Deve fracassar a ação do senador Marcos Do Val (Podemos-ES) para tentar fabricar uma situação de impedimento contra o ministro Alexandre De Moraes, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e principal alvo do ex-presidente Jair Bolsonaro no Supremo Tribunal Federal (STF). O fracasso foi previsto em entrevista à coluna do jurista Renato Stanziola Vieira, mestre em direito constitucional (PUC-SP) e doutor em processo penal (USP), presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM).
Do Val prometeu boicotar Moraes com um pedido formal para que a Procuradoria-Geral da República (PGR) solicite o impedimento do ministro na relatoria do inquérito que investiga os atentados de 8 de janeiro em Brasília.
O pedido de impedimento é uma tentativa do senador de ajudar Bolsonaro. E é o desdobramento derradeiro de uma sequência de ações aparentemente contraditórias.
O senador começou a semana com a versão, dada em entrevista à revista VEJA, de que foi coagido por Bolsonaro e pelo ex-deputado Daniel Silveira a tentar grampear ilegalmente Moraes e, assim, tentar conseguir eventuais confidências que mostrassem parcialidade do ministro para julgar Bolsonaro. Inicialmente, Do Val disse que o objetivo era tentar usar essas gravações para reverter o resultado da eleição presidencial de 2022 e tentar dar um golpe de Estado para que o ex-presidente ficasse no poder.
Mas, no dia da publicação da entrevista do senador, o comparsa Silveira foi preso por desrespeitar seguidas decisões do STF. E ainda no mesmo dia Do Val mudou sua versão sobre a armação golpista, depois de conversar com o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), o primogênito do ex-presidente.
Depois da prisão de Silveira e da conversa com Flávio, Do Val passou a apresentar novas versões que tentavam isentar Bolsonaro de responsabilidade pelo plano criminoso.
O plano e o papel de Bolsonaro, Silveira e Do Val estão sendo investigados pela Polícia Federal. De todo jeito, para o presidente do IBCCRIM não há justificativa legítima para boicotar a atuação de Moraes no inquérito dos atentados golpistas de 8 de janeiro.
“Parece que é uma coisa montada para criar uma situação de suspeição. A discussão sobre suspeição seria facilmente rebatida, porque não há suspeição se a própria parte cria essa situação”, avalia o presidente do IBCCRIM, Renato Stanziola Vieira.
O jurista desconfiou das sucessivas versões contraditórias do senador depois da conversa com Flávio e da prisão de Silveira.
“Como Daniel Silveira já ficou patenteado como a parte mais fraca da história, eu consideraria se houve assédio por parte de Flávio Bolsonaro para que Marcos Do Val tenha mudado de versão. É possível pensar que com a prisão de Silveira eles tenham escolhido um lado para salvar a situação de Bolsonaro”, afirmou o jurista.
“O senador de forma suspeita e estranha está diminuindo a participação do principal beneficiado. Essa mudança não para de pé”, acrescentou.
Risco de prisão de Bolsonaro?
A armação criminosa contra Moraes é a última conduta atribuída ao ex-presidente com potencial de complicá-lo na Justiça. Bolsonaro é oficialmente investigado pela suspeita de que incitou e/ou orquestrou os atentados golpistas em Brasília no dia 8 de janeiro. Antes disso, a Polícia Federal pediu ao STF autorização para indiciar o ex-presidente por incitação ao crime, porque Bolsonaro associou falsamente o vírus HIV à vacina contra o coronavírus, tentando desestimular a população a tomar o imunizante.
Como investigado, Vieira destaca que o ex-presidente corre risco de ter a prisão decretada porque fez sucessivas declarações de desafio e ameaça a Moraes e à Justiça brasileira. Isso pode ser encarado pela Justiça como uma ameaça à ordem pública.
“Uma das hipóteses de prisão preventiva é atrapalhar investigação e comprometer a ordem pública. Nesse contexto, suas declarações têm potencial de comprometer a ordem pública. Veja o que aconteceu em 8 de janeiro e 7 de setembro do ano passado. Portanto, é óbvio que esse investigado, como qualquer outro, corre o risco de ter contra si um mandado de prisão preventiva”, afirma Vieira.
“Nessa situação, passou da hora que autoridades avaliem o impacto à ordem pública de um cidadão que deliberadamente não quer voltar ao Brasil e, estando fora do país, insufla e dissemina comportamentos que desafiam várias investigações em curso”, acrescenta.