Remédios contra covid ainda não foram incorporados pelo SUS

Medicamentos com eficácia comprovada estão disponíveis somente em hospitais privados; Anvisa analisa pílulas antivirais e Ministério da Saúde faz consulta pública

29 mar 2022 - 05h10
(atualizado às 07h35)
No caso das pílulas antivirais, como Molnupiravir e Paxlovid, ainda não houve aval para uso no Brasil
No caso das pílulas antivirais, como Molnupiravir e Paxlovid, ainda não houve aval para uso no Brasil
Foto: iStock

Dois anos após o início da pandemia, medicamentos com eficácia comprovada contra a covid-19 não estão incorporados pelo Sistema Único Saúde (SUS). Em hospitais privados, alguns remédios aprovados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para tratar a doença já são colocados à disposição dos pacientes. No caso das pílulas antivirais, como Molnupiravir e Paxlovid, ainda não houve aval para uso no Brasil. Aprovadas em outros países, elas podem fazer diferença quando ingeridas após os primeiros sintomas.

Como um dos principais entraves está o preço dos tratamentos. Não há perspectiva de data para que esses remédios estejam disponíveis no SUS, uma vez que a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias (Conitec) não recomendou a incorporação.

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Remédios como Sotrovimabe e Evusheld não possuem estoque para comercialização no País e não têm cobertura para o uso ambulatorial ou domiciliar pela Agência Nacional de Saúde (ANS), que regula os planos de saúde. A agência informou que os medicamentos desse tipo só têm cobertura obrigatória caso sejam prescritos pelo médico para administração durante a internação. Posteriormente, pode ser feita a solicitação de reembolso, mas, ainda assim, em alguns casos os pacientes acabam tendo de arcar com os medicamentos.

Esse, no entanto, não seria o cenário ideal, uma vez que tratamentos com remédios como o Remdesivir podem custar até R$ 20 mil, aponta a farmacologista e pesquisadora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) Soraya Smaili. "Quem mais sofreu óbitos com o pico da Ômicron foram pessoas acima de 80 anos. A vacina protege, mas a proteção pode ser reduzida em idosos e pessoas com comorbidades", diz. "Nessas condições, deveriam existir alternativas tanto no hospital quanto no ambulatório, o que poderia impedir quadros graves."

Os remédios para a covid se dividem em duas frentes: a das pílulas antivirais de via oral, que podem ser efetivas quando administradas no início dos sintomas, e a dos anticorpos monoclonais, que simulam a proteção conferida pela vacina em diferentes estágios da infecção e correspondem à maioria dos remédios aprovados pela Anvisa.

Até o momento, apesar de o primeiro tipo já ter sido aprovado em países da Europa e nos Estados Unidos, somente o segundo tipo recebeu aval no Brasil. Ainda assim, nenhum foi recomendado pela Conitec para uso na rede pública.

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Chefe do departamento de Infectologia da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Alexandre Naime Barbosa explica que, para pacientes com covid leve da rede privada, o Regdanvimabe seria o único com estoque disponível no Brasil. Produzido pela Celltrion Healthcare, ele seria capaz de reduzir o risco de progressão da covid em 70%, segundo estudos clínicos de fase 3.

O preço, no entanto, é um entrave para a rede pública - vai de R$ 9,8 mil a R$ 12 mil, a depender do peso do paciente. Além disso, há uma hesitação em relação à eficácia dos anticorpos monoclonais no combate à Ômicron, mais transmissível, o que faz mesmo hospitais privados repensarem as estratégias para tratar a covid.

No caso de pacientes com covid-19 hospitalar, Naime Barbosa reforça, por outro lado, que a rede pública consegue oferecer opções como o corticosteróide Dexametasona, primeira droga que se mostrou eficaz nesses casos. Outras alternativas, como ventilação e intubação, também foram incorporadas pelo SUS.

A Conitec analisa o Baracitinibe, inibidor seletivo da Eli Lilly usado para artrite reumatoide e que se mostrou eficaz contra a covid. Na rede privada, tratamentos envolvendo o remédio custam entre R$ 2 mil e R$ 3 mil, o que o tornaria mais acessível.

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Em nota, o Ministério da Saúde reforçou que encerrou no último dia 24 o prazo para o envio de contribuições à consulta pública sobre a proposta de incorporação do remédio para tratamento da covid. "Agora, o tema voltará para a Conitec para que os membros do plenário possam emitir a recomendação final", acrescentou. A pasta ressaltou que o Baricitinibe já tem registro no Brasil para o tratamento de artrite reumatoide e o uso para tratar a covid foi aprovado pela Anvisa.

