A declaração de Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) de que a resposta a uma radicalização da esquerda nas ruas pode ser via um 'novo AI-5' em entrevista veiculada na quinta-feira, 31, movimentou partidos do centro e da oposição contra o deputado. Enquanto parlamentares de PSOL, PT, PSB, PDT, PCdoB e Rede apresentaram no Supremo Tribunal Federal (STF) uma notícia-crime contra o "filho 03" do presidente da República, há ainda a chance de a oposição entrar com pedido de cassação do seu mandato no Conselho de Ética da Câmara, por quebra de decoro parlamentar. O pedido deve ser feito na próxima terça-feira, 5.
Entenda a seguir o que pode acontecer com o mandato de Eduardo Bolsonaro:
Notícia-crime no Supremo
Deputados da oposição protocolaram na noite de quinta-feira, 31, uma notícia-crime no Supremo Tribunal Federal. Em uma petição assinada por deputados de PSOL, PT, PSB, PDT, PCdoB, além da liderança da Minoria na Casa, a ação, endereçada ao presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, pede que Eduardo Bolsonaro seja condenado por incitação e apologia ao crime, além de improbidade administrativa, que pode levar à perda do mandato.
Uma notícia-crime é uma comunicação que alguém faz a alguma autoridade pública competente de que uma pessoa está cometendo infração penal. Diferente da denúncia, a "notícia-crime" não faz parte formalmente de uma ação penal, ela serve como uma espécie de aviso.
Segundo os deputados, Eduardo "incitou um possível retorno do AI-5, página infeliz da história brasileira, afrontando diretamente os ditames constitucionais e democráticos pátrios" e, com isso, deve ser julgado pelos tipos penais de "incitação ao crime" e "apologia de crime e criminoso", além de improbidade administrativa.
É possível, no entanto, que a ação tenha que passar pelo aval do procurador-Geral da República, Augusto Aras, uma vez que cabe ao PGR oferecer denúncia para abertura de ações penais de autoridades com foro privilegiado, como é o caso de Eduardo Bolsonaro.
"Para que haja validade um procedimento contra um parlamentar, necessariamente tem que passar pela PGR. A partir do momento em que isso foi endereçado ao Supremo, a Corte deve dirigir para uma manifestação da PGR. E, depois, o Supremo também tem que autorizar a Procuradoria a iniciar a investigação", explicou Miguel Pereira Neto, advogado e mestre em Direito Processual pela Faculdade de Direito da USP.
"O que pode acontecer também é que o Supremo já distribua a notícia-crime para algum ministro relator, que de qualquer maneira terá que encaminhar a petição para a PGR, que deve se posicionar se dá prosseguimento ou não à denúncia", afirmou a constitucionalista Vera Chemim. A especialista diz acreditar que a PGR pedirá o arquivamento da petição, uma vez que já se manifestou no sentido de que a declaração de Eduardo é protegida pela imunidade parlamentar, prevista na Constituição.
No entanto, por supostamente se tratar de um crime comum - não vinculado à atividade parlamentar -, o relator no STF pode optar por prosseguir com o processo mesmo à revelia da PGR. "Mas isso é relativo, há ministros que entendem que a imunidade se dá somente por atos ligados à atividade parlamentar, enquanto outros defendem uma extensão do entendimento", disse.
Em relação à suposta prática de improbidade administrativa, também apontada pelos deputados na notícia-crime, Vera Chemim afirma que o STF já decidiu que nesses casos a competência é de instâncias inferiores.
No mês passado, o ministro Celso de Mello negou uma notícia-crime apresentada pelo deputado Paulo Pimenta (PT-RS) contra procuradores da Lava Jato por supostos crimes cometidos ao longo da operação. Ao rejeitar o pedido, o ministro alegou que o STF "não pode ser confundido com órgão de encaminhamento a outras autoridades penais de comunicações referentes a alegadas práticas delituosas".
Celso de Mello ainda afirmou que o Judiciário não tem a prerrogativa para ordenar, induzir ou estimular o oferecimento de acusações penais pelo MP. "O monopólio da titularidade da ação penal pública pertence ao Ministério Público, que age, nessa condição, com exclusividade, em nome do Estado", afirmou.
Conselho de Ética da Câmara
Um pedido de cassação de mandato pode ser feito na prática por qualquer cidadão, contanto que haja provas para apresentar à Mesa da Câmara dos Deputados. Mas, no caso de a representação ser feita por um ou mais partidos políticos, ela é encaminhada ao Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, com o prazo de três sessões ordinárias, nas quais é decidido o tipo de punição aplicável.
O deputado é obrigado a comparecer em todas as sessões, mantendo o direito de se manifestar ao longo do julgamento. Quem também pode acompanhar todas as assembleias e fases processo no Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, mas sem direito a voto, é um representante da Corregedoria Parlamentar, que hoje está sob a gestão do deputado Paulo Bengtson (PTB-PA).
De acordo com o Código de Ética e Decoro Parlamentar, há quatro punições aplicáveis à quebra ou incompatibilidade do decoro por parte de um deputado, que variam de acordo com a natureza e gravidade do ato: censura, verbal ou escrita; suspensão de prerrogativas regimentais por até seis meses; suspensão do exercício do mandato por até seis meses; e perda de mandato.
Para que o mandato de Eduardo seja cassado, é ainda necessário que, após as três sessões do conselho, o caso seja levado para o plenário da Câmara, que precisa votar com maioria absoluta pela punição. Nessa hipótese, o presidente do conselho, Juscelino Filho (DEM-MA), indica um relator para o processo, enquanto o deputado tem 10 dias para organizar seus argumentos de defesa.
Ao fim da apresentação do parecer do conselho e da defesa do deputado, o relator tem ainda o prazo de 40 dias, no caso de perda de mandato, para dar as instruções probatórias que achar necessárias, e mais 10 dias para proferir um parecer sobre a representação. Terminado o julgamento e proferida a sentença, Eduardo ainda tem cinco dias úteis para recorrer da decisão na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ).