BRASÍLIA - A suspensão das perícias presenciais do INSS levou a um aumento no número de ações acumuladas na Justiça para requerer acesso a benefícios, diz ao Estadão/Broadcast o conselheiro do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) Henrique de Almeida Ávila.
O órgão tem acompanhado de perto o impasse envolvendo o retorno dos médicos peritos às atividades presenciais. Segundo Ávila, há mais de 200 mil causas paradas na Justiça porque dependem de perícia, e há ainda um "aumento vertiginoso" no número de novas ações devido às restrições do INSS durante a pandemia da covid-19.
"O Poder Judiciário tem um aumento vertiginoso no número de ações porque o INSS não está cumprindo o papel dele", afirma o conselheiro.
O INSS suspendeu o atendimento presencial em março e passou a conceder antecipações de alguns benefícios com base em análises de atestados e outros documentos. Mesmo assim, como mostrou o Estadão/Broadcast semana passada, 600 mil pedidos de auxílio doença não puderam se beneficiar da antecipação e dependem de perícia presencial, além de outros 500 mil requerimentos do Benefício de Prestação Continuada (BPC), pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda.
O órgão tentou retomar o atendimento presencial na semana passada, com adaptações em sua infraestrutura e seu quadro de pessoal, além de medidas de proteção, mas enfrentou forte resistência da Associação Nacional dos Médicos Peritos (ANMP), que acusou o governo de flexibilizar indevidamente os protocolos sanitários.
Por trás do movimento, o governo vê uma resistência dos peritos de abandonar o trabalho remoto, que inclui uma análise simplificada de cada segurado e ainda torna a carga horária mais administrável pelo servidor, e retomar o atendimento presencial, que precisa ser cumprido dentro de uma faixa horária específica (as agências estão abrindo das 7h às 13h).
Como mostrou o Estadão/Broadcast, o governo está fazendo um monitoramento dos peritos médicos que não querem voltar ao trabalho presencial nas agências do INSS, mas continuam atendendo em consultórios particulares, hospitais e outros estabelecimentos de saúde. As denúncias de falhas serão investigadas pela Controladoria-Geral da União (CGU).
Em 2014, o Tribunal de Contas da União (TCU) analisou casos de peritos médicos que acumulavam a função com outros cargos na administração pública ou na iniciativa privada extrapolando uma carga de 60 horas semanais - ou seja, trabalham mais que 10 horas por dia, seis dias por semana. No acórdão, a corte de contas entendeu que o acúmulo é legal, desde que não haja sobreposição de jornada, ou seja, o médico não assuma a responsabilidade de estar em dois lugares ao mesmo tempo.
Teleperícia
Diante da crise da covid-19, o CNJ enviou ao TCU um ofício questionando sobre a ausência de emprego de ferramentas tecnológicas para a realização de perícias. A Justiça havia autorizado a realização de teleperícias ou perícias indiretas (quando o profissional analisa os laudos, mas sem ver o paciente) nos processos em tramitação no Judiciário, mas o Conselho Federal de Medicina (CFM) proibiu a prática.
Em seguida, uma liminar do Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região impediu o CFM de adotar medidas disciplinares contra médicos que realizassem a teleperícia ou a perícia indireta em processos judiciais envolvendo benefícios previdenciários e assistenciais durante a pandemia. Mesmo assim, a adesão foi apenas parcial. Agora, mesmo com a retomada de perícias presenciais, os processos se acumulam.
Segundo apurou o Estadão/Broadcast, o governo também resiste à teleperícia por não ver respaldo na lei para a prática, além de acreditar que o instrumento não é o mais adequado para a avaliação do segurado.
Em balanço atualizado há pouco, a Secretaria Especial de Previdência e Trabalho e o INSS informaram que, nesta terça, 22, 351 peritos médicos federais compareceram aos seus postos de trabalho nas agências da Previdência e realizaram, até as 16h, 3.059 perícias presenciais. Outros 135 deveriam ter retornado ao trabalho, mas não se apresentaram.