No Brasil, a Anvisa recebeu pedido de uso emergencial do Molnupiravir, da Merck Sharp & Dohme (MSD), em novembro. Conforme painel da agência, 53% da documentação teve a análise concluída, 41% está em análise e 5% ainda está pendente de complementação. Em nota, a MSD informou que teve novas informações solicitadas pela agência há cerca de duas semanas e está compilando os dados para reenviar à agência.

No caso do Paxlovid, da Pfizer, o pedido foi feito em fevereiro. A Anvisa aponta que 50% da documentação teve a análise concluída e 41% ainda está em análise. A farmacêutica informou, em nota, aguardar a revisão da agência. "O período para que Paxlovid esteja disponível no Brasil dependerá da aprovação da Anvisa e também do andamento das negociações com o Ministério da Saúde para um possível acordo de compra", acrescentou.

KIT COVID

Apesar de seguir grande parte das recomendações da Conitec, o Ministério da Saúde rejeitou em janeiro deste ano as diretrizes da comissão para não usar medicamentos sem eficácia do chamado "Kit Covid", que inclui remédios como cloroquina, hidroxicloroquina, azitromicina e ivermectina para tratamento de pacientes no SUS. "Esta posição reforça decisões anteriores do governo de usar indiscriminadamente medicamentos ineficazes e sem evidências científicas", avalia o professor do Instituto de Física de São Carlos da Universidade de São Paulo (USP) Adriano Andricopulo.

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"No contexto nacional atual e de recursos disponíveis no SUS, seria prioritário atender as demandas de tratamentos precoces ou casos iniciais de pacientes com suspeita ou diagnóstico de covid-19. Também seria útil a disponibilidade de alguma terapia eficaz para salvar a vida de pacientes em estado grave. Estamos entrando em uma nova fase de diversidade de terapias surgindo para o tratamento da covid-19, o que leva a necessidade de constante avaliação e atualização, conforme novas evidências científicas e médicas de alta qualidade vão aparecendo", acrescenta.

Entre as possibilidades, o pesquisador aponta que Molnupiravir e Paxlovid seriam opções importantes para o tratamento inicial da doença. Para além deles, remédios como Sotrovimabe (GSK), Regdanvimabe (Celltrion) e Evusheld (Astrazeneca) também poderiam gerar resultado. "Contudo, não estão disponíveis nem na rede privada", explica. Por fim, nos casos graves e com risco de morte, ele reforça que o uso de anticorpos monoclonais como Tocilizumabe ou Baricitinibe seria útil.

Remédios para tratar a covid

Paxlovid

Pílula antiviral de via oral produzida pela Pfizer. Ainda não foi aprovada pela Anvisa, mas é uma das apostas para controlar a covid em estágio inicial.

Molnupiravir

Pílula antiviral de via oral desenvolvida pela Merck Sharp & Dohme (MSD) em parceria com a Ridgeback Biotherapeutics. Também não tem aval da Anvisa, mas já é usada em outros países.

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Aprovados pela Anvisa:

Evusheld

Coquetel de anticorpos monoclonais desenvolvido pela AstraZeneca, anteriormente conhecido como AZD7442. Recebeu aprovação da Anvisa em fevereiro, mas não possui estoque no País. A farmacêutica informou que o preço do remédio deve ser definido na próxima semana. Acrescentou estar em contato com o Ministério da Saúde sobre a possibilidade de incorporar o produto no SUS e com alguns grupos hospitalares.

Regdanvimabe

Anticorpo monoclonal produzido pela Celltrion Healthcare. Desenvolvido especificamente para o tratamento da doença, deve ser administrado em até sete dias após o início dos sintomas. Possui estoque no País.

Baricitinibe

Inibidor seletivo produzido pela Eli Lilly. Recebeu parecer inicial favorável da Conitec e está avançando para ser disponibilizado pelo SUS em tratamentos para covid-19.

Remdesivir

Antiviral injetável fabricado pela Gilead, tem benefício marginal no controle do vírus. Possui custo elevado. Conitec recomendou a não incorporação pela rede pública em setembro do ano passado.

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Outros medicamentos que foram aprovados pela Anvisa para tratar a covid, mas que não foram incorporados para tratamento na rede pública: Sotrovimabe (produzido pela GSK) e Regn-Cov2 (fabricado pela Regeneron em parceria com a Roche). O Xeljanz (Banlanivimabe e etesevimabe), da Pfizer, foi aprovado em abril do ano passado, mas teve o uso emergencial revogado em fevereiro deste ano.

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