Projeto de socorro a Estados garante perdão de R$ 13 bilhões em dívida do Rio

Avaliação preliminar é que o projeto incentiva a saída do Rio do Regime de Recuperação Fiscal (RRF), o programa de ajuda do governo federal que suspende dívidas,mas exige medidas de ajuste dos Estados

10 abr 2020 - 13h43
(atualizado às 14h04)

BRASÍLIA - O projeto de socorro emergencial aos Estados e municípios garante um perdão de dívida de pelo menos R$ 13 bilhões ao Rio de Janeiro, de acordo com cálculos da área econômica. Os números foram projetados com base no parecer lido no plenário da Câmara na quarta-feira passada. A avaliação preliminar é que o projeto, na prática, incentiva a saída do Rio do Regime de Recuperação Fiscal (RRF), o programa de socorro do governo federal a Estados que suspende por três anos o pagamento das dívidas, mas exige medidas de ajuste aos governos que aderem, como redução no gasto com pessoal e venda de estatais.

Até agora, o Rio foi o único que aderiu ao regime, que passava por reformulações nas negociações do chamado Plano Mansueto de auxílio financeiro aos Estados, que foi deixado de lado temporariamente para que o projeto emergencial seja votado diante da necessidade por mais recursos para o enfrentamento da crise do novo coronavírus.

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O Rio é o Estado do relator do projeto, deputado Pedro Paulo (DEM), e do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM).

O artigo 9º do projeto emergencial retira os encargos moratórios da desistência de ações judiciais. Esse artigo é o que pode perdoar uma parcela de R$ 13 bilhões da dívida do Rio de janeiro.

Antes de o Rio entrar no RRF, o Estado precisou renegociar a dívida com a União pela Lei Complementar 156. Para entrar nessa renegociação, os Estados tinham que desistir das ações judiciais que tinham contra a União.

Quando o governo fluminense desistiu das ações, teve que contabilizar o valor que não foi pago em decorrência das ações judiciais. Esses valores foram recalculados com encargos, gerando um aumento de R$ 13 bilhões no estoque da dívida do Rio de Janeiro.

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O artigo 9 do projeto perdoa esses R$ 13 bilhões, explicam técnicos envolvidos na contabilidade dos Estados. Dessa forma, o saldo devedor do Rio vai diminuir.

O projeto também traz outros benefícios para o Rio de Janeiro. Hoje, o Rio teria um espaço de R$ 4 bilhões para contratar novos empréstimos no âmbito do RRF com objetivos definidos.

Com o artigo 5º do projeto, o Rio vai ter R$ 4,6 bilhões para contratar novos empréstimos para qualquer finalidade. Diante dessa facilidade, os técnicos consideram que não faz sentido mais o Estado continuar no RRF. Isso porque os benefícios de continuar no programa, como suspensão de pagamento de dívida e contratação de operação de crédito com garantia da União, já estariam garantidos no projeto da Câmara.

Técnicos avaliam que a vantagem para o Rio sair do RRF seria não ter mais suas despesas supervisionadas com lupa por um conselho com representantes da União, nem a necessidade de compensar eventuais aumentos de gasto. Se estiver no RRF, o Rio não pode pegar uma nova operação de crédito que não esteja no plano, ou seja, não poderia ter acesso à nova linha aberta pelo projeto emergencial.

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Outro ponto que o projeto pode ajudar a encaminhar é o destino da Cedae, empresa de água e esgoto do Rio. No começo do RRF, o Estado pegou uma operação de crédito como antecipação da privatização da Cedae. Para isso, o Estado recebeu R$ 2,9 bilhões. O prazo para o pagamento do empréstimo atualizado (mais de R$ 4 bilhões) é 20 de dezembro de 2020. A União deu a garantia, e as ações da empresa entraram como contragarantia - se o crédito não for pago, a empresa é federalizada.

Cedae já foi condenada em 2019 por expor população ao contato com água inapropriada para consumo 
Cedae já foi condenada em 2019 por expor população ao contato com água inapropriada para consumo
Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil / Estadão

O Rio já vem tentando renegociar com o BNP Paribas (banco que emprestou o dinheiro) o adiamento do pagamento diante das dificuldades de caixa - o Estado só tem dinheiro para pagar suas despesas até o fim de junho. Técnicos explicam que o projeto da Câmara, na prática, abre caminho para essa renegociação sem nem precisar passar pelo Tesouro.

Com o projeto, a União não pode executar as contragarantias em 2020. O artigo diz que os Estados e os municípios poderão realizar aditamento contratual que suspenda os pagamentos devidos no exercício financeiro de 2020, incluindo principal e quaisquer outros encargos, de operações de crédito interno e externo.

Ao Estado, o relator negou com veemência que tenha incluído no seu relatório vantagens específicas para o Rio e disse que os dispositivos valem para todos os Estados e o Distrito Federal. "Não tem nada disso (de direcionar medidas ao Rio)", disse ele. Segundo Pedro Paulo, o perdão dos encargos está relacionado ao descumprimento do teto de gastos, que limita o avanço das despesas, pelos Estados. Segundo ele, 17 governos estaduais descumpriram o teto e sofreriam penalidades, com multas.

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Sobre a possibilidade de renegociação do contrato da Cedae sem autorização do Tesouro, Pedro Paulo, disse que não é essa a sua leitura. "Não é verdade. Primeiro que o artigo diz 'poderão'. É uma recomendação para que sejam discutidas as suas dívidas com os bancos multilaterais, com bancos privados. Não é uma obrigação. A gente não quebra contrato. O artigo não obriga a renegociação", disse Pedro Paulo, ressaltando que o projeto não suspende a dívida.

Para ele, o artigo estimula a renegociação dos contratos, sem a necessidade de a União cobrir as parcelas que estão vencendo. "No caso da operação da Cedae, se o Estado não pagar e não entrar em acordo, a dívida vai para a União, federalizando a empresa", ponderou.

Segundo ele, o Estado perderia R$ 11 bilhões, valor que o Estado espera obter com as concessões dos serviços da Cedae este ano. "De qualquer maneira, o Rio terá que discutir com o Tesouro", justificou.

Para o deputado, o Rio tem a possibilidade de pedir a prorrogação do RRF, a partir de setembro. Se sair do regime, o Rio terá que pagar R$ 9 bilhões da dívida a partir de janeiro. "Claro que não estimula a saída. O Rio vai passar a ter uma parcela de R$ 9 bilhões?", questionou.

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A reportagem procurou o governo do Rio para questionar sobre o projeto ou saber se o Estado abandonaria a recuperação fiscal, mas não obteve resposta. A Secretaria de Fazenda informou que só vai se pronunciar quando as discussões do projeto estiverem "mais maduras". Nesta sexta-feira, 10, Pedro Paulo se reuniu com o governador do Rio, Wilson Witzel, para discutir o projeto na residência oficial do chefe do Estado.

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