O projeto de lei que cria o auxílio emergencial de R$ 600 para trabalhadores informais, desempregados e microempreendedores individuais (MEIs), foi sancionado na quarta-feira, 1, pelo Presidente Jair Bolsonaro e publicado em edição extra do Diário Oficial da União na quinta-feira, 2. Também receberão os R$ 600 como antecipação as pessoas com deficiência que continuam na fila de espera do INSS para a concessão do BPC, Benefício de Prestação Continuada.
O projeto de lei previa também uma ampliação do BPC, que, segundo o governo, teria um impacto anual de R$ 20 bilhões nas contas públicas. Esse trecho, porém, foi vetado por Bolsonaro no momento da sanção, voltando à discussão no Congresso Nacional. A discussão sobre mudanças nos critérios para o recebimento do BPC é recorrente. Entenda abaixo.
Quem pode receber o BPC?
O BPC, ou Benefício de Prestação Continuada, é um benefício no valor de um salário mínimo destinado a idosos com 65 anos ou mais e pessoas com deficiência que não têm condição de se manter sozinhos, nem com auxílio da família.
No caso dos idosos, se encaixam aqueles que não recebem nenhum benefício previdenciário e cuja renda familiar por pessoa seja menor ou igual a 25% do salário mínimo, o que atualmente equivale a R$ 261,25.
Já para pessoas com deficiência, além de comprovar renda familiar abaixo de 25% do salário mínimo por pessoa e não receber benefícios previdenciários, o solicitante também precisa comprovar que sua deficiência e o nível de incapacidade o impedem de exercer uma vida plena em sociedade, seja por meio do trabalho ou por relacionamentos interpessoais. Essa prova deve ser feita com uma avaliação do Serviço de Perícia Médica do INSS.
Para garantir o recebimento do valor, o beneficiário também deve se inscrever no Cadastro Único de Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico).
O impasse da ampliação do BPC
Na quinta-feira, 2, após anunciar a sanção do auxílio emergencial, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que vetou um trecho do projeto de lei que ampliava o benefício para famílias com renda de até meio salário mínimo (R$ 522, 50) por pessoa.
O principal argumento é que, na lei, não se explica qual a origem dos recursos para a ampliação do benefício. Mas essa discussão começou nos primórdios do BPC e passou por vários julgamentos e processos até hoje, como explica a professora Melissa Folmann, da Escola de Direito da PUC-PR.
Segundo ela, logo quando o benefício foi criado, em 1993, o critério de renda familiar per capita de até 25% do salário mínimo foi considerado muito baixo, o que levou a um questionamento no Supremo Tribunal Federal. A Corte só chegou a um consenso em 1997.
"Em 1997, o STF reconheceu que o critério de 25% era constitucional, porque precisava de um critério, mas o magistrado, quando fosse analisar o caso concreto, deveria avaliar se o critério era adequado", explica Melissa. Isso levou a uma insegurança jurídica, já que cada caso tinha uma decisão única.
"O que os juízes faziam? Eles mandavam a Assistência Social para a casa das pessoas que pediam o benefício na justiça. Os assistentes sociais faziam a verificação in loco, levavam as evidências para o juiz, que analisava a situação e considerava que a família precisava do benefício, mesmo sem cumprir o critério", conta Melissa.
Em 2007, ao julgar uma reclamação do INSS, o ministro Gilmar Mendes decidiu que o critério de 25% do salário mínimo não era mais adequado à realidade brasileira. Segundo ele, as diversas análises da Assistência Social até aquele momento mostravam que uma família já era considerada miserável se a renda por pessoa fosse menor que meio salário mínimo.
Em 2013, essa questão volta a julgamento no Supremo. Na ocasião, os ministros ampliaram a decisão de 2007. "A reclamação anterior não tinha um efeito 'erga omnes', ou seja, não valia para todo mundo. Em 2013, no julgamento de relatoria do ministro Marco Aurélio Mello, a decisão proferida valia para o Brasil inteiro", explica a professora.
A determinação da Suprema Corte era que o Congresso Nacional teria prazo de dois anos para definir, em lei, um novo critério adequado à realidade brasileira. Essa lei não veio até 2020, no trecho que sobe o critério do benefício essencial para renda familiar de até meio salário mínimo por pessoa.
Então por que o governo barrou a ampliação do benefício? Segundo Melissa, o problema é que a lei não explica de onde vai sair o dinheiro para pagar esse novo critério. "A AGU (Advocacia Geral da União) argumenta que, para mudar os critérios do BPC, deveria ter uma previsão orçamentária de onde vai tirar esse dinheiro e que a lei não informa isso."
Na decisão publicada na quinta-feira, 2, no Diário Oficial da União, o governo justifica a retirada do dispositivo dizendo que feriria a Constituição e a Lei de Responsabilidade Fiscal.