"Não consigo parar": pandemia desafia economia informal

Muitos trabalhadores da América Latina não têm contratos ou benefícios

7 abr 2020 - 08h31
(atualizado às 08h33)

A sua clientela tinha praticamente desaparecido desde que o governo mexicano disse às pessoas que permanecessem em suas casas. E ele sabia que corria o risco de contrair o coronavírus. No entanto, Leonardo Meneses Prado ainda se postava com o seu carrinho de hambúrgueres no lugar de sempre na calçada.

Trabalhador do campo cuida da plantação no México
Trabalhador do campo cuida da plantação no México
Foto: Carlos Jasso / Reuters

"Não posso parar", ele disse no final de março. "Se eu não vendo, não como. Simplesmente isto". As economias da América Latina já eram frágeis antes do coronavírus. Mas agora a perspectiva é muito pior à medida que as iniciativas para fazer frente à pandemia paralisam a atividade econômica.

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E nenhum setor da sociedade será tão vulnerável quanto o dos trabalhadores que lutam na vasta economia informal da região, na sua maioria sem a vigilância oficial e sem as proteções trabalhistas. Estes trabalhadores, a maioria na região, variam desde os vendedores de rua em Assunção, no Paraguai, aos entregadores que percorrem as ruas de Lima, no Peru, aos recicladores de lixo de Tegucigalpa, Honduras.

Eles vivem à beira da sobrevivência com o mínimo de poupança ou mesmo sem poupança alguma, e uma rede de seguridade social limitada. Muitos também correm um risco ainda maior de contrair o vírus, em contato com estrangeiros e depois retornando para as suas moradias superlotadas.

O estado precário da saúde pública em muitos países os torna ainda mais vulneráveis. "Eles serão atingidos de maneira ainda mais brutal", disse Santiago Levy, um economista mexicano da Brookings Institution de Washington. Os governos prometeram ajudar os pobres.

Na Colômbia, o presidente Iván Duque anunciou recentemente, entre outras medidas, o pagamento de um benefício de cerca de US$ 40 aos trabalhadores informais que ainda não recebem alguma forma de assistência social. Mas quando a quarentena começou, temeu-se que estes desembolsos seriam insuficientes para manter a ordem social.

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Particularmente vulneráveis são os de venezuelanos que imigraram na Colômbia, 1,5 milhão de pessoas, a fim de fugir do colapso econômico do seu pais. Com o fechamento das fronteiras, muitos se encontraram na rua. Recentemente, uma grande multidão lotava a Plaza de Bolívar em Bogotá para manifestar a sua revolta, gritando: "Estamos com fome!"

A Venezuela impôs o fechamento, afirmando que transferiria até US$ 50 para seis milhões de trabalhadores. Para a maioria, a quantia mal bastará para cobrir uma fração das suas perdas. O impacto poderá ser particularmente brutal no México, onde os trabalhadores informais geram cerca de 25% da atividade econômica, segundo o governo.

E em comparação com algumas outras nações da região, o México adotou uma estratégia moderada contra a pandemia. A atitude do presidente Andrés Manuel López Obrador, às vezes, tem sido displicente ou mesmo de desdém. López Obrador, populista, que assumiu o cargo em 2018 como defensor dos oprimidos, declarou que esperou para impor medidas mais rigorosas de saúde pública, a fim de não prejudicar prematuramente a economia.

A sua maior preocupação, explicou, são os pobres. Os críticos afirmam que López Obrador pode ter dado ao vírus a oportunidade de infectar uma porcentagem maior da população miserável. No final de março, as autoridades mexicanas, alegando uma mudança do surto, anunciaram um conjunto de protocolos mais rigorosos cancelando eventos e pedindo a suspensão das atividades que exigem que os trabalhadores se desloquem de suas casas para irem ao escritório.

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O governo de López Obrador passou a instar aos mexicanos que permanecessem em casa. Em seguida, as autoridades endureceram ainda mais as restrições, ordenando o fechamento de todas as atividades não essenciais. Ocorre que muitos mexicanos não podem trabalhar em casa, ou deixar de trabalhar semanas a fio.

Meneses, que, há 19 anos, vende comida em seu carrinho, disse que estava menos preocupado com a possibilidade de se infectar com o vírus do que com os efeitos financeiros da pandemia. Suas vendas caíram cerca de 50% em relação a duas semanas antes e continuavam em queda. Se as autoridades obrigarem os vendedores de rua a fechar, Meneses afirmou que não sabe o que fará para sustentar a esposa e três filhas. A família não tem assistência médica.

"Para nós, é um luxo cair doentes", ele disse. Em alguns países da região, quando os governos tentaram impor restrições para combater o vírus, os trabalhadores se rebelaram - e se depararam com a força. No Peru, mais de 21 mil pessoas, inclusive vendedores de rua e outros na economia informal, foram detidos por não cumprirem as ordens de permanecer em casa. Ao mesmo tempo, o governo de López Obrador elaborou um plano de recuperação econômica, com um milhão de empréstimos no valor de aproximadamente US$ 1 mil a pequenas empresas nas economias formal e informal.

Seriam beneficiadas, segundo o presidente, "pessoas humildes, trabalhadoras." Segundo Levy, mesmo que os governos cumpram os programas de compensação, muitos trabalhadores do setor informal serão invisíveis para as agências governamentais porque não aparecem nos registros de impostos. Mas Luis de la Calle, um analista econômico mexicano, afirmou que viver fora das estruturas corporativas poderá ser vantajoso.

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Alguns que construíram suas carreiras nas ruas têm condições de se adaptar rapidamente, capacidade esta que será útil à medida que a pandemia reordenar as economias. "Quanto mais flexível a pessoa for, melhor". Mas o vendedor Meneses não é tão otimista: "Se ele vier e nos atingir com força, será um massacre". 

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