. Quando tiro os EPIs, uso álcool em gel, que sempre está no meu bolso. Depois dos sepultamentos, eu evito contato com os objetos e não coloco a mão no rosto. Nossa rotina inclui bota, luva, máscara, uniforme e boné. O macacão é para o sepultamento.

Não levo minha roupa para casa. Eu guardo numa sacola, lavo e estendo para secar aqui mesmo. Temos um tanque. Antes da pandemia, eu juntava os uniformes e levava para minha mulher lavar em casa, separada das outras. A gente fica com receio de contaminação.

Não tem velório nos casos de covid. Os sepultamentos são rápidos, com poucos familiares. Um caso me chamou a atenção. Um rapaz veio para enterrar o pai. Três dias depois, ele voltou para enterrar outro parente. E ainda tinha outro internado. Todos com covid-19. Fiquei impressionado. Cada família reage de uma forma na hora do enterro. Tem gente que chora, grita ou canta. Se a gente se envolver emocionalmente com cada um, nosso lado psicológico não vai aguentar.

Hoje, estou identificado e não largo mais. Gisele, minha mulher há 18 anos, sempre me apoiou. Tenho dois filhos: o Gabriel, de 15 anos, e a Beatriz, de 8. Eu amo minha profissão, mas quero algo a mais para eles. Meu nome? Foi minha mãe, dona Maria, que escolheu. Ela era fã do James Bond. Eu sempre brinco: meu nome é James, não o Bond, mas o Alan. James Alan.

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